Apóstolo Paulo na rede social?
É difícil pensar como Paulo se comportaria se tivesse uma rede social em seu tempo. Não sabemos se postaria uma foto de comida, uma selfie com Priscila e Áquila ou uma oração daquelas bem bonitas. A notícia boa, no entanto, é que podemos acessar a primeira publicação que aparece em sua “linha do tempo”, sua primeira correspondência que conhecemos e o primeiro escrito bíblico feito depois de Jesus: a Primeira Carta aos Tessalonicenses! É o retrato mais antigo de uma comunidade cristã, a qual nos permite conhecer como foi a vida do cristianismo no início da evangelização.
Foto: Daniel Mafra/cancaonova.com
Escrito antes dos Evangelhos?
O texto de 1 Tessalonicenses foi escrito antes mesmo dos Evangelhos. Parece confuso, mas a história é simples. Logo depois da Ressurreição de Jesus, os apóstolos evangelizaram onde o próprio Senhor viveu, na Galileia e na Judeia. Eles se dedicavam à pregação e ninguém estava muito preocupado em registrar, por escrito, o que Jesus havia dito, porque a lembrança das palavras impactantes de Jesus estava viva no coração das comunidades.
Os doze apóstolos eram testemunhas oculares de Jesus, e, certamente, haviam outras, que animavam as igrejas como pregadores itinerantes. Como alguém poderia conhecer sobre Jesus naquela época? Bem, bastava falar com alguma pessoa que tinha estado com Ele ou mesmo com outros que haviam escutado a pregação dos discípulos.
Com o tempo, as primeiras tradições escritas aparecem. Os estudiosos pensam que foi organizada perto do ano 40 uma coleção de frases que Jesus falou (se quiser conhecer mais, pesquise sobre a “Fonte Q”). Porém, nenhum dos Evangelhos ou os Atos dos Apóstolos ainda tinham sido escritos quando Paulo começou suas viagens missionárias, no ano 46, fazendo o cristianismo sair mundo afora.
Abrindo o álbum do cristianismo
Paulo vive uma dura experiência nos três meses que passa em Tessalônica, na sua segunda viagem missionária. Ele e Silas são considerados agitadores e expulsos da cidade antes que pudessem catequizá-la integralmente, o que dói no coração de Paulo. Ele sabia da fragilidade da comunidade e, como um pai que forma e uma mãe que cuida (1Ts 2,7.11), Paulo sabe de sua responsabilidade com essa Igreja que nascia no meio dos tessalonicenses.
Depois de uma pregação frustrada, em Atenas – uma das mais difíceis da história do apóstolo dos gentios –, Paulo encontra abrigo em Corinto. Porém, quando chega na cidade, não são só as duras lembranças de abandonar Atenas com gosto de frustração que povoavam sua memória. Seu coração está aflito sobre o povo de Tessalônica. Será que tinham abandonado a fé? Timóteo havia sido enviado para lá, mas ainda não havia chegado com notícias.
Quando Timóteo chega, uma grande surpresa: a comunidade estava viva e forte! (1Ts 3,6-13). Cristo estava em Tessalônica! A alegria de Paulo é tão grande, que escreve uma carta, no ano 51 d.C., para valorizar a fé dos tessalonicenses, fazendo uma das maiores ações de graças que encontramos em suas cartas. Ela é a primeira foto do álbum de memórias do cristianismo.
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Uma foto de muitas cores
A carta de Paulo é afetiva, cheia de carinho pela comunidade. É uma foto de muitas cores: a mensagem é de ânimo diante da luta do dia a dia; o louvor e a ação de graças são o tom com que Paulo os acolhe, elogiando a perseverança e o fato de que, mesmo muito nova, já é uma comunidade evangelizadora (1Ts 1,7-8). Se o fundador da comunidade não podia estar presente, sabia que o Espírito Santo era a verdadeira fonte de alegria da comunidade, e Ele próprio guiava-os no caminho (1Ts 1,6; 4,8; 5,19).
Paulo os chama de ekklesia (“Igreja, assembleia”) e é a primeira vez que a Palavra é usada no Novo Testamento. Como eram muito pobres, não tinham participação em nenhuma assembleia social representativa do povo, mas Paulo lembra que eles pertencem à Igreja de Cristo! (1Ts 1,1). Também aproveita para formar essa Igreja para uma vida que vai além desse mundo, ensinando sobre o retorno de Jesus (1Ts 4-5).
Não tendo grandes recursos financeiros e dedicando-se ao serviço braçal, os fiéis de Tessalônica eram vistos em condição inferior, porque o mundo greco-romano pensava que esse tipo de trabalho não era feito para os mais nobres. Então, o próprio Paulo lembra que ele mesmo trabalhou na comunidade (1Ts 2,9), ensinando que a verdadeira dignidade está em ser filhos de Deus! Então, todos eram verdadeiramente irmãos – a palavra se repente 19 vezes na carta!
Contemplando o colorido desse primeiro retrato do cristianismo, podemos entender um pouco do que deve ser pregar o Evangelho hoje. Nas redes sociais, há algumas pessoas que postam suas queixas e lamentos ou gastam seu precioso tempo de vida insultando quem tem opinião contrária a eles. Paulo, no frescor da mensagem cristã, mostra que cristão é anunciador da Boa Nova. Assim, dedica-se a divulgar a beleza e alegria do Evangelho, que encontra terra fértil no coração dos pequenos.
Fabrizio Zandonadi Catenassi
Mestre e doutorando em Teologia (PUCPR); professor de Sagrada Escritura (Católica SC); membro da diretoria da Associação Brasileira de Pesquisa Bíblica; assessora cursos bíblicos e retiros no Brasil e na América Latina.