Entenda

A relação entre formação intelectual, valores e vida humana

A formação intelectual engloba tudo aquilo que podemos adquirir na educação formal, mas também o que podemos discernir ao longo de nossa vida a partir do conhecimento adquirido nas relações humanas, no ambiente em que vivemos, na realidade social, nas redes de informações de comunicação.

Numa sociedade barulhenta e intensa, sempre me coloco a pensar como temos conseguido manter uma disciplina que nos conduza, inclusive, a trilhar o que de bom o conhecimento pode nos trazer, no que nos limitamos e ainda o que podemos eliminar de nossa vida com tanto barulho.

Existe a ilusão que temos acesso a muitas coisas, muito conteúdo nas redes sociais e na internet de forma geral. De fato, comparando 20 anos passados, onde se usava o meio físico em livros e pesquisas para se chegar ao conhecimento, parece que, hoje, acessar conhecimento se torna mais fácil e com um volume imenso de informações.

Podemos dizer que sim e que não. Sim, porque rapidamente conseguimos acessar uma pesquisa de uma universidade do outro lado do mundo, com alguns toques no teclado, coisa que, anos atrás, poderia demorar muito tempo, e, muitas vezes, só poderia ser feita de forma presencial. Não, porque podemos buscar, nas fontes erradas, o conhecimento de forma rasa, com conteúdo enviesado de informações falsas ou de ideologias entremeadas, ou ainda conteúdo que nem sempre corresponde à verdade.

Créditos: fizkes / GettyImagens / Cancaonova.com

O que é preguiça intelectual?

Entre o caminho rápido e demorado, notamos uma presença, em parte de jovens e adolescentes, de uma espécie de preguiça intelectual que gera a dificuldade de parar. Um exemplo são as fake news, ou notícias falsas, que, quando espalhadas e sem o uso de senso crítico, podem fazer grandes estragos.

Avalia-se que o conhecimento está atrelado, por exemplo, ao Instagram, o que nem sempre é verdade. Sabe-se muito, mas tudo muito raso e, por vezes, não fundamentado, o que, na prática, parece gerar especialistas em tudo, e tudo sem muito fundamento.

Além do conhecimento intelectual, escolar, acadêmico e do aprendizado feito através dos livros, outro ponto importantíssimo, que precisa acompanhar o desenvolvimento de crianças e adolescentes, para estruturação da fase adulta é o desenvolvimento dos valores morais e éticos. A partir deles, temos uma contribuição direta para o despertar do senso crítico e da formação de referências positivas, que ajudarão no discernimento entre o que é certo e errado. É nesse senso crítico que mora também uma habilidade necessária em cada um de nós para o julgamento daquilo que convém ou não absorver, avaliar, aceitar ou negar.

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Formação de caráter

Não falamos apenas aqui do conhecimento técnico, dos conteúdos dos livros ou aquilo que se aprende na sala de aula, mas também do que trazemos dos ambientes pelos quais passamos e, ainda mais, dos valores que levam crianças e jovens a ampliarem seu senso de responsabilidade por si, pelo outro, pelo ambiente em que vivem.

Essa é sim, uma necessidade urgente em nosso tempo: viver voltado apenas para si desloca o ser humano de uma perspectiva solidária, empática e responsável. Mesmo que teoricamente cheio de informações, sem uma base sólida de valores, da percepção solidária ao outro e ao meio em que vive, certamente, será mais difícil que uma pessoa suporte, supere os desafios esteja onde estiver.

E uma formação fraca, nesse aspecto, constrói uma pessoa igualmente fraca, com baixa tolerância à frustração, com dificuldade de aceitar desafios ou superar obstáculos, voltada apenas para seus próprios interesses e problemas.

O papel da família no processo intelectual

Apenas através de uma vivência, que vai além do conhecimento acadêmico, é que uma pessoa se torna responsável pelos seus atos, com uma postura proativa frente ao que recebe do mundo, levando-o a questionar não apenas numa crítica vazia, mas para compreender o que recebe de informação, para que tenha clareza do que é influência ou não das imposições, as quais se submete ou não, e mesmo das influências ideológicas, sociais, políticas que recebe.

A família deve ser parte ativa nesse processo e estar atenta àquilo que seus filhos recebem no dia a dia. Essa formação é conjunta para que a pessoa se torne capaz de lidar com as influências externas vindas de todos os lados e formas, diretas ou indiretas, subjetivas ou sutis em tudo o que recebemos.

Tudo começa da pouca idade, dos primeiros anos de vida, dos cuidados com nosso corpo, com tudo o que vivemos, com o orientação para o simples, que leva à orientação do que é complexo.

Senso crítico

Sertillanges, no livro ‘A vida intelectual’, nos lembra que nossa memória não pode ser um caos, mas que, de forma ordenada, precisa escolher o que aprende e como aprende, para que seja usada da melhor forma possível. Não é útil que tenhamos milhares de informações em nossa mente, mas que tenhamos essa crítica aguçada sobre o que devemos absorver e o que devemos deixar de lado.

Somos seres sociais e seres inteiros, e, para nosso amadurecimento, necessitamos estar conscientes de que estamos inseridos num sistema que reúne regras, normas, condutas, e é nessa formação que necessita ser sólida, que faremos a distinção correta de tudo aquilo que recebemos. Tomar consciência e aprender por via formal ou informal, somando a isso valores, permite-nos a avaliação crítica de imposições sociais, de questões políticas, ideológicas e econômicas.


Elaine Ribeiro dos Santos

Elaine Ribeiro dos Santos é Psicóloga Clínica pela Universidade de São Paulo (USP). Colaboradora da Comunidade Canção Nova, reúne 20 anos de experiência profissional, atuando nas cidades de São Paulo, Lorena e Cachoeira Paulista, além do atendimento on-line para o Brasil e o Exterior. Dentre suas especializações estão Terapia Cognitivo-Comportamental, Neuropsicologia e Psicologia Organizacional. Instagram:  @elaineribeiro_psicologa