A solidão nossa de cada dia...

Tá sozinho? Quer chorar? A solidão nossa de cada dia…
Moro no interior de um estado brasileiro e, outro dia, encontrei uma jovem conhecida chorando, sentada num canto da praça central da cidade, Ela tinha comprado um celular, distribuído o número e ninguém havia ligado para ela. O celular nunca havia tocado. Ela pagava uma prestação cara demais para ter certeza de que estava só.

Na mitologia grega há uma mulher – Atalanta – ocupada em provar seu próprio valor, ser perfeitíssima, o que obviamente não conseguiu. Assim, fixada no ideal da perfeição, tornou-se fria e solitária. A solidão que se origina do orgulho, que não permite que nenhum deslize humano destrua a imagem ideal que uma pessoa faz de si mesma, está diretamente ligada ao fato de ela não se sentir pertença de nada e sentir que nada pode lhe pertencer.

Um sentimento que invade a alma, acompanhado da pior sensação de isolamento: um sentido que não se completa, a esperança que não se irradia, a atitude que não se move, a prostração diante das informações, o afastamento do agito das ruas e do seu próprio interior.

Nessa hora, a única pessoa com quem você tem certeza que pode contar é com você mesmo. Será?

Como contar com alguém tão sozinho, prostrado, em estagnação interior, verdadeira paralisia espiritual, movimentos e ações anulados, com o íntimo barulhento, voltado cada vez mais para dentro de si. Uma voz no ouvido sussurrando: “você está sozinho e sem saída, a chorar e contar com você mesmo”.

E, às vezes, a causa de sua solidão vem do aspecto de você ser “autêntico”, tão “você mesmo”, escondido em uma personalidade forte, que não consegue fazer amigos e se relacionar, criando uma eterna desconfiança nos outros em conseqüência da sua insegurança.

O apego aos ideais é uma virtude que o ajuda a melhorar.

Mas pode se tornar uma defesa dura contra o medo de se relacionar com alguém. Ninguém resiste sem aceitar-se como é e descobrir-se simplesmente humano.

O preço que se paga por ser tão “você mesmo” é muitas vezes deixar de amar. E a solidão se dá em meio a um turbilhão de sentimentos confusos. Existem milhões de pessoas à sua volta. Pena que todas parecem estar falando no celular, com outras pessoas que não são você.

E, muitas vezes, quando alguém finalmente o encontra, no meio do que seria uma promissora conversa, pára para atender alguém mais importante e que ele nem sabe quem é. Mas com certeza é alguém que se interpõe com o direito de interromper sua conversa. Mais alguém no bendito celular alheio.

O que estaria errado? Que bando de gente insensível que não percebia aquela jovem em seus problemas tão sérios! Nem para perceber o seu olhar vago… Nem para enxergar toda a sua dor… Que coisa!

E a solidão vai produzindo seus efeitos.

A pilha de CDs está cada vez maior, as dívidas do cartão de crédito também (dizem que cheque pré-datado também vicia… É pior que cigarro).

Quanta dor de cotovelo, meu Deus! O que fizeram com a Música Popular Brasileira?! Cadê a Esperança do “Brasil Novo?”

Preocupo-me, quando uma banda de rock acha que é “cult” e chique ficar cantando canções da “raiz da dor de cotovelo” como: “O bar é o refúgio barato… dos fracassados do amor…” E dá-lhe Nora Ney!

Apela-se para o remédio genérico de dor de cabeça. A criança está chorando… Mais programa policial no meio da tarde. Basta trocar os canais da TV para descobrir motivos de stress: não há nada para ver e TV a cabo é tão cara! Será que vale a pena continuar pagando isso?

E a bendita voz interior ataca novamente: “Que dureza, que situação medíocre. Devia ter ficado dormindo.”

Meu amigo, se você não gosta da sua própria companhia, quem é que vai gostar?

Ao se olhar no espelho… bem, deixa pra lá… Alguém sabe o telefone de algum endócrino que passe dietas rápidas, práticas, baratas? Acho que vou fazer a operação do estômago… Ou será que compro lentes de contatos gelatinosas?

Não se pode resolver problemas difíceis com soluções fáceis.
E quando se trata da alma humana nada é tão fácil.

Quem sofre de solidão perde a confiança na capacidade que tem para pensar e enfrentar os desafios da vida, perde a confiança no direito de ser feliz, tem a sensação de não ser merecedor, digno, qualificado para expressar necessidades e desejos, e desfrutar os resultados de seus esforços.

Não consegue ter amor próprio, relaxa na forma como cuida de si mesmo, da saúde e dos relacionamentos, e como administra sua vida.

