Aprendi demais neste Natal

Já havia preparado meus filhos: Natal sem dinheiro e sem presentes!

Por mais Cristandade que exista, fica difícil avisar um menino “no auge de seus quase cinco anos” que não vai ter bicicleta, vídeo game e “hominho” (réplicas de homens guerreiros “de um futuro que nunca chega” e, que são a versão moderna do “Falcon”, que você deve conhecer se tiver mais de trinta e cinco anos).

Por mais que o Aniversário de Jesus seja o mais importante, tentei de todas as maneiras avisar meu filho que nossa prioridade era, é e sempre será outra. Mas no final de um bate-papo comum, ele sempre perguntava sobre os presentes.
E tudo ficou um pouco mais complicado quando ele aprendeu que Jesus também ganhou presentes. Por que ele não? Ainda mais que ele só queria uma bicicleta, ou um vídeo game, ou talvez os “hominhos”. Jesus tinha ganhado ouro, incenso e mirra!

Ô “cabecinha de quase cinco anos”!!! Parece que o “hardware e o software das crianças” já vieram com um tremendo upgrade. Cadê as batatinhas com perninhas de palitos de fósforo da minha infância? Coitados dos “pais-geração-cartão-de-crédito”!

Meu propósito era o Natal de fidelidade financeira à Igreja Missionária. Afinal de contas sou Missionário Católico, devo fazer a minha parte! Isso não é uma questão de bom exemplo ou testemunho, é uma obrigação! Paguei o dízimo integral, contribuí com a Campanha de Evangelização da CNBB (que foi no dia 14 de dezembro), contribuí com a TV Canção Nova (sou sócio pelo Débito Automático), liguei para doar uma quantia ao Projeto Coração Solidário, vem o IPVA por aí… não vou desfilar os montes de dívidas, mas você sabe como é… “Lá vai barão!” (acho que é a expressão de época mais antiga que usei aqui. Merece até uma nota de rodapé, agora mesmo)*

* [Lá vai barão: Expressão do século passado (e eu era vivo nesta época…) que diz respeito à cédula de Mil Cruzeiros, que tinha a estampa do Barão do Rio Branco, símbolo de governos militares que se despediam de nós. OBS.: nasci em 1968, Ano da passeata dos Cem mil (mas isto já vai ser rodapé de outro texto, quem sabe…)].

Fomos fiéis à Igreja e seus propósitos. Priorizamos Jesus e – desculpe a pretensão – Ele nos priorizou!

Então, um irmão de comunidade chegou com a bicicleta usada de seu filho e, perguntou se esta não interessaria para o meu menino. Pronto! O primeiro milagre da providência! Uma bicicleta seminova e superbonita!

E mais: o primo mais velho do Rio de Janeiro, irmão da madrinha, ganhou um novo videogame e cedeu o antigo para o meu filho. Segundo milagre de providência!

Colocamos tudo, muito bem enfeitado, na sala de minha casa. E no dia de Natal, meu coração já explodia de alegria, por saber que meu filho havia recebido, de Deus através dos irmãos, os presentes que ele mais desejava. Eu e minha esposa não agüentávamos de alegria em saber que seria um Natal completo!

Tudo para Jesus e Ele por nós!

Mas qual não foi a minha surpresa!? A reação de meu filho não foi eufórica ou efusiva, como eu pensava, pois pela primeira vez o vi quieto e pensativo. Sorriu para os brinquedos e parecia meio espantado. Depois de um tempo o percebi triste.
Tentei superar levando-o para estrear a bicicleta. Descemos do prédio e, eu estava muito mais entusiasmado do que ele. Ele subiu no “bólido azul” e começamos a missão de aprender a andar. Mas, ele continuava triste.

Meu filho entrou em casa e eu pude ver minha esposa surpresa por constatar que ele não estava bem. Eu não sabia o que fazer. Começamos a nos motivar uns aos outros, louvar a Deus pela providência e aí veio a frase que mais nos ensinou neste Natal: “Papai, de que adianta tudo isso se eu não sei usar? Vou ter muito que aprender. Não vai ser fácil!”

Meu filho havia se encontrado com seus limites, suas barreiras e seu medo de que talvez fosse difícil, ou não desse certo e, percebeu que a verdadeira felicidade não vinha dos brinquedos, mas da maneira como se relacionava com eles. Ele iria precisar reagir, começar do zero, rever seus pequeninos conceitos e vencer os obstáculos da “novidade que não vem pronta”.

Lembrei da expressão inglesa que diz: “a diferença entre crianças e homens é o preço de seus brinquedos.” Então eu me vi ali, querendo vencer as barreiras do novo para ele e, sem poder. Não poderia aprender a andar de bicicleta por ele. Mas era ele quem deveria enfrentar as primeiras quedas. O medo de ter que se equilibrar, tudo deveria ser enfrentado por ele.

Aprendi demais neste Natal!

Lógico que, com o tempo, as barreiras foram sendo vencidas pelo meu pequeno menino. Hoje ele já consegue andar de bicicleta e encontrar felicidade ao mesmo tempo. Foi bem rápido. E o mais importante: ele soube perceber, do jeito dele, na idade dele, que o principal vem de dentro. Tanto é, que ele tem muito prazer em ceder a bicicleta para que outras crianças possam também aprender.

Não houve ‘apego dialético materialista’, como dizem os entendidos em comportamento humano.

Mas você pensa que acabou por aí? E quanto aos “hominhos”?

Logo depois do Natal, fui numa lojinha de R$1,99 comprar bucha de parafuso para o varal do vizinho e lá encontrei o que parecia impossível: uma série de “hominhos” que eram construtores. Ao invés de armas, usavam ferramentas: pás, parafusos, furadeira, carrinhos de mão… Pronto! Tudo o que ele mais vê dentro da Canção Nova: obras! E por um preço que eu podia pagar. Era tudo o que eu queria.

“Escolhi o Caminho da Verdade, impus–me os vossos decretos. Apego–me a vossas ordens, Senhor, não permitais que eu seja confundido. Correrei pelo caminho de vossos mandamentos, porque sois vós que dilatais meu coração.” (Sl 118,30-32)