Para entender essa questão, em primeiro lugar, é preciso entender o que é o mal. “Deus é inacessível ao mal” (Tg 1,13), portanto, o mal não é um lado de Deus, tampouco um outro deus, uma outra força divina, porque o Senhor se revelou como único Deus a Israel em inúmeras situações. Então, o que seria o mal? Na verdade, ser mau não é um ser, uma coisa ou força, mas uma carência do bem, assim como as trevas é a ausência de luz. Por isso, disse Bento XVI: “ O mal só existe onde Deus é insuficiente”.
O mundo, por Deus, foi criado bom. É notável e maravilhoso que, no relato da criação, em Gêneses 1,1-31, ao fim da criação de cada coisa é dito: “E Deus viu que isso era bom”. Ao fim de todo relato, no versículo 31, o autor bíblico diz: “ Deus viu tudo o que tinha feito era muito bom”. Portanto, tudo o que Deus criou é “muito bom” e não existia o mal em nada.
Como o mal entrou no mundo?
O capítulo terceiro do livro de Gênesis conta como o mal entrou no mundo. Em uma linguagem figurada, vemos a imagem da serpente que alicia Eva e, por meio dela, Adão. O significado desse texto é que o homem, que até então vivia em intimidade e perfeita harmonia com Deus, rebelou-se contra Ele, seduzido por um ser enganador. Sem Deus, o homem e o mundo estão sujeitos ao mal moral (carência da finalidade a que o homem deve tender, especialmente felicidade e amor) e físico (carência de algo no plano material como a fome e a dor).
Quem é esse ser enganador? Um deus do mal? Inúmeros textos bíblicos fazem referência a anjos decaídos, ou seja, seres criados por Deus que são puro espírito, que deveriam servir a Deus, mas “rejeitaram radical e irrevogavelmente a Deus e Seu Reino” (CIC 392).
Alguns textos do Antigo Testamento são interpretados pela tradição cristã como um relato da queda de um anjo chefe, satanás, que se volta contra Deus (cf. Is 14,13-14; Ez 28,17). Especialmente Ap 12,7-10 fala da batalha do dragão e seus anjos contra Miguel e os anjos dele. O dragão e os anjos passam a ser os tentadores, ou sejam, aqueles seres que não são deuses, mas que, identificados como o mal, tentam levar o homem a escolher o mal.
Então, dessa forma, o mal entra na existência simplesmente como aquilo que rejeita “Deus, que é amor” (I Jo 4,8).
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O mundo poderia existir sem o mal
Fica claro, então, que o mundo não só poderia existir sem o mal, como ele já existiu sem o mal. Mais ainda, o mundo voltará a existir sem o mal: “Vi, então, um novo céu e uma nova terra, pois o primeiro céu e a primeira terra desapareceram e o mar já não existia. Eu vi descer do céu, de junto de Deus, a Cidade Santa, a nova Jerusalém, como uma esposa ornada para o esposo.
Ao mesmo tempo, ouvi do trono uma grande voz que dizia: “Eis aqui o tabernáculo de Deus com os homens. Habitará com eles e serão o seu povo, e Deus mesmo estará com eles. Enxugará toda lágrima de seus olhos e já não haverá morte, nem luto, nem grito, nem dor, porque passou a primeira condição. Então, o que está assentado no trono disse: ‘Eis que eu renovo todas as coisas’. Disse ainda: ‘Escreve, porque estas palavras são fiéis e verdadeiras’. Novamente me disse: ‘Está pronto! Eu sou o Alfa e o Ômega, o Começo e o Fim. A quem tem sede eu darei gratuitamente de beber da fonte da água viva. O vencedor herdará tudo isso; e eu serei seu Deus, e ele será meu filho’” (Ap 21,1-7).