Por que esse título a Maria?

Nossa Senhora do Ó e a expectativa pela segunda vinda do Senhor

Muitos são os títulos e devoções a Nossa Senhora. Contudo, falar de Nossa Senhora do Ó nos une ao coração da Mãe que esperou alegremente o nascimento do Menino Deus e também nos coloca na expectativa de Sua segunda vinda gloriosa.

Tal título mariano é até curioso por apresentar a interjeição “Ó”. E qual seria a relação dessa expressão com o aguardo pela chegada do Messias?

Nossa Senhora do Ó e a expectativa pela segunda vinda do Senhor

Foto Ilustrativa: by Getty Images / DeVon Wilson

Como surgiu a devoção a Nossa Senhora do Ó?

A devoção surgiu precisamente das antífonas das vésperas da Liturgia das Horas das datas de 17 a 23 de dezembro, ou seja, dias antes do nascimento de Jesus. São sete antífonas rezadas antes e depois do Magnificat, e todas elas começam com a interjeição “Ó” seguida de uma invocação a Jesus, como, por exemplo, “Ó Sabedoria”, “Ó Chave de Davi”, “Ó Sol nascente justiceiro”.

Invocações que recordam o momento em que Maria estava grávida, prestes a dar à luz. Imagine como não estaria o coração dela e a expectativa para contemplar o rostinho do Menino Deus! Como qualquer mãe que prepara o enxoval de seu bebê, Maria também deve ter feito o mesmo. Céus e terras à espera do nascimento do Salvador!

O “Ó” é uma expressão que indica admiração, júbilo e uma grande alegria! Maria foi Aquela que esperou e confiou. Uma expectação feliz e confiante.

Vejamos quais são essas antífonas rezadas recitadas antes e depois do Magnificat nas vésperas dos dias antecedentes ao Natal do Senhor:

Dia 17 de dezembro

Ant. Ó Sabedoria, que saístes da boca do Altíssimo,
e atingis até os confins de todo o universo
e com força e suavidade governais o mundo inteiro:
Ó vinde ensinar-nos o caminho da prudência!

Dia 18 de dezembro

Ant. Ó Adonai, guia da casa de Israel,
que aparecestes a Moisés na sarça ardente
e lhe destes vossa lei sobre o Sinai:
vinde salvar-nos com o braço poderoso!

Dia 19 de dezembro

Ant. Ó Raiz de Jessé, ó estandarte,
levantado em sinal para as nações!
Ante vós se calarão os reis da terra,
e as nações implorarão misericórdia:
Vinde salvar-nos! Libertai-nos sem demora!

Dia 20 de dezembro

Ant. Ó Chave de Davi, Cetro da casa de Israel,
que abris e ninguém fecha, que fechais e ninguém abre:
vinde logo e libertai o homem prisioneiro,
que, nas trevas e na sombra da morte, está sentado.

Dia 21 de dezembro

Ant. Ó Sol nascente justiceiro, resplendor da Luz eterna:
Oh, vinde e iluminai os que jazem entre as trevas
e, na sombra do pecado e da morte, estão sentados.

Dia 22 de dezembro

Ant. Ó Rei das nações. Desejado dos povos;
Ó Pedra angular, que os opostos unis:
Oh, vinde e salvai este homem tão frágil,
que um dia criastes do barro da terra!

Dia 23 de dezembro

Ant. Ó Emanuel: Deus-conosco, nosso Rei Legislador,
Esperança das nações e dos povos Salvador:
Vinde enfim para salvar-nos, ó Senhor e nosso Deus!

Textos belíssimos que denotam o grande júbilo pelo Messias e Salvador que está para chegar na história e coração da humanidade. Para celebrar a expectativa de Nossa Senhora e a alegria com que aguardava o nascimento de Jesus, há uma tradição de denominar os últimos dias antes do Natal como “semana da expectação” ou “da esperança”. Expressões do grande suspiro da alma pela vinda do Senhor e o convite para que cantemos com Maria as maravilhas do Senhor.

