Vi em algum portal de notícias que certa celebridade brasileira processou outra celebridade, também brasileira, por difamação, por ter escrito no Twitter coisas que teriam ofendido a sua honra. A ofensa em questão foi dizer que, como cidadão, aquela pessoa era uma decepção. Isso foi suficiente para o ofendido contratar advogados e movimentar a justiça, dizendo que o ofensor extrapolou a sua liberdade de expressão.
Estou falando desse exemplo porque hoje, na minha oração diária, li um trecho das Confissões, em que Santo Agostinho relata um episódio singular ocorrido na juventude de sua mãe, Mônica. Todas as vezes que os pais mandavam a jovem pegar vinho no tonel, ela bebia um ou dois goles. Foi pegando gosto pela bebida e logo estava tomando dois ou três copos. Esta situação encontrou um fim no dia em que uma escrava, que sempre presenciava os exageros de sua ama, chamou-a de bêbada, com o intuito de ofendê-la em meio a uma discussão entre as duas.
A jovem Mônica, relata Santo Agostinho, “ferida por esse aguilhão, considerou a fealdade de seu hábito, reprovou-o e corrigiu-se”. O bispo de Hipona esclarece que não era a intenção da escrava ajudar a ama, mas tão somente ofendê-la, jogando-lhe na cara um defeito, mas ainda assim Deus aproveitou a ocasião para tocar o coração de Mônica, que refletiu sobre seu próprio comportamento, ao invés de exasperar-se com a fala agressiva de sua escrava.
Diante dos insultos, podemos ser governados pelos vícios ou pelas virtudes
Convido você, leitor, a refletir se seu comportamento parece mais com o da celebridade ou com o de Santa Mônica. Claro que não estou falando de processar quem o ofende, mas da disposição do coração. Quando recebemos ofensas ou acusações, podemos ser governados pelos vícios ou pelas virtudes:
Se deixamos os vícios nos comandarem, o orgulho nos torna cegos e nem consideramos a hipótese de o acusador estar certo. Tudo o que se passa no nosso coração é: “Fui insultado! Fui ofendido! Como fulano ousa falar isso de MIM, logo de MIM?” Note que no caso de Santa Mônica a escrava falou a verdade, ainda que sem intenção de corrigir. No caso da celebridade, não sei se a acusação é verdadeira, mas isso nem importa, já que o que quero é provocar a sua reflexão, leitor, acerca das suas próprias atitudes. Se começamos conduzidos pelo orgulho, a próxima convidada é a ira, que, por sua vez, nos leva a querer revidar, devolver na mesma moeda, talvez até partir para a violência. Daí vêm as atitudes impensadas, as reações desproporcionais, que muitas vezes levam a atos terríveis e irremediáveis.
Se, por outro lado, somos conduzidos pelas virtudes, a humildade nos faz questionar nossa conduta, admitindo a possibilidade de o ofensor estar com a razão. Ora, se sei que sou apenas um miserável pecador e alguém me acusa de ser, por exemplo, um mentiroso, a humildade me fará dizer a mim mesmo: “Pecador como sou, miserável como me reconheço, sei que se depender de mim, minha vida será governada pela mentira. Se hoje eu não costumo mentir, não é por mérito meu, mas tão somente pela graça de Deus derramada em mim. Se dependesse somente das minhas forças, não haveria maior mentiroso do que eu em toda a Terra”. A humildade prepara o caminho para a mansidão e a prudência nos manterem calados e calmos, refreando qualquer inclinação ao revide. O silêncio permite então que o Espírito Santo faça a obra reparadora que for necessária em nosso interior.
Aqui, um ponto precisa ser destacado:
O cristão que reflete diariamente sobre seu fim, isto é, sobre sua morte, sobre o céu e o inferno, sabe que o que realmente importa é salvar a própria alma. Se essa certeza norteia a sua vida, tudo é analisado sob a perspectiva da salvação. Voltando ao exemplo, se alguém me chama de mentiroso, mais do que a minha imagem perante meus semelhantes, mais do que o suposto dano à minha honra, minha maior preocupação deve ser: se o que ele disse for verdade, a minha salvação está ameaçada! Será que sou mesmo um mentiroso? Como quero ir para o céu mais do que tudo, vou analisar meus atos e examinar minha consciência para ver se tenho mentido ou não. E Deus, que é misericordioso e quer que todos se salvem, não negará seu auxílio e enviará o Espírito Santo para me dar luz e força para me corrigir.
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Roguemos a Deus, portanto, que sejamos humildes, mansos e prudentes para, até mesmo nos insultos recebidos, encontrarmos oportunidade de nos tornarmos melhores, mais parecidos com Cristo.