Invista na espiritualidade

O ser humano precisa curar seu tecido interior

A sociedade, cotidianamente, contamina-se por polêmicas, que geram enorme desgaste emocional e desperdício de energias. Perde-se a oportunidade para diálogos construtivos, capazes de contribuir na solução dos muitos problemas da atualidade. A incapacidade para dialogar construtivamente revela despreparo para o exercício de responsabilidades – profissionais, missionárias e cidadãs. Observa-se que há significativo descompasso entre as possibilidades tecnológicas do mundo contemporâneo e as condições emocionais da sociedade, que estão enfraquecidas, impactando o exercício das mais diferentes atividades.

Assiste-se a uma fragilização crescente das instituições, isso porque, na ausência de equilíbrio moral e emocional, falta clareza às pessoas. Assim, prevalecem certas conveniências condenáveis, que produzem descompassos e confundem os entendimentos. Nesse contexto, a capacidade para dialogar se enfraquece, dificultando a percepção da verdade e o exercício da solidariedade. O ser humano passa a se alimentar, patologicamente, das polêmicas. Torna-se incapaz de escutar críticas que ajudam a construir dinâmicas renovadas em diferentes contextos sociais. Sem clareza a respeito do próprio papel na sociedade, as pessoas perdem o senso crítico para se autoavaliar. Carentes de humildade, muitos se julgam melhores do que realmente são.

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Foto ilustrativa: Olezzo by Getty Images

Tecido interior esgarçado

Há uma pressa na emissão de juízos, desconsiderando as necessárias ponderações para adequadamente interpretar fatos, falas. Por isso mesmo, pareceres distanciam-se da realidade e prejudicam inúmeros processos importantes. Sintomas dessa realidade são os obscurantismos e as polarizações, sempre na contramão de princípios e valores inegociáveis. Percebe-se que os processos relacionais e institucionais não amadurecem na velocidade adequada. Acabam sendo banalizados na velocidade própria das redes sociais, sem que ocorra adequada análise dos conteúdos e de seus alcances, ou a identificação de responsabilidades. Eis a razão de assuntos polêmicos, que catalisam ampla e irrestrita atenção, caírem no esquecimento em poucos dias. O que se valoriza é o frenesi abusivo e pesado, que ameaça a saúde mental e emocional de cada indivíduo.

Entre as consequências desse cenário está a dificuldade para reconhecer o sentido que alicerça a vida, a falta de habilidade para se relacionar e a crescente violência – nas ruas e também nos lares – conforme revelam as tristes estatísticas sobre feminicídio, agressões a menores e vulneráveis. A casa deixa de ser o lugar dos primeiros e essenciais exercícios de sociabilidade, das dinâmicas dialogais, para se tornar palco de descompassos. Tudo comprova o adoecimento crescente da humanidade, agravado com outras crises de saúde, a exemplo da atual pandemia. As imunizações são urgentes, não somente para vencer a Covid-19, mas também para superar os outros adoecimentos que não raramente levam pessoas a desistir de viver.

O ser humano precisa curar seu tecido interior, para conquistar mais saúde integral – física, mental e emocional. A generalizada desorientação social é também sinal de que o tecido interior de muitos está esgarçado. E a recuperação da interioridade exige investimento na dimensão espiritual que qualifica, inclusive, competências técnicas e profissionais. Diante do generalizado adoecimento das pessoas e, consequentemente, da sociedade, é ainda mais necessário o remédio da espiritualidade. Evidentemente, não se deve abrir mão de outras medicações necessárias, mas a espiritualidade é a terapêutica que restabelece a dimensão mais essencial de cada pessoa. Oferece condições para que todos possam viver melhor, ampliando competências para o exercício de diferentes tarefas e responsabilidades do dia a dia.

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Espiritualidade

A vivência da espiritualidade contribui para que o sentido da vida seja percebido. Deve-se, pois, investir diariamente na dimensão espiritual, com ajudas especiais de confissões religiosas, sem proselitismos ou interesses pecuniários, mas a partir da sincera intenção de contribuir para erguer as pessoas. Assim o ser humano é tratado de modo integral, fortalecendo-se para ajudar na construção de um tempo novo. Cada pessoa precisa convencer-se da premência de curar seu próprio tecido interior, superando loucuras, para dar conta de viver e servir, com alegria. A tradição cristã, de mais de dois mil anos, tem um tesouro rico e inesgotável para ajudar a humanidade neste processo. Uma riqueza que ultrapassa ritos e prescrições.

As confissões religiosas, particularmente as cristãs, precisam oferecer, abundantemente, técnicas, dinâmicas e vivências que ajudem a humanidade na recomposição da interioridade. Na superação dos muitos sofrimentos insuportáveis, das indiferenças desoladoras e comprometedoras da paz, das disputas cegas, fratricidas e homicidas, invista-se mais na espiritualidade, para ajudar o ser humano a curar seu tecido interior.

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Dom Walmor Oliveira de Azevedo

O Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, Dom Walmor Oliveira de Azevedo, é doutor em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana. Atual membro da Congregação para a Doutrina da Fé e da Congregação para as Igrejas Orientais. No Brasil, é bispo referencial para os fiéis católicos de Rito Oriental. http://www.arquidiocesebh.org.br