Habemus Papam: Temos um Papa

Temos um Papa‘. Quando o Cardeal Camerlengo anunciou a grande alegria da eleição de um novo Papa, naquele entardecer do dia 16 de outubro de 1978, muitos perguntavam: quem será ele? Porém, suas primeiras palavras logo dissiparam quaisquer dúvidas. Jesus continuava a dar à sua Igreja um vigário seu, cheio de amor e dedicação.
Ano após ano, o Papa que veio de longe ia se tornando cada vez mais perto de seu rebanho. Bem cedo iniciou suas viagens apostólicas e missionárias, aproximando as nações e o coração do Pastor. Um dado que se tornou característico nessas viagens: o Papa fala a língua daquela nação onde vai. E as ovelhas ouvem e conhecem a sua voz. Vai ao encontro das dificuldades dos cristãos nas diversas localidades, martirizadas por situações difíceis, sejam políticas, morais ou outras. Nada o detém, a não ser a prudência de esperar o momento oportuno, a diplomacia da providência.

Temos um Papa‘, que conhece sua Igreja e seus fiéis. E que sempre enfrenta as dificuldades com heroísmo e pulso firme. Sofre em seu ser a incompreensão humana e carrega em sua alma as dores de toda a humanidade. Compreende como ninguém as necessidades de seu tempo; utiliza sua vasta formação para orientar e consolar. Enriquece-o uma grande cultura humanística, filosófica e teológica: pondera com sabedoria cada expressão que utiliza. Mesmo sem forças e comprometido, hoje, em sua dicção, suas palavras ecoam com a mesma força de persuasão dos primeiros anos de seu pontificado.
“Temos um Papa” que tem a autoridade de Pedro. Não se curva diante das pressões políticas com que, muitas vezes, certos regimes tentam envolver a Igreja e seus ministros. Ele vem ao encontro de todos os irmãos e assume-lhes a voz para, se necessário, gritar contra as injustiças e as desumanidades que se cometem contra tantos seres humanos.
“Temos um Papa” que é a mais sincera imagem de Bom Pastor. O alimento doutrinal é distribuído no tempo oportuno, na medida certa. Como se estivesse prevendo dificuldades, oferece caminhos para as soluções. Assim, suas Encíclicas, mensagens, cartas discursos, constituições e exortações apostólicas… constituem um tesouro precioso do seu magistério petrino. Em seus escritos, não deixa de apresentar as suas convicções e orientações a quem quer que seja.

Temos um Papa‘, que sabe escutar. Dando à importante instituição de Paulo VI, o Sínodo dos Bispos, um dinamismo ainda maior, o Papa sempre está presente. Participa de todas as sessões, de manhã e de tarde, ouvindo atentamente cada discurso, cada intervenção, anotando com carinho e recebendo os participantes para dialogar. Acompanha, de perto, os assuntos que vem sendo tratados. Ao final, recebe todas as documentações, as propostas e as sugestões e redige sua Exortação Apostólica Pós-sinodal que é sempre esperada com alegria e cujos frutos são perceptíveis.

Temos um Papa‘, que é respeitado pelas nações. Desde o discurso de fim de ano ao Corpo Diplomático, creditado no Vaticano, às visitas internacionais e discursos em fóruns especiais, onde a Santa Sé se faz presente, a palavra do Papa é ouvida com atenção e respeito. Situações delicadas de confrontos bélicos são muitas vezes elucidadas por intervenção direta do Santo Padre. Importantíssimos são seus discursos na ONU.
Ao longo de suas viagens apostólicas, onde pisou, ele elevou uma substancial transformação. Mudou a situação política da Polônia, derrubou o muro de Berlim, aproximou o Leste Europeu das demais nações, dentre outros eventos que modificaram o relacionamento internacional. Sua aeronave é como a pomba da paz que sobrevoa as nações levando o diálogo, a compreensão e as soluções para os conflitos. É o Anjo da Paz que perpassa os ares.
Temos um Papa‘, que compreende e sabe amar. Sensível ao sofrimento humano e acostumado às dificuldades, entende as mais contundentes questões sociais: no que concerne às desigualdades, às diferenças étnicas que geram conflitos e intolerâncias, injustiças de toda a ordem, sofrimentos e marginalizações. Tem sempre uma palavra para grupos particulares que necessitam de seu apoio e incentivo: anciãos, mulheres, artistas, cientistas, crianças, jovens, família. O Papa se une a todos eles, assumindo um compromisso pessoal, o interesse por todas essas pessoas. Está sempre ao lado do menos favorecidos, para o promover e, dentre estes, o nascituro ocupa lugar privilegiado, porque acredita na vida e a defende com todas as suas forças. Se o seu “sim” é forte, seu “não” é igualmente vigoroso: “não” aos mecanismos de morte, “não” a tudo o que possa diminuir o ser humano em sua dignidade.

Temos um Papa‘, que apesar de enfraquecido na saúde física, nada o detém. Está presente em todos os eventos e cumpre integralmente todos os programas de seu governo. Acompanha pessoalmente cada projeto e está atento a quaisquer situações que exigem sua presença e sua palavra. Ao longo destes vinte e quatro anos de pontificado, jamais fraquejou. Foi muitas vezes incompreendido, deturpado em alguns dos seus pontos de vista ou criticado por atitudes necessárias de vigor e atenção. Ele sempre fez as vezes do Cristo e foi, em todas as oportunidades, coerente com sua fé e fidelíssimo ao seu Senhor.
Antoine de Saint-Éxupèry, em seu Pequeno Príncipe, exclama: “O que me encanta nesse príncipe adormecido, é a fidelidade à sua flor”. Poderíamos parafraseá-lo e, igualmente, declarar com toda a força de nosso coração: também nos encanta, neste Papa, a fidelidade à sua flor. Fidelidade à Igreja de Jesus Cristo e à consciência do papel que ele desempenha neste mundo. Fidelidade que ele mesmo declarou no início do seu pontificado. Ele seria fiel a Cristo, ao homem e à Igreja. Nestes anos, temos contemplado o belíssimo testemunho dessa fidelidade e o cumprimento sereno de suas palavras iniciais.

Temos um Papa‘, que sofre a dor do mundo. E, como Jesus Cristo, ele vem se doando por seu ministério de forma visível. Em seu sofrimento físico e espiritual, ele se conforma cada vez mais ao Cristo que, no Calvário, se ofereceu, de forma mais sublime, pela salvação da humanidade. Hoje o Santo Padre se encontra exatamente nessa dimensão mística. Por isso, somos convocados interiormente a fortalecê-lo com nossas freqüentes preces, para que possa receber do Senhor da Messe e Pastor do Rebanho as forças necessárias para suportar, com força e com coragem, esse verdadeiro martírio em favor da Igreja.

Que a sua vida prossiga sendo o estímulo e o modelo acabado do Servo de Javé, que ocupa com tanta eficácia a Sé de Pedro!

Dom Eusébio Oscar Scheid
Arcebispo do Rio de Janeiro