Igreja

Tantos anos, Papa Francisco!

O Papa Francisco está completando 12 anos de pontificado, e o faz de um lugar que, certamente, jamais teria imaginado: no quarto de um hospital, longe da multidão de fiéis que tanto o ama. Longe do frenesi da sua agenda lotada de compromissos, mas perto da dor de muitas pessoas que, como ele, estão internadas no Hospital Gemelli, almejando uma cura e a volta para casa.

Doze anos se passaram desde aquele momento em que o cardeal Bergoglio apareceu no balcão central da Brasílica vaticana e encantou o mundo, primeiramente com o nome escolhido, “Francisco”, e depois com o seu pedido: “Antes de dar a minha primeira bênção, quero que vocês abençoem o bispo de Roma”. Um gesto de aproximação não indiferente com aquela multidão que se reuniu na Praça São Pedro após a tão desejada fumaça branca da chaminé da Capela Sistina. “Temos Papa”.

Muita coisa viveu Francisco nesses 12 anos de pontificado

Muitos países visitados: primeiro o Brasil, para a JMJ do Rio de Janeiro em 2013.

Desnecessário elencar tudo o que fez, mas podemos simplesmente dizer que o Sucessor de Pedro girou o mundo confirmando os irmãos na fé. E um desses gestos, que em certo sentido resume seu pastoreio e que me chamou muito a atenção, foi na viagem mais longa de seu pontificado no ano passado: Indonésia, Papua Nova Guiné, Timor Leste e Cingapura.

Há mais de trinta anos, na Argentina, uma senhora idosa disse ao então arcebispo de Buenos Aires, Bergoglio, que a misericórdia divina é o pilar que sustenta o mundo: “Se o Senhor não perdoasse tudo, o mundo não existiria”. Hoje, aquele homem que tomou o nome de Francisco indica o “motor” que faz o mundo progredir.

Quando esteve em Jacarta, no mês de setembro passado, na catedral da cidade, o Papa explicou que o que impulsiona o mundo é “a caridade que se doa” na compaixão. Disse que compaixão não significa distribuir ajudas ou esmolas aos necessitados “olhando-os de cima para baixo”, mas significa inclinar-se para realmente se conectar com aqueles que estão no chão e, assim, erguê-los e dar-lhes esperança. Significa também abraçar sonhos e desejos de redenção e justiça dos necessitados, tornando-se promotores e cooperadores.

No mundo, há aqueles que têm medo da compaixão

“Porque a consideram uma fraqueza e, em vez disso, exaltam, como se fosse uma virtude, a astúcia… A astúcia daqueles que servem a seus próprios interesses mantendo distância de todos, não se deixando ‘tocar’ por nada nem por ninguém, pensando que assim são mais lúcidos e livres para atingir seus objetivos.”

Mas isso é uma maneira falsa de ver a realidade. Porque o que faz o mundo progredir não são os cálculos de interesse próprio – que geralmente acabam destruindo a criação e dividindo as comunidades –, mas a caridade que se doa.

A compaixão não obscurece a visão real da vida; pelo contrário, ela nos faz ver melhor as coisas à luz do amor.

E qual compaixão?

É a compaixão que Jesus nos testemunha em cada página do Evangelho. Sim, Jesus não permanece indiferente à realidade, ele se comove visceralmente, deixa-se ferir pelo drama e pela necessidade daqueles que encontra.

No remoto vilarejo de Baro, Papua Nova Guiné (era no fim do mundo mesmo), em uma tarde abafada de um domingo de setembro, através de Francisco tivemos a prova do que significa amor pelo outro.

Havia espanto e gratidão nos rostos de Miguel, Martín e Tomás – e quem eram eles? Missionários argentinos do Verbo Encarnado que, com alegria, gastam suas vidas anunciando o Evangelho na periferia do mundo. Havia espanto e gratidão também no rosto de Francisco, que então, com quase 88 anos de idade, confinado a uma cadeira de rodas, embarcou em um avião da Força Aérea Australiana repleto de pacotes de ajuda e presentes, para coroar um sonho cultivado ao longo de uma década: e qual era o sonho? Estar ali, com eles, e abraçar com o olhar e as mãos de um velho padre jesuíta, transformado em pastor universal, aqueles homens felizes, vestidos de branco como ele, e, acima de tudo, abraçar aquele povo quase no fim do mundo. Abraçar aquelas pessoas que aprenderam a conhecer a Mãe de Jesus pelo rosto de “Mama Luján”, a padroeira da Argentina, através dos missionários.

A cena entusiasmante:

O Papa Francisco, sentado na pequena sala de uma casa de madeira coberta com mosquiteiros onde residem os missionários, tomando chimarrão, sentado ao lado deles, depois de ter encontrado a multidão de homens, mulheres e crianças com suas roupas coloridas, cobertas com algumas penas ou palha, com seus corpos multicoloridos.

Durante anos, o Sucessor de Pedro esteve em contato com seus compatriotas que testemunharam o amor incondicional do Deus de Jesus Cristo entre essas pessoas. Em particular, com um deles, o padre Martín. O jovem missionário não tinha palavras para agradecer ao amigo vestido de branco que desafiou tudo e todos para estar ali, mesmo que somente por algumas horas, e ver com seus próprios olhos, o espetáculo de uma Igreja nascente e seus mil desafios vividos com alegria.

São muitos os desafios daquela terra

As pessoas, ali, vivem em condições precárias, sem água encanada e eletricidade, e há poucos medicamentos. A violência, o tribalismo e a exploração da enorme riqueza mineral e madeireira pelas multinacionais são uma realidade.

Ali, os Padres do Verbo Encarnado, naquela costa do Oceano Pacífico espremida entre a selva e os recifes de coral, deram à luz, em 2018, a uma orquestra de cordas composta por crianças e jovens.

E sabem…. Na tonelada de pacotes levados pelo Papa no avião militar, naquele dia de setembro, havia também violinos e violoncelos. Francisco, feliz como uma criança, os presentou com instrumentos musicais, e assim pôde ouvi-los tocar.

Naquela visita do Papa (pastor de bilhões de fiéis em todo o mundo) àquele pequeno vilarejo, pudemos ver a alegria no rosto de Francisco, que, subindo de volta no avião militar, certamente dizia no coração: é aqui que eu gostaria de ficar.

Agora, do Hospital Gemelli, ele olha para mundo inteiro, sofrido, angustiado, ferido, pedindo paz e concórdia.

Feliz aniversário, Santo Padre. O mundo ainda precisa dos seus passos lentos e da sua voz frágil que nos ensinou e ensina o valor da misericórdia e do perdão. Tantos anos, Papa Francisco!

Silvonei José Protz Natural de Guarapuava, Paraná. Doutor em Comunicação pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma. Formado em Jornalismo, Economia e Sociologia. Atualmente, professor no Centro Cultural da Embaixada do Brasil junto ao governo italiano. Diretor-responsável do Programa Brasileiro da Rádio Vaticano – Vatican News e Cavaleiro de Sua Santidade – Ordem de São Gregório Magno e Cavaleiro da Ordem do Santo Sepulcro de Jerusalém. Jornalista e telecronista das celebrações pontifícias.