A paternidade é extremamente importante para o desenvolvimento do filho
A figura do pai é ainda muito emblemática e conflituosa dentro de nós. Em nossos consultórios é comum as pessoas ou canonizarem seus pais ou jogá-los no inferno, tal a marca que esta figura deixou registrado – para o bem ou para o mau – nas pessoas. O fato é que a figura do pai é de extrema importância para o desenvolvimento saudável de um ser humano. Ele tem uma contribuição de amor, afeto e proteção que só ele pode transmitir, desde a gestação até a vida adulta do filho. No entanto, um pai disfuncional também pode causar danos irreparáveis na vida de alguém.
A função do pai durante a gestação
Ao falar da presença do pai durante o período de gestação lembramos, obviamente, que ela é secundária em relação à mãe, mas não menos importante. Enquanto a mãe está transmitindo emoções, alimento e afeto ao bebê pela via corporal, o pai transmite segurança através de sua fala.
Segundo o psiquiatra e psicanalista Bernard This, a voz do pai, por ser mais grave, atravessa o líquido amniótico e é mais facilmente percebida pelo feto. Esta voz serve de referência tranquilizante in-utero e extra-utero ao bebê. Neste período o pai também tem a tarefa de transmitir segurança à mãe, através da participação nas consultas médicas, na preparação do quarto do bebê, no planejamento financeiro e tudo o que envolve este universo mãe-filho. A passividade do pai é um fator de estresse e insegurança para a mãe e o bebê já neste período.
O pai como um terceiro na relação mãe-bebê
Nos primeiros 6 meses de vida, estágio da dependência absoluta mãe-bebê, o pai deve ser o principal “cuidador” deste binômio: ele dá sustentação à mãe, protegendo-a das interferências externas de modo a que ela possa entregar-se totalmente a esta nova vida. Em outras palavras o pai é aquele que deve “preparar o ninho”, cuidar para que ambos tenham este ambiente seguro.
Gradativamente, ao longo dos primeiros anos de vida, a função do pai será de colocar-se como um “terceiro” nesta relação simbiótica mãe-bebê. Isto significa ir “separando” esta relação muito estreita entre ambos, hora chamando a mãe para a sua condição de esposa, apoiando-a na adaptação da nova rotina entre cuidados com o bebê e retorno ao trabalho e, ao mesmo tempo, promovendo suas “saídas”, seja ao salão de beleza, visita às amigas, ao shopping, etc., hora compartilhando os cuidados com o bebê, numa espécie de “mãe substituta”, trocando fraldas, oferecendo mais vezes a mamadeira ou a papinha, colocando para dormir; como diz Winnicott: “Em parte, os pais são como mães e podem ficar tomando conta do bebê. O papel do pai no processo de amadurecimento é fazer todo o gênero de coisas como uma mulher.”
O pai como representante do mundo externo
Esta função de tirar o filho da relação fechada com a mãe vai conferindo à figura paterna uma representação daquilo que está fora. Se no campo psicológico a mãe é representante do mundo interno e inconsciente, o pai o será do mundo externo, o mundo da consciência. Assim, o pai será a primeira pessoa que a criança amará no plano abstrato e espiritual, pois nunca esteve ligada fisicamente ao pai como esteve à mãe.
Chama-me muita atenção aquela imagem, muito comum em nosso meio, do pai que retira as rodinhas laterais da bicicleta e, segurando no banquinho, empurra a criança para que ela, ao pedalar, consiga o equilíbrio por si mesma.
Esta atitude simbólica da bicicleta é uma representação muito concreta da função paterna no nosso desenvolvimento, onde o pai é quem “empurra” a criança para o mundo concreto e real, promovendo o seu equilíbrio e autonomia. Neste sentido dizemos que o pai é uma figura de referência no que se refere ao desenvolvimento social da criança.
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A paternidade inadequada
A paternidade inadequada pode ser considerada aquela cujo pai está ausente ou, quando está presente, atua nos extremos: autoritária ou passiva. Pesquisas indicam que lares cujos pais estão ausente tendem a formar pessoas com baixa auto-estima, timidez excessiva, carência afetiva, ansiedade, depressão, compulsão e fobias, além de uma busca inconsciente por uma figura de ‘pai ideal’, em comparação com lares de pais presentes.
Por outro lado, filhos de pais presentes mas não atuante, ou seja, que não põe limites, têm maior propensão de desenvolverem problemas comportamentais como delinquência, uso abusivo de drogas, alcoolismo além de dificuldades em assumir responsabilidades e senso de dever coletivo, sobretudo na adolescência.
Em nossa prática clínica o que mais escutamos das pessoas é a imagem do pai tirano e violento, cujos filhos podem apresentar problemas de retraimento, insegurança na vida adulta, dificuldade de interação social, além de transtornos de personalidade e, o pior, tem maior tendência a repetir o comportamento do pai quando também estiver exercendo sua paternidade.
O pai relativamente bom
Ter consciência das feridas que nossos pais deixaram em nós e, ao mesmo tempo, liberar o perdão e buscar reconciliação é um caminho importante para ser um melhor pai para seus filhos. Este comportamento rompe os grilhões que, muitas vezes, é passado de geração em geração. Um outros aspecto é ter a consciência de que a figura paterna é também uma figura humana e limitada. É importante que os filhos contemplem os erros e fracassos de seus pais, mas também suas lutas e reerguimentos. É por isso que dizemos “relativamente bom”, pois não existe pai perfeito.
Ele presta atenção no que o filho está solicitando dele em determinada fase e momento de seu desenvolvimento, e se abre a também ele a entrar em um novo desenvolvimento. Para este pai a tarefa de educar, cuidar e demonstrar afeto não é “coisa de mãe”, ao contrário, é no contato com o seu corpo, sentindo o seu cheiro e escutando a sua voz que a criança terá maior segurança para seguir adiante e ter uma estrutura psíquica sadia para enfrentar os percalços da vida adulta.
Sim, o pai é um herói, mas também um vilão. Acertar as contas com estes dois aspectos dentro de nós é uma forma concreta de dizer “feliz dia dos pais”.