Ética e humanidade na era da inteligência artificial
Com o rápido avanço da inteligência artificial nas últimas décadas, mais precisamente nos últimos dois anos, após publicação do ChatGPT pela Open AI, a sociedade testemunha transformações profundas em várias áreas: desde o mercado de trabalho até as relações sociais. Na saúde, segundo estudos ressentes, a IA contribui de forma eficaz ao oferecer diagnósticos mais precisos e auxiliar na previsão de doenças, ampliando a capacidade de salvar vidas.
Transformações no mercado de trabalho e relações sociais
No ambiente de trabalho, a automação de tarefas e otimização de processos, aumenta a eficiência e desafia o mercado a se adaptar, mas também levanta preocupações sobre a substituição de trabalhadores e o impacto nas profissões. Já nas relações sociais, a IA influencia a maneira como consumimos informações e interagimos entre nós e com as máquinas, ao mesmo tempo, despertando questões delicadas sobre privacidade e manipulação de dados.
Alguns críticos dizem que a Igreja Católica não se deve meter em assuntos de tecnologia e ciência, mas, para a surpresa de muitos, o Papa Francisco já comentou sobre o uso ético da Inteligência Artificial em diversos documentos oficiais.
A perspectiva de Francisco: IA e paz
Em sua mensagem de 1º de janeiro de 2024, na Mensagem para o Dia Mundial da Paz, Francisco tratou sobre “Inteligência Artificial e paz”. Ao longo de sete tópicos ou sete capítulos, o Pontífice ratificou sobre o uso ético da IA e as implicações na vida humana. O Santo Padre recordou que “ a pesquisa científica e as inovações tecnológicas não estão desencarnadas da realidade nem são «neutrais», [4], mas estão sujeitas às influências culturais. Sendo atividades plenamente humanas, os rumos que tomam refletem opções condicionadas pelos valores pessoais, sociais e culturais de cada época.”
IA e comunicação: um chamado à responsabilidade
Em outra mensagem para o 58º Dia Mundial das Comunicações Sociais, celebrada em 12 de maio de 2024, mas publicada dia 24 de janeiro do mesmo ano, Francisco chama a atenção dos leitores no contexto antropológico sobre o sentido da vida humana do tempo atual, e que toda decisão deve partir do coração. O Papa recorda o pensamento do teólogo Romano Guardini, que tratou, há anos atrás, acerca da técnica e o homem, onde convidava sociedade a não se inveterar contra o «novo» na tentativa de «conservar um mundo belo condenado a desaparecer». Ainda no documento citado, o bispo de Roma fala em regulamentação da Inteligência Artificial:
“E não é suficiente presumir, por parte de quem projeta algoritmos e tecnologias digitais, um empenho por agir de modo ético e responsável. É preciso reforçar ou, se necessário, instituir organismos encarregados de examinar as questões éticas emergentes e tutelar os direitos de quantos utilizam formas de inteligência artificial ou são influenciados por ela. [6]“
Vejam bem que o Papa não fala de censura ou proibição do uso de IA, mas convida a sociedades, desde usuários, criadores e desenvolvedores e governos, a explorar essas tecnologias emergentes, colocando o ser humano em primeiro lugar, prezando pela sua dignidade.
Oportunidades e perigos da IA
Francisco ainda escreveu sobre “oportunidades e perigos”, e que cada coisa nas mãos do homem torna-se oportunidade ou perigo, segundo a orientação do coração.
Embora o termo inteligência artificial já tenha suplantado o termo mais correto utilizado na literatura científica de machine learning (aprendizagem automática), o próprio uso da palavra «inteligência» é falacioso. É certo que as máquinas têm uma capacidade imensamente maior que os seres humanos de memorizar os dados e relacioná-los entre si, mas compete ao homem, e só a ele, descodificar o seu sentido. Não se trata, pois, de exigir das máquinas que pareçam humanas, mas de despertar o homem da hipnose em que cai devido ao seu delírio de omnipotência, crendo-se sujeito totalmente autônomo e autorreferencial, separado de toda a ligação social e esquecido da sua condição de criatura.
Questionamentos essenciais sobre o futuro da IA
Muitas perguntas devem ser feitas. Talvez não tenhas agora as respostas, mas é necessário para gerar diálogo e conhecimento sobre o futuro da humanidade após esse avassalador momento em que vivemos com a IA.
Pesquisa sobre riscos da IA: segurança, viés e privacidade
Essa preocupação do Papa vai ao encontro das últimas pesquisas sobre os perigo e riscos da IA. O Instituto de Tecnologia de Massachusetts realizou uma pesquisa e publicou os resultados com um banco de dados com mais de 700 riscos possíveis relacionados ao uso da Inteligência Artificial.
O levantamento destacou que os principais problemas em sistemas de IA incluem segurança e robustez (76%), viés e discriminação (63%) e comprometimento da privacidade (61%). Além disso, foram apontados riscos menos comuns e complexos, como a possibilidade de IA desenvolver percepções análogas à dor ou à morte. Notavelmente, 90% dos riscos só são identificados após a disponibilização pública dos modelos, enquanto apenas 10% são detectados antes de sua implantação.
A ternura humana na era digital: reflexões finais
Diante dessa realidade, não basta ficar no medo do uso da IA, mas é urgente aprofundar o conhecimento, criar grupos de estudos, entender as oportunidades e riscos. A negação levará ao fracasso das instituições, já o entendimento do uso correto e ético e adesão das oportunidades trará benefícios para qualidade de vida humana. No meu trabalho, por exemplo, utilizo de 10 a 15 modelos de IA que me auxiliar na produção de conteúdo, onde ganho em praticidade e tempo, permitindo assim gastar minhas energias em outras demandas que a IA jamais poderá resolver.
Encerro essa reflexão retomando o pensamento de Francisco, que na sua última encíclica DILEXIT NOS retomou o assunto da Inteligência Artificial, chamando a atenção para a realidade do dia a dia de cada pessoa, onde a beleza, a delicadeza e a sensibilidade de cada gesto passa pelo coração homem, onde nenhum algoritmo possa substituir.
Diz assim: “Na era da inteligência artificial, não podemos esquecer que a poesia e o amor são necessários para salvar o humano. O que nenhum algoritmo conseguirá abarcar é, por exemplo, aquele momento de infância que se recorda com ternura e que continua a acontecer em todos os cantos do planeta, mesmo com o passar dos anos. Penso na utilização do garfo para selar as bordas daquelas empadas caseiras que preparávamos com as nossas mães ou avós. É aquele momento de aprendizagem culinária, a meio caminho entre a brincadeira e a idade adulta, em que assumimos a responsabilidade do trabalho para ajudar o outro[…] Todos estes pequenos pormenores, o ordinário-extraordinário, nunca poderão estar entre os algoritmos. Porque o garfo, as piadas, a janela, a bola, a caixa de sapatos, o livro, o pássaro, a flor… são sustentados pela ternura preservada nas memórias do coração.
Agora que você encerra essa leitura, organize-se para ler por completo os documentos do Papa mencionados, e deixe seu comentário no final desta página.
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Adailton Batista é natural de Janaúba (MG). Membro da Comunidade Canção Nova desde o ano de 2009, o missionário possui formação técnica em Administração pela Faculdade NetWork, Rádio e TV pelo Instituto Canção Nova. Graduado em Jornalismo pela FCN. Adailton é Casado com a missionária Elcka Torres e pai de uma filha. É autor do blog.cancaonova.com/metanoia. e colunista do Portal Canção Nova. Apaixonado pela evangelização, ele utiliza de todos os meios digitais possíveis para promover experiência pessoal com Cristo.