Exercícios Espirituais

A contemplação silenciosa produz edificação e renovação

Se eu tiver sensibilidade para as coisas de Deus, ao contemplá-las, vou sendo impactado por essa visão

O barulho e a agitação são constantes na nossa realidade atual. As pessoas, em geral, não buscam o silêncio nem o recolhimento, querem estar livres de leis e disciplinas. Podemos, então, ainda falar da “busca da vontade de Deus na disposição de nossa vida?”

Foto ilustrativa: Wesley Almeida / cancaonova.com

Santo Inácio de Loyola desenvolveu os exercícios espirituais baseados na contemplação silenciosa. Sua prática produz edificação e renovação. A experiência de inúmeras pessoas que se beneficiam, também hoje, é a prova de que o Espírito Santo continua iluminando as almas por meio dos exercícios.

“A prática dos Exercícios constitui não somente uma pausa tonificante e revigorante para o espírito, no meio das dissipações da barulhenta vida moderna, mas também uma escola, ainda hoje, insubstituível para introduzir as almas numa maior intimidade com Deus, no amor à virtude e à ciência verdadeira da vida, como dom de Deus e como resposta ao seu chamado” (Paulo VI).

A contemplação inaciana

Nos passos iniciais, colocamo-nos em espírito de oração e acolhida, ficamos numa passividade vigilante, na humilde esperança de que algo do mistério da vida de Jesus nos seja revelado. Humildemente, presentes na cena do texto utilizado, vamos contemplando, isto é, vendo as pessoas, uma após outras, ouvindo o que falam ou podem falar, olhando o que fazem, sempre na delicada expectativa de que alguma coisa nos seja revelada, algum sentimento brote em nosso coração. Depois que algo aconteceu, isto é, brotou algum sentimento, percebemos a presença de alguma pessoa, vamos saborear esta presença, dialogar, e, então, naturalmente, vamos deixar refletir, na nossa vida, para tirar algum proveito. Primeiro, deixar acontecer a contemplação, algo surpreendente, novo. Só, então, deixar refletir, na nossa vida, para ajustá-la à de Jesus Cristo.

“A contemplação é um deixar-se impregnar e invadir pelo mistério contemplado. O próprio mistério tem a sua força. Deixar que o Evangelho nos molde e não querer interpretá-lo. Por isso, requer-se mais simplicidade, humildade e passividade. É a atitude de deixar-se ensinar. O ritmo das contemplações é lento. Não deve buscar logo aplicações para a vida. Ficar atento às moções, às consolações que brotam, às desolações que surgem, acolhendo, demorando-me nas consolações e descartando as desolações.

Santo Inácio pede, várias vezes, conhecimento interno. Este não é puramente intelectual nem psicológico, mas inclui uma relação existencial. Uma experiência de vida, o encontro com a pessoa de Jesus. Para a Bíblia, conhecer algo é ter experiência desse algo. Conhecer alguém é entrar em relação com essa pessoa. Somos contemporâneos de Jesus Cristo! Mediante o conhecimento interno, Jesus penetra no mais profundo de nosso ser. É um conhecimento dinâmico e transformador, pois leva a pessoa a identificar-se com Jesus e a comprometer-se com Sua causa.” (Glosa de apontamentos do P. José Roque Jungues, SJ).

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Depois dos preâmbulos da oração, sempre confiantes na ação do Espírito Santo, mas despretensiosamente, vamos vendo, ouvindo, olhando, na esperança de que algo nos será revelado. Quando encontramos, gratuitamente, pela virtude divina, o que tanto procuramos, alguma coisa que nos esclareça ou faça sentir um pouco mais, então vamos parar, sentir e saborear, profundamente, sem pressa de passar adiante. Esse sentimento interno gratuito nos move e atrai para alguma coisa de Deus, que pode nos levar ao sentimento da presença de uma pessoa que tem seu modo de viver, que tem seus desejos, está empenhada numa missão. Naturalmente, a oração nos conduz ao desejo de uma ação em união à pessoa amada e comprometida com sua vida e com sua missão.

Descobrindo a contemplação inaciana

Alguns exemplos ou comparações podem nos ajudar a descobrir o que é a contemplação inaciana.

Soubemos que houve um acidente grave perto de nossa casa: uma carreta carregada foi de encontro a um ônibus repleto de passageiros. Há mortos e feridos. Os veículos estão reduzidos a um montão de ferros retorcidos. Isso é o que sabemos.

Agora, vamos lá para contemplar esse acidente. Fico presente. Vejo as pessoas feridas com rostos desfigurados, chorando e pedindo auxílio. Vejo algumas pessoas que parecem já falecidas no meio das ferragens; outras, solícitas, prestando auxílio. Ouço gemidos, pedidos de ajuda e as pessoas que socorrem se comunicando umas com as outras. Olho o que fazem, como correm para levar ajuda aos acidentados e carregam os doentes em macas improvisadas. O estar ali, presente, contemplando, abalou-me.

Uma visita a uma galeria de arte. Vou visitar uma galeria de arte. Sei que lá existem tesouros artísticos. Vou lá para contemplar e beber toda aquela beleza e harmonia que estão contidas nas obras de arte. Se tiver alguma sensibilidade artística, aquelas preciosas obras me falarão ainda mais. Não crio algo e jogo sobre as telas, mas sou impactado pelo que vejo.

Obviamente, os mistérios da vida de Jesus são mais ricos que qualquer galeria de arte. Se eu tiver sensibilidade para as coisas de Deus, ao contemplá-las, vou sendo impactado por essa visão, vou me deter e saborear.