O prego que mudou a minha vida...

Eu nasci numa época conturbada: 1968.
Revolução Cultural, Vietnã, Política de Choque, Hippies, Queima de Soutiens, Novos Baianos e Censura “comendo” solto.

Pergunta pro Ministro Gil que dias tensos… Nem tudo foi realce… Eia Mama… Realce…

Cresci na sombra do seqüestro do Carlinhos.
Um rapaz que foi seqüestrado, até hoje não encontrado e que marcava uma mudança no relacionamento dos pais e filhos cariocas. Entre eles agora estava a violência hedionda.
Era o fim da Era das Luzes…O Restaurante Fiorentina no Leme pegava fogo… O Edifício Joelma em São Paulo também. Começavam as obras do Metrô na Rua Sataminni e no “buraco do Metrô”… eu cresci.

O Rio de Janeiro virava uma cidade veloz. Andava de bicicleta lá dentro.
Catava pedras, brincava com os restos da obra, com pedaços de madeira fazia barcos, aviões, pequenos brinquedos. Ouvia da minha casa as explosões de dinamite “lá pros lados da Praça Saeñs Peña”. Lá iria ser uma grande estação do Metrô.

Soltava pipa e sonhava. Sempre sonhei demais.
E nas férias, a cada três ou quatro anos, íamos para Catanduva, no interior de São Paulo. No ônibus amarelo…Ali o mundo parecia parar…
Chegar a Catanduva era mágico… Lá estavam meus avós.

Quanto amor! Quanta Alegria! Quanta Comida!
O cheiro do interior, do Brasil que o Brasil ainda não conhece.
Explosões, medo de seqüestro, buracos do Metrô…
Tudo ficava para trás…

E um dia eu estava tão feliz!
Era um dia quente. Calor de verdade.
Eu estava perto dos antúrios que minha Vó Gioconda Peccioli plantou e cuidava.
Eu era tão pequeno e aqueles antúrios pareciam tão grandes.
E naquele calorão, meu Vô Toninho pegou um prego grande e um Martelo.

Pregou este prego na madeira que sustentava um telhadinho e pendurou ali uma mangueira ligada de onde saía muita água. Tomei um banho de mangueira!
Água deliciosa… Que formava arco-íris a cada movimento de minha cabeça.

Meu Vô que fez pra mim aquela “piscina” tão inesquecível!
Naquele prego estava um gesto de amor, acolhimento…
Nunca mais consegui sonhar com casa, com piscina, com coisas exuberantes.

Pode parecer andar pra trás em tempos tão consumistas…
Mas hoje eu sonho com a Casa de Catanduva.
Não quero mais nada além daquele clima de amor demais…

E hoje tenho um casal de filhos.
Esta semana estaremos indo para nossa primeira casa longe da Canção Nova, dos meus pais, de tudo que significa “segurança”…
Mas tenho uma certeza… Em minhas mãos já levo um prego… Já sei onde está a torneira e também já consegui uma bela mangueira.

Tenho certeza que, cada vez mais, teremos dias felizes.
Obrigado Vô Toninho… Obrigado Vó Gioconda…

Foi muito bom sair do buraco do Metrô pra ver aquele dia.
O dia do prego.

“Mas um dia apareceu a bondade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor para com os homens”.
Tito 3,4