“De tudo sou capaz naquele que me dá força” (Filipenses 4,13)
A viuvez é um daqueles vales profundos que a vida, por vezes, nos impõe. Perder o companheiro, o pilar, o amor de uma vida, é uma dor que dilacera a alma. Quando, a essa ausência, se soma a responsabilidade de educar três filhos muito jovens (18, 17 e 15 anos), o chão parece desaparecer de vez. Contudo, é precisamente nesse abismo que a nossa fé se revela não como uma âncora, mas como as próprias asas que nos permitem alçar voo.
O mês de agosto de 2006 foi terrivelmente doloroso: no dia 8, perdi a minha sogra (uma pessoa muito especial); no dia 13, um primo; e, no dia 15, o meu marido.

Créditos: Imagem Gerada por Inteligência Artificial / CHAT GPT
A preocupação com o futuro
Os desafios eram gigantes. Havia dias em que o cansaço físico e emocional ameaçavam consumir cada fibra do meu ser. Havia noites em que o silêncio era ensurdecedor, e as lágrimas escorrem sem controle na solidão do quarto (era aí que eu me permitia ser frágil). A preocupação com o futuro dos filhos, com o sogro que, apesar de ter mais filhos, só tinha a nós, e a própria reorganização familiar são pesos quase insuportáveis. Mas é na capacidade de nos levantarmos, mesmo quando se está de rastos, que reside a verdadeira superação.
Essa superação não é um ato heroico isolado; é um conjunto de pequenas vitórias diárias. É encontrar forças para sorrir para os filhos, mesmo quando o coração chora, é seguir o tratamento que a filha está a fazer para superar de um traumatismo craniano (fruto de um acidente de automóvel em outubro de 2005), é dobrar o joelho e agradecer a Deus por tantas pessoas que colocou no meu caminho e no dos meus filhos. É confiar que existe um propósito maior, mesmo quando tudo parece sem sentido.
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A presença de Deus se manifesta
A certeza de que a presença de Deus se manifesta nos abraços apertados, na força que brota de onde não se imaginava, e nas mãos estendidas de quem nos ama. É saber ler os sinais: o meu marido era devoto de Nossa Senhora e, na véspera, eu, pela primeira vez, falei com os meus filhos sobre a partida próxima do pai. No meu coração, estava claro que a Mãe o viria amparar no seu último caminho. Foi a 15 de agosto, dia da Assunção de Nossa Senhora que meu esposo partiu, às 15h, a hora da Misericórdia.
Eu e os filhos tínhamos acabado de chegar no estacionamento do hospital, pois era a hora da visita. Foi de fato a visita! Tivemos um tempo em que juntos nos abraçamos, choramos e nos despedimo com a calma que se conseguia viver naquele momento. Embora esperássemos a sua partida, não queríamos vivê-la.
Havia ainda a necessidade de dar a notícia ao meu sogro, ele que, há uma semana, tinha perdido a esposa. Eram muitas emoções e sentimentos para gerir ao mesmo tempo e em pouco tempo.
A fé se transforma em resiliência
A fé, neste percurso, transforma-se em resiliência. Permite-nos ver a luz mesmo quando a escuridão é densa, permite-nos que essa réstia de luz nos conduza e nos ampare “Não temais, não tenhais medo”. Ajuda-nos a entender que, embora a dor da perda seja duradoura em certa medida, a vida, por ser um dom, um dom de Deus, merece ser vivida em plenitude, especialmente pelos nossos filhos.
Eles são o espelho que reflete o amor que nos foi dado e a promessa de um futuro que, embora diferente, pode ser igualmente belo e significativo.
É um caminho de reinvenção, de esperança e de uma força que só a fé pode realmente conceder. “Mas aqueles que confiam no Senhor renovam as suas forças. Têm asas como a águia, correm sem se cansar, marcham sem desfalecer.” (Isaías 40, 31)
Paula Ferraz
Missionária da CN- 2º Elo; Fátima – Portugal