Quando o assunto em foco se faz em defesa da fé católica, alguns podem se desinteressar, acreditando ser um assunto que diz respeito somente ao clero. Portanto, isso seria um grande equívoco. A Igreja é o Corpo de Cristo e zela pela unidade, e juntos, como Igreja, é importante buscar as ferramentas necessárias e o conhecimento da Palavra e da doutrina da Santa Igreja para defender a fé católica.
Qualquer um pode ser um herege?
O herege é aquele que escolhe não acreditar em alguma verdade de fé. “Chama-se heresia a negação pertinaz, após a recepção do batismo, de qualquer verdade que se deva crer com fé divina e católica, ou a dúvida pertinaz a respeito dela” (Código de Direito Canônico; Cân. 751). Mas o que são as verdades de fé? Segundo o Catecismo da Igreja Católica:
“O depósito da fé, que contém a Palavra de Deus, escrita ou transmitida, foi confiado pelos Apóstolos à totalidade da Igreja.” (Catecismo da Igreja Católica; CIC 84)
“O Magistério da Igreja exerce plenamente a autoridade que recebeu de Cristo quando define dogmas, isto é, quando propõe, de maneira obrigatória, verdades contidas na Revelação divina ou verdades que com elas têm uma conexão necessária.” (Catecismo da Igreja Católica; CIC 88)
Sendo assim, para cometer o crime da heresia, diferentemente do que alguns podem pensar, é necessário ser um cristão. Assim, um pagão não pode ser considerado um herege, pois nunca professou a fé católica ou foi batizado.
“A heresia é um pecado que deve ser combatido para proteger a fé, pois, ao desviar-se da verdade, ela coloca em perigo a salvação das almas.” (Suma Teológica II-II, q.11, a.3)
Agora, contemplamos duas realidades: a pessoa herética e a pessoa ignorante. Como lidar com os dois personagens apresentados? A Palavra nos ilumina: “Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para que possais estar firmes contra as astutas ciladas do diabo” (Efésios 6).
Vale destacar dois equipamentos da armadura de Deus: o cinto da verdade e a espada da verdade. Para confrontar heresias e doutrinas pagãs, é necessário buscar a verdade, e Jesus afirma: “Todo aquele que é da verdade ouve a minha voz.” (João 18, 37). O cinto da verdade protege o corpo, simbolizando o conhecimento da verdade. Sem buscar o conhecimento em Deus e na Palavra, não há insumo para ser um efetivo defensor da fé. “Meu povo foi destruído por falta de conhecimento.” (Oséias 4,6). A espada da verdade ajuda a lutar contra o mal, simbolizando o Espírito que dá força e graça para enfrentar os combates. “Pregue a palavra, esteja preparado a tempo e fora de tempo, repreenda, corrija, exorte com toda a paciência e doutrina.” (2 Timóteo 4,2)
O castigo como último recurso de um pai que zela pelo filho
A Igreja reconhece que, em momentos de crise, Deus pode suscitar ações extraordinárias para proteger a fé. É preciso “suportar com magnanimidade as ofensas dirigidas a nós, mas não tolerar sequer ouvir as injúrias feitas a Deus”. No Evangelho de São Lucas, fica evidente a presença da santa ira em Nosso Senhor Jesus Cristo, quando n’Ele desperta um grande descontentamento com os vendilhões que estavam no templo.
“Então ele fez um chicote de cordas e expulsou toda aquela gente dali e também as ovelhas e os bois. Virou as mesas dos que trocavam dinheiro, e as moedas se espalharam pelo chão. E disse aos que vendiam pombas: “Tirem tudo isto daqui! Parem de fazer da casa do meu Pai um mercado!” (João 2,15-16)
A ira santa é presenciar uma injustiça e se sentir irado. A ira virtuosa, que alguns santos apresentaram, esteve presente em Jesus Cristo, como último recurso na tentativa de corrigir os erros daqueles que não foram mansos em permitir ser tocados pelas vias caridosas. Jesus se apresenta como um pai que repreende o filho após constantes alertas, castigando-o pela desobediência.
São Nicolau, um grande defensor da fé católica
No terceiro século, mais precisamente em 325 d.C., acontecia o primeiro concílio da Igreja, o Concílio de Niceia, uma assembleia ecumênica que tinha por objetivo condenar as heresias do arianismo, uma doutrina que negava a consubstancialidade de Jesus e Deus Pai, alegando que Jesus era um semideus, não o próprio Deus humanado.
Nessa assembleia, estava reunida uma numerosa quantidade de bispos e conselheiros religiosos. Dentre eles, o bom velhinho, conhecido como São Nicolau de Mira, um homem caridoso e humilde. Nicolau era dedicado na assistência aos mais pobres, mas não buscava receber mérito por seus atos. O seu único desejo era fazer das suas atitudes semelhantes às de Jesus.
Nicolau cultivava um grande amor a Cristo em seu coração e, mesmo sendo homem tão singelo, não suportou ouvir ofensas ao santo nome de Deus. Em um momento em que ouvia alguns dos escritos produzidos por Ário, o criador da doutrina ariana, São Nicolau não se conteve e esbofeteou-lhe a boca, guiado pela santa ira e amor a Deus. Agindo em defesa da fé católica, São Nicolau adotou uma postura extrema e firme, ao entender ser o último recurso possível, repudiando as profanas afirmações ditas por Ário, professor de uma doutrina herética ofensiva a Jesus Cristo.
“Portanto, meus amados irmãos, sejam firmes, inabaláveis e sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que no Senhor o vosso trabalho não é em vão” (1 Coríntios 15, 58).
A defesa da fé e o combate a heresias e ataques coordenados contra a Igreja e o santo nome de Deus são essenciais para a transmissão, com palavras e exemplos, de valores, tradições e posturas que um católico deve buscar.
“Todos os fiéis participam da compreensão e da transmissão da verdade revelada. Receberam a unção do Espírito Santo que os instrui e os conduz à verdade total.” (Catecismo da Igreja Católica; CIC 91)
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Abaixar a cabeça para tais atitudes é corroborar para a criação e disseminação de pensamentos profanos que levam à perdição de muitas almas. O exemplo de São Nicolau deve ser admirado como uma inspiradora defesa da fé. Assim como Jesus, aquele momento foi utilizado como último recurso por parte do bispo de Mira. Não é certo fazer uma interpretação seletiva deste evento, a Igreja ensina que a caridade deve estar no centro de qualquer defesa da fé.
“Nenhuma palavra má saia da vossa boca, mas somente a que for boa para edificação, conforme a necessidade, e assim transmita graça aos que ouvem.” (Efésios 4, 29)
Matheus Eleutério
Estudante de Jornalismo