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Como foi firmada a devoção ao longo da história

O décimo Concílio de Toledo (na atual Espanha), no século VII, foi o responsável pela instituição da festa da Anunciação, na época, a 18 de dezembro (atualmente, celebra-se no dia 25 de março). Esse concílio teve a presença de nomes importantes na Igreja como Potâmio, bispo de Braga; São Martinho de Dume; e de três santos: Santo Eugênio III, de Toledo (presidente do concílio); São Frutuoso, que fora também bispo de Braga; e o então abade agaliense Santo Ildefonso.

Quando Ildefonso assumiu o arcebispado, sucedendo a Eugênio, determinou que, na data de 18 de dezembro, fosse comemorada a festa da “Expectação do Parto da Beatíssima Virgem Maria”. Deste modo, comemorava-se conjuntamente a Anunciação de Nossa Senhora e a Encarnação do Verbo. Assim, teve início a devoção em terras hispânicas ou a devoção própria da Península Ibérica; em seguida, adentrou-se mais no solo português, como na Arquidiocese de Braga, e, depois, em tantos outros lugares mundo afora.

Pode-se dizer, ainda, que a devoção à Senhora do Ó é uma continuidade da compreensão da Igreja dos primeiros séculos sobre a maternidade de Maria. O dogma da maternidade foi proclamado no Concílio de Éfeso (431 dC) e reafirmado em concílios posteriores. Consiste em reconhecer a Virgem Maria como Mãe de Deus (Theotokos). Jesus tinha a natureza divina e humana e Maria, portanto, é aclamado Mãe do Cristo todo! Sabedoria de santos, bispos e papas a quem o Espírito Santo iluminou para congregar o povo de Deus na devoção e amor à Maria Santíssima.

Outras curiosidades sobre as antífonas do Ó

O Dicionário Elementar de Liturgia, do Secretariado Nacional de Liturgia de Portugal, traz algumas curiosidades sobre as antífonas proferidas antes e depois do Magnificat, nas vésperas do Natal: em latim, as iniciais das denominações a Jesus que acompanham o “Ó” (Sapientia, Adonai, Radiz Iesse, Clavis, Oriens, Rex gentium, Emmanuel), se lidas de trás para frente, formam a expressão “ero cras”, cujo significado é “serei amanhã, estarei, virei amanhã”. Os jogos de palavras eram muito apreciados na Idade Média e tais invocações do “Ó” foram, assim, interpretadas como uma misteriosa resposta do Messias e garantia de Sua vinda.

Desse modo, pode-se ver como tal devoção é ainda muito atual, pois nos coloca na preparação para a segunda vinda do Senhor. Cristo nasceu, teve sua vida terrena, morreu e ressuscitou. Desde então, a Igreja espera e prepara-se para a Sua segunda vinda gloriosa, quando vai julgar os vivos e mortos, restaurar este mundo e fazer tudo novo!

Em alguns momentos da Liturgia e da Sagrada Escritura, há invocações de espera por Cristo Jesus:
“Marana tha” (‘Vem, Senhor!’) – 1Cor 16,22; “Amém, vem, Senhor Jesus!’ – Ap 2,20; “Anunciamos, Senhor, a vossa morte, proclamamos a vossa ressurreição. Vinde, Senhor Jesus!” (Oração Eucarística). Ou seja, anunciamos que Cristo morreu, ressuscitou, mas que voltará! Como Maria, aguardamos Sua vinda e aprendemos dela como nos mantermos nessa espera, buscando, no agora, uma vida de santidade. A resposta citada acima é feita, na Missa, instantes a seguir ao momento em que pão e vinho tornam-se o Corpo e Sangue de Cristo. Tudo isso para indicar que o Senhor deseja nos encontrar numa vida eucarística, em que o Santo Sacramento é o centro de nossa existência e fonte de uma vida nova!

Que Ele “nos encontre em paz, puros e santos”, como diz a conhecida música da Comunidade Canção Nova. E que Nossa Senhora do Ó seja a nossa Mãe e Mestra na arte de nos deixarmos moldar pelo Espírito Santo, para que, além de uma espera ativa pela segunda vinda do Senhor, saibamos levar uma vida de preparação e conversão.