O dia começa cedo. Às cinco da manhã, pai e mãe já estão de pé. A mãe lava o rosto enquanto o pai acorda os filhos. O pai vai ao banheiro, e é a vez de a mãe ir em cada quarto acordar os filhos de novo, porque eles nunca levantam quando o pai chama. Tudo acontece muito rapidamente: o pai já está na cozinha preparando a vitamina de banana e colocando os pães na chapa. A mãe deu banho e está penteando o cabelo da filha menor. Os dois filhos mais velhos já conseguem se arrumar sozinho, mas a mãe precisa apressá-los, a todo instante, com palavras de ordem. Agora, os filhos estão comendo, e o pai já tomou banho e está terminando de vestir a roupa. Em alguns minutos, todos terão que sair de casa, senão pegarão trânsito e chegarão atrasados à escola. Todos os dias isso se repete.
Para voltar da escola, é outra maratona. O pai sai do trabalho às pressas, apanha as crianças, enquanto a mãe passou a manhã correndo para arrumar a casa e preparar o almoço. O pai almoça e, antes que os filhos percebam, já voltou para o trabalho. A mãe, que almoçou antes, coordena as crianças, que trocarão de roupa, tomarão banho e se sentarão à mesa. Tudo acontece de forma acelerada, porque a tarde será curta para tanto dever de casa que a mãe terá que fazer com os filhos.
No início da noite, o pai chega cansado do trabalho e encontra a mãe cansada em casa. Os filhos estão no videogame ou na televisão. Cada um janta no seu horário e quando pai e mãe se dão conta, já é hora de dormir. Com as devidas alterações, essa é uma rotina bem comum para muitas famílias. As horas do dia parecem ser poucas para tantos afazeres. Não surpreenderia ninguém dizer que não são poucos os casos de famílias que terminam a semana sem ter tido tempo de conviver, conversar, sorrir, trocar afetos, importar-se com a vida do outro. Em muitos lares, a realidade é que as pessoas vivem não como família, mas como colegas dividindo um apartamento.
Qual a realidade da sua casa nessa quarentena?
Há algumas semanas, milhões de brasileiros têm vivido em isolamento social, numa verdadeira quarentena. Com isso, famílias que mal se falavam estão tendo que viver vinte e quatro horas sob o mesmo teto, um olhando para o outro, muitas vezes sem saber o que dizer. É um pai que descobre que não sabe lidar com seu filho adolescente; a mãe que não sabe brincar com os filhos; marido e mulher que perceberam que só viviam para cumprir obrigações do dia a dia e não conseguem ter uma boa conversa quando estão a sós.
Essa mudança brusca na rotina de sua família pode estar gerando dissabores, mas a sabedoria da nossa Igreja vem nos ensinar, por meio das palavras do Cardeal Kevin Farrel, que este “é um tempo de crescimento para cada um de nós, horas que não são mais marcadas pelo ritmo de trabalho e pela gestão familiar do ‘fazer’. Agora, serão horas marcadas pela nossa capacidade de deixar espaço ao outro dentro de nossas casas”.
Talvez, este tempo de confinamento seja a oportunidade que você esteja precisando para reaprender o seu papel em sua família. Que tipo de pai você tem sido para os seus filhos? Apenas um provedor material, que não dá qualidade às poucas horas em que está em casa? Que tipo de mãe você tem sido? Uma máquina de trabalhar, que produz, produz, deixa tudo pronto, mas não tem tempo para pegar um filho no colo, enchê-lo de beijos e afagos, rir com ele?
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Esse é o tempo da graça!
Pai, mãe, esposo, esposa, reaprendam os seus papéis. Não precisam ficar envergonhados, pois todos estamos reaprendendo todos os dias da nossa vida. Hoje, vocês estão juntos em casa como talvez nunca estiveram. Esse é um tempo precioso. O esposo pode reaprender o caminho da cozinha, para lavar louça, cozinhar. Pode relembrar como se segura o rodo e a vassoura e assumir a faxina da casa. A mãe pode redescobrir o prazer de cozinhar para o esposo e para os filhos, e preparar novos pratos com carinho e amor.
A família pode voltar a sentar-se à mesa para as refeições e, ali, reencontrar o riso, a leveza de se compartilhar uma vida. Os pais podem promover jogos, brincadeiras, momentos de descontração que tornem o lar luminoso e alegre, como tão bem disse São Josemaria Escrivá. Os esposos podem recuperar o romantismo com momentos a sós, que façam crescer a intimidade, relembrando o que nos continua a dizer o fundador da Opus Dei: “O amor dos cônjuges cristãos é como o vinho, que melhora com os anos e ganha valor.”
Por fim, é responsabilidade dos pais, nestes tempos tão difíceis, cultivar dentro do seu lar a ternura, que, como diz o Papa Francisco, é uma virtude “um pouco ignorada nestes tempos de relações frenéticas e superficiais”. Talvez o seu dia continue começando muito cedo, mas é hora de ficar em casa e reaprender o seu papel. Seu casamento florescerá, seus filhos crescerão em estatura, graça e sabedoria, e a sua família se edificará sobre a rocha.
José Leonardo Ribeiro Nascimento e Maria Andréa Souza de Andrade Nascimento, Comunidade Canção Nova Segundo Elo – Aracaju/SE