A palavra caos significa ausência de ordem, confusão. Ela é utilizada na narração bíblica da criação, como que em uma figura de linguagem, para nominar o que precedia o cosmos (grego: ordem), o qual foi estabelecido pela palavra criadora de Deus.
A ordem foi precedida pelo caos e a presença teve como impulso condição para sua existência a ausência. Isso revela que a ação criadora de Deus é, por vezes, paradoxal e que a Sua lógica, muitas vezes, se revela para nossa humana compreensão ilógica.
Nossos raciocínios funcionam dentro de conceitos e esquemas pré-estabelecidos, que acabam condicionando toda a realidade que nos circunda, de acordo com este pensamento: Tudo para ser, de fato, bom, precisa ser e estar segundo nossos conceitos e segundo o que julgamos correto. E, quando as coisas acabam fugindo à nossa suposta ordem, sofremos profundamente a experiência da angústia e da crise.
O Todo-poderoso é especialista em confundir os esquemas humanos e em frustrar os caminhos de nossa limitada lógica. O Senhor, com Sua perpétua Ação no espaço e no tempo, continua fazendo o cosmos (a ordem) acontecer no território humano através da experiência do caos (desordem).
A experiência do caos é extremamente formativa e agregadora de eternidade, pois, quando a criatura se percebe sem o devido controle de si, principalmente no que deseja e sente, ela pode verdadeiramente se tornar barro nas mãos do Oleiro (cf. Jeremias 18, 1-12), sem querer dirigi-Lo e manipulá-Lo.
O estado de impotência confiante e abandonada é a condição mais fecunda para a ação de Deus, pois, quando o ser sabe e entende demais, corre o risco de atrapalhar a obra do Eterno em si ao querer ter em tudo as rédeas da própria existência.
Deus é quem sabe o que é melhor para nós, é Ele quem tem de entender o que acontece conosco. Não nós. A nós cabe o abandono… Pena que muitas vezes nos falta confiança e somos tão orgulhosos a ponto de querer ter o controle de tudo, desejando que até a ação redentora do Senhor aconteça do nosso jeito e se enquadre aos nossos esquemas.
É a lógica de Deus que salva por mais ilógica que nos pareça e não a nossa. Por isso, quando Ele desestrutura nossos esquemas e concepções, devemos nos abandonar em Suas mãos acreditando que do caos virá a ordem.
Existe uma bagunça redentora, na qual o ser é tornado caótico pela ação da Graça, para que Ela suscite o posterior reinventar-se. Mesmo quando o coração é destronado (bagunçado) no que crê e pensa, é preciso confiar. Deus sabe o que está fazendo, e Ele é o primeiro a desejar nosso crescimento e maturação.
Diante disso, quando a experiência do caos e da impotência nos visitar, a nós caberá a docilidade e o deixar que, através dela, Deus faça em nós a Sua obra. Assim seremos humildes o bastante para nos percebermos filhos impotentes e em tudo dependentes de Deus e não de seus irmãos aqueles que tudo sabem e que estão em igualdade de posição.
A impotência é uma concreta possibilidade de filiação. A desordem é precisa condição de possibilidade para que a ordem aconteça.
Confiemos mais em Deus do que em nós mesmos e permitamos que a Sua Lógica/Ação nos conduza ao Cosmos eterno, onde as realizações serão constantes e a felicidade se agregará perenemente ao que somos.