Padre Valeriano

Vocação de um eremita

Meu chamado para a vida religiosa aconteceu no Rio de Janeiro, em 1946. Estava, então, com 22 anos. Havia saído de minha cidadezinha natal – Tarumirim – em busca de uma vida melhor. Na verdade, eu fugi, pois havia dito aos meus pais que iria passear em Belo Horizonte, mas saí com a intenção de não mais voltar. Arranjei um emprego numa cidade perto de Belo Horizonte – Itabira; dali, depois de um ano, pedi transferência para uma filial da empresa em Cavalinhos, no Espírito Santo, de onde consegui a transferência para o Escritório Central no Rio de Janeiro.

Eu era muito ambicioso, queria ficar rico e me tornar importante. Tudo ia caminhando segundo os meus planos. Era muito querido na empresa, de sorte que ia crescendo de promoção em promoção. Paralelamente estava fazendo um curso para entrar no Conselho Federal de Comércio Exterior na época. Fui bem sucedido, já estava para ser admitido graças ao apoio de um funcionário categorizado daquela autarquia, quando, certa manhã, passando pelo Largo da Carioca, olhei curioso para o Convento dos Franciscanos no alto do morro e me questionei: “O que fará aquela gente ali?”

É bom esclarecer que, até então, eu era um católico apenas de missa dominical por obrigação.

Subi o morro. Fui ao Convento. Fui tão bem acolhido, que dentro de pouco tempo já participava da Ordem Terceira de São Francisco e fazia a minha confissão geral. Começou o meu processo de conversão.

Passados alguns meses, abandonei o emprego, os meus projetos ambiciosos e me tornei Frade na Ordem Franciscana. Mas eu era muito radical, com o passar do tempo queria viver como os primeiros franciscanos do tempo de São Francisco.

Três anos depois, soube, através de meu diretor espiritual, de uma Comunidade religiosa na França que vivia quase que literalmente o ideal de Francisco de Assis, a “Fraternité des Petits Frères de Jésus du Père De Foucauld”. Poucos meses depois, ajudado pelo meu diretor espiritual, e financeiramente por alguns amigos, lá estava eu na França nessa Comunidade.

Por uma série de circunstâncias só fiquei lá por três anos. Voltei para o Brasil e fui morar em São Paulo.

Meu diretor espiritual, Frei João José Pedreira de Castro, convidou-me para fundar com ele o Centro Bíblico Católico. Começou, então, para mim um tempo de intensa atividade intelectual. Graças ao prestígio de Frei João José, grande biblista, o Centro Bíblico teve a melhor aceitação e foi o responsável pela tradução e lançamento da Bíblia de Maredsous, editada pela Editora Ave-Maria (hoje o Centro Bíblico está sob a direção de outro excelente biblista, Frei Paulo Avelino de Assis). Traduzi nesse tempo, mais de 20 livros para a Editora Flamboyant.

Em dezembro de 1958, fui para Taubaté-SP com o propósito de tentar novamente a vida religiosa, desta vez com os Capuchinhos. Mas ali me esperava o Senhor com uma “capuchinha” leiga, da Ordem Terceira Secular, feita sob medida para mim, e acabei me tornando um “capuchinho de uma capuchinha só”.

Na época eu não pensava em me casar, nem ela. Mas o Senhor “teceu os pauzinhos” e acabou acontecendo o que não estava nos meus planos: o casamento. Ela se chamava Maria José, casamo-nos em 1960. Era uma criatura muito santa e linda de viver. Foi um acontecimento muito feliz na minha vida, porque depois de tantas andanças e inconstâncias eu consegui me fixar e me tornar mais responsável. Maria José deu novo impulso ao meu processo de conversão. Sofreu muito comigo, mas conseguiu quebrar todas as minhas arestas. Tivemos uma filha – Cecília Maria – e adotamos outro – Carlos Borromeu.

Em 1965, compramos uma chácara no bairro do Areão e a transformamos numa Casa de Retiros, que acabou se tornando a sede da Renovação Carismática em Taubaté. Tivemos ali muitas experiências de oração e alguns aprofundamentos, mas o Senhor levou minha santa esposa para o Céu em 1978.

Agora, viúvo, o que fazer? Depois de muita oração decidi completar os meus estudos para o sacerdócio. Fui aceito pelo Arcebispo de Pouso Alegre-MG, Dom José d’Angelo Neto, confirmando assim que era o Senhor que me chamava. Ordenado Sacerdote em 1984, fui empossado como Pároco na pequena cidade de Itapeva-MG, onde fiquei até 1991, quando fui transferido para a cidade de São Sebastião da Bela Vista, e dali para Santa Rita do Sapucaí em 1993, onde fiquei morando num Asilo para acompanhar minha mãe que estava muito velhinha.

Em 1995, tendo falecido minha mãe, pedi ao meu amigo Padre Jonas para fazer uma experiência na Canção Nova, ao que ele acedeu com a melhor boa vontade. Ali permaneci até 1998.

O meu grande sonho, desde a minha experiência como frade franciscano, era tornar-me eremita. Aliás, foi com essa intenção que eu quis ir para os “Petits Frères de Jésus”, que tinha na época uma fraternidade em Benni-Abbés, no deserto do Sahara. Durante a minha experiência na Canção Nova, renasceu muito forte o sonho, que acabou se tornando realidade em 1998, na Comunidade Sol de Deus.

E aqui estou como eremita há seis anos, muito feliz, nesta santa Comunidade, lavando os pés de meus queridos irmãos que me tratam com um exagerado e imerecido carinho.