E o mais grave: perde a capacidade de ter vínculos sadios com as pessoas e com as coisas. Tenha certeza de que, lançar-se num grupo de pessoas e começar a encher sua agenda de telefones, pode até ajudar, mas o problema é muito mais interior do que de ter um monte de “amigos de ocasião para acabar com a solidão”.

Sofre de solidão a pessoa que perdeu a noção da presença de Deus.

Já percebeu: os que souberam reagir e sobreviver aos campos de concentração?

Viktor Frankl já nos exortava quanto à “Presença de um Deus Ignorado”.

O sobrevivente do campo de concentração de Auchwitz, escreveu em seu diário: “Aqueles que viveram nesses lugares de morte conseguem ainda se lembrar que, durante a noite, alguns dos que estavam ali, iam de barraca em barraca confortando os mais desesperados.

E, muitas vezes, ofereciam um pedaço de pão ou batata que havia sobrado.

Poucos eram capazes de agir assim, mas esses poucos davam a todos, a maior das lições: pode-se tirar quase tudo de um homem, menos sua liberdade de escolher. Não importa em que circunstância, a maneira como acha que deve agir.

Os que reagem positivamente não temem a dor e a solidão.

Sabem que algo maior os acompanha”.

Veja que nem tudo está perdido, mesmo em um campo de concentração. Você pode perceber que existe um Deus que não deve ser ignorado. Não viva a sensação que o grande filósofo canadense Charles Taylor denomina de “o desencanto do mundo” se espalha entre as novas gerações.

O consumismo da atual sociedade, o apego aos bens materiais, a concorrência feroz para alcançar melhores posições, a luta pelo dinheiro e poder geram uma sensação de solidão, que Victor Frankl chamou de um dramático “vácuo dos sentidos”. Há alguns anos, tive a experiência única de estar num deserto. Descobri que lá, o que mais faz barulho e incomoda é o meu interior. Como é complicado lidar com os ruídos internos…

Tudo isso me fez compreender os padres eremitas e os tais “Padres do Deserto”. E, hoje, as pessoas confundem estes sentimentos de solidão, não percebendo que, muitas vezes, Deus vem nos visitar assim.

Biblicamente, o deserto é o lugar das feras e das tentações. Jesus esteve lá por quarenta dias e sabe bem o que é isto.

Os momentos mais solidários que já aconteceram e que marcaram a história do homem foram, também, os mais solitários.

O homem pisando a Lua, a decisão de Martin Luther King em continuar sua luta, a postura de Gandhi, todas essas decisões foram tomadas, primeiro interiormente.

E quem não lembra do estudante chinês que parou uma fila de Tanques de Guerra, sozinho, em plena “Praça da Paz Celestial” — e este nome parece ironia do destino.
E o fato mais marcante de todos, o mais solidário e o mais solitário, dividindo a história da humanidade em antes e depois dele: O Calvário.

A cruz que se ergueu, o grito de:

“”Eli, Eli, lammá sabactáni?”

Meu Deus, Meu Deus, por que me abandonaste?” Como atesta Mateus no seu Evangelho, capítulo 27, versículo 46.

Foi na solidão que muitos encontraram espaço para refletir sobre a vida interior e transformaram o desamparo de estar só em quietude íntima, valorizando a vida interior.

Muitos indivíduos vivem dentro de um ambiente de rivalidade, agitação, palavrões, competitividade, pressa e terríveis tensões morais e psicológicas, ficando num estado de stress e desgaste que não conseguem estabelecer um equilíbrio entre o ambiente externo e o seu mundo interno.

Quantas também são as pessoas que lotam suas mentes por temerem estar vazias, pensam não haver nada dentro delas que lhes dê proteção, apoio e segurança. Manifestam um dos piores sintomas da solidão: auto-suficiência causada por autopiedade. São muitos os caminhos de Deus e a solidão pode ser um deles.

Não há solidão para quem crê firmemente em Deus.

Poderia achar-se só quem sofre os cuidados de Deus? Mas, hoje, é hora de você experimentar o deserto nesses momentos de solidão e transformar cada situação difícil em “trampolim”.

No trampolim parece que o seu equilíbrio se desfaz. Um pulo certo acaba levando você para baixo. Existe um lapso de tempo que é a dúvida. E agora?

E só quando você chega no alto do seu impulso, tem a oportunidade de evoluir e mergulhar no mistério de Deus. Ver os problemas por cima, por outro ângulo.

As situações difíceis causadas pela solidão podem levá-lo para o mais alto.