Como não adoecer meus relacionamentos com críticas e rótulos? Todo rótulo nasce de um pré-conceito – um conceito já existente sobre um determinado assunto, comportamento e pessoa. Por exemplo, quando mencionamos determinados nomes, o que vem à sua mente? Pense neste momento em pessoas conhecidas, famosas, podem ser pessoas da Bíblia, se for mais fácil para você. Mas precisa ser pessoas cuja personalidade e história você desconheça. Agora, eu lhe pergunto: o que você conhece dessa pessoa? E, uma vez que não conhece, por qual motivo pensa isso sobre ela?
Esse conceito que você tem dessas pessoas é real ou não? Esse conceito está baseado em quê? Você conhece profundamente a vida de cada um deles, para ter essa imagem definida em sua mente? Creio que não. Talvez você até tenha um certo conhecimento, mas será que sabe exatamente o que ela pensa e como se comporta diante de determinada situação? Isso é impossível! E esse é o ponto a que precisamos chegar. Se o que penso sobre o outro corre o risco de não ser verdade, então provavelmente minhas relações estão baseadas em uma falsa impressão que tenho do outro. Um pensamento, por exemplo, é construído e solidificado a partir de conceitos absorvidos e vivenciados. Esses conceitos passam a ocupar nosso imaginário e, assim, respondemos de forma reativa e intuitiva a determinadas situações.
Comportamento a base da intuição
Apresento uma situação corriqueira, fora de relacionamento, para ver o quanto somos reativos a partir de um comportamento aprendido: a simples e ordinária atividade de dirigir. Você, que já dirige há um ano, fica prestando atenção e olhando para o câmbio de marcha toda hora? Olhando para o pé, verificando se ele está alcançando o freio, a embreagem e o acelerador? Claro que não! Fazemos isso quando estamos na autoescola e, posteriormente, nas primeiras voltinhas de carro na rua. Com o tempo, esse comportamento se torna intuitivo, reflexivo: nem olho mais esses objetos que me eram tão fundamentais no início desse aprendizado.
A questão é que aplicamos esse comportamento e aprendizado a várias situações, inclusive em relacionamentos. Este é um ponto muito importante: como percebo o outro e como o trato. Conscientizar-se sobre a vida e as relações nos ajudará muito. Não enxergar a figura masculina, nem a feminina com os “rótulos da modernidade” nos torna pessoas livres. O que precisamos ver é a verdade, mas deve ser uma verdade iluminada pela Verdade, que é o Cristo.
Precisamos, agora, falar de algo pior que está por vir. Essas construções psíquicas podem ficar apenas nesse nível ou se enrijecer e formar uma crença disfuncional. E o que seria isso? Nosso sistema cognitivo é formado pela percepção de mundo que temos, ou seja, na minha óptica, naquilo que acredito que o outro pensa sobre mim e como percebo o mundo. Essas três dimensões formam minha crença, que pode estar distorcida, exagerada ou equivocada.
De que forma você vê o mundo?
Assim, é como se você colocasse um grande par de óculos escuros, que, nesse caso, é a sua crença, e percebesse o mundo a partir desse olhar. Mas quem disse que esse olhar é saudável e verdadeiro? Ele nos faz estar no mundo como se estivéssemos a todo instante diante de alguém nos oferecendo um modelo de óculos diferente. Ficamos extasiados com tantos modelos e acabamos escolhendo viver com um deles. Porém, a função do óculos é impedir o contato direto de nossos olhos com a luz que nos cega. Se partirmos desse princípio, então poderemos concluir que, muitas vezes, os óculos que adquirimos nos cegam diante da luz que é a verdade. Passamos a ver apenas uma parte da verdade e nos esquecemos de que ela não é apenas aquilo, mas existe um todo, mesmo que eu não perceba.
Trago agora para esse contexto a figura masculina. Pense: o que significa o homem para você? Se for possível, descreva sua forma de enxergar o homem: folgado, opressor, machista, parceiro, protetor…
Listinha pronta?
Agora, convido você a confrontar essas frases que você lembrou ou anotou:
– Elas estão rígidas como uma crença ou não?
– Elas são suas ou você as absorveu de alguém?
– Elas são reais ou fantasiosas?
– São deterministas ou não?
Olhe além dos rótulos
Confronte! Pois nosso julgamento vem carregado de suposições que surgem a partir de tais crenças. E tenha cuidado com esses conceitos que não são nossos, mas de alguém que sofreu em sua história e que enxerga a vida apenas sob esse viés. Você precisa aprender a separar essa fala e experiência que não são suas, mas de outra pessoa, pois tudo isso pode gerar grande confusão em sua mente e, a partir daí, surgirão problemas que poderiam ser evitados. Quais motivos você tem para acreditar nessa forma tão limitante de descrever o ser humano?
Um outro ponto importante a ser refletido sobre rótulos é o quanto também gostamos de assumir lugares de autoridade e esconder nossa humanidade atrás de uma função. Perceba o quanto esse viés do rótulo está emaranhado em nós. Esse ponto também alimenta esse olhar de que já falamos, pois acabamos nos comportando como uma função e não como uma pessoa. Nesse caso, podemos ter como exemplo o trabalho: somos treinados, desde cedo, a assumir lugares, funções e posições. A começar pela família, que faz distinção entre o comportamento do filho mais velho e o do mais novo. A forma de cobrar se torna diferente, mas não por perceber que precisam de uma educação diferente devido ao seu temperamento ou personalidade. A razão pura e simples é que o mais velho precisa dar exemplo, e o mais novo é jovem demais para se exigir isso dele. Não existe um olhar
individualizado que o torna uma pessoa, mas um olhar de qual lugar/posição ele ocupa na família.
