Acolhimento e Escuta: como a Pastoral da Escuta ajuda a combater a solidão
Com a modernização do mundo e os constantes avanços tecnológicos, cada vez mais as relações humanas foram sendo moldadas e as nossas percepções acerca da sociedade foram se transformando.
Basta analisarmos as nossas relações e a nossa rotina para vermos que temos tantas tarefas para realizar num único dia que, por vezes, não conseguimos tempo para simplesmente estar junto dos amigos e escutarmos uns aos outros. Estamos tão preocupados em trabalhar, fazer cursos, cuidar da casa, fazer exercícios físicos e tantas outras coisas que nos esquecemos de parar para estarmos uns com os outros, esquecemos de olhar nos olhos e cuidar dos que estão próximos a nós.
Vale ressaltar que essas preocupações são justas e necessárias, porém é preciso que busquemos uma rotina sadia e equilibrada para que as nossas relações não sejam sufocadas pelos nossos afazeres.
Construindo comunidades mais fortes através da escuta
Foi observando a necessidade das pessoas serem escutadas que, em 2012, foi fundada a Pastoral da Escuta pelo Padre José Carlos Pereira da ordem dos Passionistas, Pároco na paróquia Santa Cruz em Cascavel/PR.
“A Pastoral da Escuta nasceu da necessidade do mundo moderno, em que as pessoas quase não têm mais tempo de ouvir umas às outras […] No afã de suprir essa carência de serem escutados nas suas necessidades de partilha, muitos buscam, na Igreja, alguém que os escute. Porém, o padre, sozinho, nem sempre dá conta de atender e ouvir essas pessoas, e nem sempre a paróquia tem pessoas preparadas para auxiliá-lo nessa tarefa pastoral. “ (Trecho retirado do livro: Pastoral da escuta: por uma paróquia em permanente estado de missão / José Carlos Pereira. — São Paulo: Paulus, 2013)
Para atuar na pastoral da escuta, todos os agentes voluntários precisam passar um treinamento para conseguir contribuir com a vida da pessoa e saber discernir se será necessário direcioná-la a um profissional ou apresentar outros recursos presentes na paróquia que possam auxiliar nos seus problemas e dificuldades. Padre José Carlos ressalta, porém, que, em muitos casos, apenas o processo de ser escutado já é de grande valia para as pessoas.
O poder da escuta na vida de pessoas
Um bom exemplo disso é o caso vivenciado por Alexandre Coutinho, morador de Cachoeira Paulista, que, durante dois anos, foi agente da Pastoral da Escuta em uma das paróquias da cidade e testemunhou uma das suas experiências mais marcantes do tempo em que esteve voluntariado na Pastoral.
“Uma das experiências mais marcantes foi o acompanhamento de um rapaz que morava na cidade vizinha e sofria de esquizofrenia. Ele costumava ir à paróquia para fazer uma breve oração e, em uma dessas visitas, percebeu a placa da Pastoral da Escuta.
Ele me procurou e, com o passar do tempo, fomos construindo um vínculo de confiança. Começou a compartilhar a história de vida dele, desde a infância até o momento presente. Relatava suas dificuldades com a família, os amigos, o trabalho e os desafios de lidar com a esquizofrenia. Era um agente penitenciário que havia sido aposentado por causa da doença.
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Quando ele começou a participar da Pastoral da Escuta, estava muito nervoso, agitado e tremia muito. Mas, com o passar do tempo, com as conversas, as orações e o acompanhamento baseado nos ensinamentos do Padre José Carlos Pereira, ele começou a se sentir mais leve e tranquilo.
A graça de Deus agiu na vida dele, que, além de encontrar alívio para os seus sofrimentos, conseguiu realizar um grande sonho: casar. Ele conheceu uma moça e, com o apoio da pastoral, eles se apaixonaram e se casaram na igreja.
A esquizofrenia ainda faz parte da vida dele, mas ele aprendeu a lidar com a doença e a encontrar paz interior. Ele se dedica aos seus cuidados médicos e mantém uma vida normal, dentro do sacramento do matrimônio. Essa experiência me mostrou a importância da Pastoral da Escuta, não só para a vida do rapaz que acompanhei, mas também para minha própria trajetória como agente da igreja.”
A importância do treinamento para agentes da Pastoral da Escuta
Para que os momentos de escuta sejam efetivos e gerem frutos, existem uma série de critérios e passos que os agentes pastorais devem seguir e estar atentos.
No livro ‘Pastoral da escuta: por uma paróquia em permanente estado de missão’, que é o principal documento que norteia essa vivência pastoral, o autor faz questão de deixar claro que “a Pastoral da Escuta é um braço da Pastoral da Acolhida. É uma forma primária, no sentido de ser primordial ou fundamental, de acolher aqueles que chegam carentes de ser ouvidos nas suas necessidades elementares.”
O autor segue reforçando que é de suma importância que os voluntários estejam dispostos a escutar os desabafos das pessoas atentamente, que não “sejam dados a fofocas”, que devem buscar o máximo de informações e formações para auxiliar nos atendimentos e que as escutas devem ocorrer em lugares que ofereçam privacidade e conforto tanto para quem escuta quando para quem deseja partilhar.
A escuta como ato de amor e compaixão
“É gratificante ver como a escuta pode trazer conforto e esperança para as pessoas, e contribuir para a construção de famílias e comunidades mais fortes.
Acredito que as pessoas precisam, antes de tudo, ser ouvidas. Mais do que oferecer soluções, a Pastoral da Escuta proporciona um espaço para que as pessoas possam se expressar, desabafar e encontrar apoio para lidar com seus desafios.
A Pastoral da Escuta é um presente da Igreja, um espaço de acolhimento, escuta e compaixão, que tem o poder de transformar vidas.”
O simples ato de parar um momento do dia para escutar, com coração aberto e compassivo aqueles que precisam, é um exercício de acolhida com os irmãos e pode ser transformador tanto na vida de quem partilha quanto na vida de quem escuta.
Ester Vieira
É colaboradora da Fundação João Paulo II. Natural de São Caetano do Sul (SP), formada em Jornalismo pela Faculdade Canção Nova e serva da Obra Jovens Sarados.