“Eu peço que vocês sejam revolucionários, que vá contra a corrente; sim, nisto peço que se rebelem: que se rebelem contra esta cultura do provisório” (Discurso do Papa Francisco durante encontro com voluntários da JMJ Rio 2013).
Mas o que significa ser ‘revolucionário’ da cultura do provisório? O que é a ‘Cultura do Provisório’ e onde está a sua raiz?
Desde muito tempo, apresentamos como comportamento a necessidade de nos identificarmos com a sociedade em que vivemos. Buscamos responder ao que nos está sendo proposto com a única finalidade de conviver bem, isto é, agradar para ser aceito e, consequentemente, ser agradado. A tentativa de coabitar com quem está ao nosso redor, devido às provocações da mídia e às tendências do mundo pós-moderno, coloca-nos diante de um processo de adaptação que afeta o nosso comportamento e, esse, por sua fez, influencia o próprio ambiente, trazendo consequências boas e ruins.
Não é fácil corresponder ao que nos é proposto diariamente, quer seja diante do consumismo, da necessidade de satisfazer as nossas vontades; quer seja manter relacionamentos aparentemente feitos para durar ou na busca de autoconhecimento, do controle das nossas impulsividades e entendimento sobre o mundo no qual estamos inseridos, a fim de alcançar o equilíbrio necessário para que possamos nos sentir confortáveis, seguros e em paz.
Mas, como ser uma pessoa revolucionária em meio à cultura do provisório?
Inúmeras são as causas que têm motivado a instalação da ‘Cultura do Provisório’. As modificações que a nossa identidade cultural têm sofrido, ao longo dos anos, tornaram-se uma das principais causas desse fenômeno social.
Atualmente, o comportamento humano apresenta traços de uma identidade híbrida e vive sob o signo da pós-modernidade. Ele vai sendo formado de dentro para fora, acreditando, assim, que estamos nos ressocializando com esse novo modelo de viver. Contudo, adaptar-se é estar disposto a negar a possibilidade de viver plenamente, a ter a nossa própria identidade.
Ser revolucionário da ‘Cultura de Provisório’ é nos tornarmos uma “Celebração Móvel: formada e transformada em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam” (Hall, 1998). Assim, conscientes de que somos sujeitos, podemos, de fato, assumir que somos revolucionários da cultura híbrida, líquida e provisória. Precisamos continuar como sujeitos pós-modernos, mas temos de ter uma identidade fixa, mesmo que nascida da diversidade de culturas do mundo globalizado. Uma identidade construída e reconstruída permanentemente ao longo de nossa existência.
Ir contra a corrente é viver atento às tendências da pós-modernidade: relações frágeis, duvidosas, frouxas, livres e inseguras – sugere Bauman (2004), estudioso que escreve sobre o conceito de liquidez nas relações.
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O problema das relações líquidas
Ele defende a ideia de que as relações líquidas nos colocam diante de um problema: como apertar os laços e, ao mesmo tempo, mantê-los tão frouxos? Esse, para ele, é um novo modelo de relação amorosa: a relação líquida, frouxa. Da mesma maneira que queremos sair da solidão com a companhia do outro para mantê-lo próximo, é necessário uma distância que lhe permita o exercício da liberdade. Completa Baumam (2004): “Os casais estão sozinhos em seus solitários esforços para enfrentar a incerteza.
A relação pode acabar numa manhã de sol que o outro – esse que, um dia antes, disse “eu te amo” – levanta-se da cama e exclama: “Acabou!”. Como entender tal mistério? Quais ideias se auto-organizaram para tal catástrofe? Catástrofe para aquele que perde o objeto de amor “garantido”. E o o” anel que era doce, se quebrou”…
“Para seguir Jesus devemos nos despir da cultura do bem-estar e do fascínio provisório”. Foi o que disse o Papa Francisco, no encontro com os voluntários, durante a JMJ de 2013 que, ao exortar sobre o casamento, ressaltou que essa união não deveria ser vista como provisória. “Se der certo, deu; se não der, acabou”.
Como sempre muito pertinente, o Papa também nos faz pensar sobre os nossos exageros frente à necessidade do bem-estar; o nascimento dos filhos, por exemplo. São tantos planejamentos em busca da segurança para tê-los que esse bem-estar nunca chega. As famílias estão cada vez menores, formando indivíduos egoístas e solitários. E, em sua sabedoria, eles fazem uma relação sobre a resistência do mundo diante das propostas de Jesus. De fato, são definitivas e, segundo ele, nós temos medo do tempo de Deus.
“Peçamos ao Senhor que nos dê a coragem de prosseguir, despindo-nos desta cultura do bem-estar, com a esperança no tempo definitivo” (Homilia do Papa Francisco, em 27 de maio de 2013, na Casa Santa Marta).