Atenção as ações limitantes
Os pais, muitas vezes, determinam o comportamento de seus filhos, com olhares e falas que limitam e direcionam seu campo de ação, sem perceberem o mal que isso faz na vida deles. Essa é a explicação de falas como:
– Ele é assim mesmo, não obedece a ninguém, nem a gente!
– Você nunca aprende nada mesmo!
– Você tem que dar exemplo, é a mais velha!
– Seu irmão é assim mesmo, irresponsável, não vai mudar.
– Ah! Ele é da família… e eles são bravos demais.
– Fulano? Ah! É da família… e lá, eles não têm paciência nenhuma, tudo é para ontem.
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Escolhas baseadas em julgamentos
É engraçado perceber que se rotulam a posição na família, as características e até o grupo familiar. Colocam-se todos em um balaio só e desconsideram totalmente a individualidade e capacidade que o outro pode ter de fazer diferente. E sabe o que acaba acontecendo? Tudo se repetindo, pois surge o pensamento: “Já que me enxergam assim, eu devo ser assim mesmo”. E, não sabendo fazer diferente, acabo fazendo escolhas que confirmam toda essa fala.
Outro tipo de função é o cargo, a posição ocupada no trabalho. Quantas pessoas fracas e frágeis, não sabendo mais quem são, se escondem por detrás de um cargo? Assim, deixam de se relacionar como pessoa, e passam a ser apenas o cargo, agindo como um cargo e esperando que o outro também enxergue apenas o cargo. E sabe o que é pior? Tais pessoas reclamam, muitas vezes, por estarem sozinhas, e que gostariam que os outros as tratassem como uma pessoa que tem sentimentos e angústias. Elas se esquecem, porém, que é o seu comportamento que tem afastado as pessoas e feito com que elas automaticamente enxerguem apenas o cargo.
Tome cuidado para não se esconder atrás do cargo e para não se relacionar apenas com pessoas que ocupam esse lugar. Como é feio tratar bem sua autoridade, e não a pessoa que ocupa esse lugar! E, assim, quando a pessoa deixa esse lugar para que outro assuma, seu olhar deixa aquela pessoa que saiu e passa se devotar à nova autoridade. E a pergunta que fica é: onde fica a pessoa? Você enxerga apenas o que ela pode lhe oferecer quando está nesse cargo? Pobre alma! Não consegue mais enxergar pessoas, mas apenas o seu umbigo e o que lhe interessa, para manter uma boa aparência, status ou poder.
Saiba enxergar o próximo
Todas essas atitudes são armadilhas que as relações a partir de rótulos podem oferecer. Até mesmo porque podemos reagir a partir da forma como passamos a enxergar a vida.
Será mesmo que está tão saudável o meu ponto de vista, ou será que ele está distorcido, equivocado ou até exagerado? O que tenho que fazer então?
É importante saber fazer a leitura do outro, pois isso ajuda os relacionamentos a fluírem sem ficar dando murro em ponta de faca e com brigas desnecessárias. Mas, ao mesmo tempo, não podemos ficar presas em uma estrutura enrijecida de rótulos criadas por nós mesmas, uma visão turva da realidade do outro, por passar pelo filtro da carência, rejeição, abandono, desamor…
Uma nova experiência
Um outro bom modo de se sair bem, é atribuindo qualidades e virtudes a quem está a sua volta, começando pelo seu esposo. Sem perceber, você acaba convencendo o seu esposo do quanto ele é ruim e inútil, de tanto que fala isso na cabeça dele. Faça o contrário durante trinta dias. Fale daquilo que ele faz que é bom! Mas sem mentira! Tente ver o que ele faz de bom e vá dizendo a você, a ele e às pessoas que convivem com você, o quanto ele é uma pessoa legal, honesta, trabalhadora… Você vai ver um homem diferente surgir diante dos seus olhos. Caso você seja solteira, faça isso com o seu pai, seu irmão, tio, namorado… Mas não deixe de fazê-lo.
Tenha clareza da sua identidade, para que você não fique à mercê do que o outro acha que você é. Ele tem uma visão limitada de você. Ele não consegue vê-la por completo, então não dá para acreditar que você seja 100% do que tem dito sobre você.
Uma autorreflexão
E, por fim, olhe para você e se questione:
– Como estou tratando meus relacionamentos?
– Como tem sido minha comunicação com eles?
– Qual tipo de comportamento estou tendo?
– Qual é a forma de pensar que estou tendo em relação ao outro?
– Eu tenho criticado a pessoa ou feito uma queixa?
A saber, a crítica é um comentário sobre a identidade, sobre a pessoa, e a queixa é sobre o comportamento, sobre aquilo que foi feito.
Talvez seja você a pessoa que precisa deixar de rotular e de se relacionar com o outro através de um rótulo. Liberte-se disso!
Trecho extraído do livro “Carta aberta às mulheres”, de Aline Rodrigues