sensibilidade social

Quais os riscos de tirania que a sociedade está vivendo?

A fragilidade do tecido sociopolítico e religioso-cultural da sociedade brasileira aponta o preocupante fenômeno das tiranias, exigindo redobrada atenção para o conjunto dos descompassos que pesa sobre os ombros de todos. Curvada sobre si mesma, a sociedade apresenta preocupantes sinais de morte, o que requer urgente e adequado tratamento, ante o risco iminente de prejuízos irreversíveis. Por isso mesmo, há de se ter consciência mais clara sobre a realidade, para que se possa tomar direções acertadas e superar as graves lacunas que impõem sacrifícios e atrasam conquistas. Na ausência das providências necessárias, cresce a violência, aumenta o número de desempregados, multiplicam-se cenários de vergonhosas pobrezas, manipulações em instâncias que deveriam servir ao povo, mas se dedicam a oligarquias. A indiferença compromete a sensibilidade social e preocupa, com seus impactos negativos na justiça, inviabilizando a paz. Incapaz de atender às exigências contemporâneas e antropológicas, merece especial atenção o campo da educação, ainda muito balizado pela formalidade acadêmica e conceitual. Há, notadamente, um desafio na formação dos jovens: além de suas responsabilidades com o presente e o futuro, precisam lidar com as aceleradas mudanças que afligem a todos existencialmente. Considerar esta complexa realidade atual permite enxergar fragilidades que levam a ações, escolhas e palavras desprovidas de consistência e, consequentemente, incapazes de oferecer respostas aos desafios contemporâneos. Ao invés disso, alimentam mecanismos de tiranias.

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Foto Ilustrativa: FangXiaNuo by Getty Images

Manifestação de uma força que busca esconder as fragilidades, as tiranias precisam ser enfrentadas urgentemente, a partir de investimentos para mudar mentalidades e qualificar as muitas dinâmicas da vida. Particularmente no contexto democrático, as tiranias promovem estragos, por encobrirem incompetências individuais e entendimentos que fundamentam propostas comprometedoras. Ora, a democracia inclui muitas exigências opostas às tiranias: capacidade de diálogo, sensibilidade social e política para respeitar e promover a igualdade, habilidade em articular a riqueza das diferenças e diversidades a partir de princípios irrenunciáveis, intocáveis. Assim, tiranias no exercício de poderes são sinais de alerta, pois ameaças à democracia levam a perdas irreparáveis. Reações e propostas não podem seguir na direção contrária aos parâmetros da democracia, com a opção por tiranias que simplesmente revelam fragilidades humanísticas e antropológicas, sinais do enfraquecimento geral das instituições, cada vez menos capazes de se orientarem pelo que, de fato, é importante para as pessoas a quem deveriam servir, não oferecendo respostas às muitas questões existenciais e cotidianas.

A sociedade precisa ser conduzida na justiça e na paz

Constitui-se tirania não prover a sociedade dos funcionamentos necessários que venham a atender suas demandas e mobilizá-la na direção da justiça e da paz. Nesse sentido, vale, pois, analisar e considerar as posturas de cada cidadão e cidadã que podem ser também expressões de tiranias. As polarizações e extremismos, por exemplo, que se materializam nas relações estabelecidas especialmente nas redes sociais, são claros sinais desse mal. As atitudes que alimentam tiranias têm várias causas e origens. Entre elas, a falta de autocrítica tão fundamental em qualquer relacionamento. Essa capacidade é determinante no exercício de todas as responsabilidades, para que não se corra o risco de alimentar a presunção, que cega pessoas, enjaulando-as na mediocridade. Sem autocrítica, cresce a falta de respeito e perdem-se os parâmetros da urbanidade, inviabilizando avanços e a indispensável criação de consensos – entendimentos construtivos.

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Não menos preocupante é o quadro de tiranias alimentado por fundamentalismos religiosos, no horizonte de um cristianismo torto que leva a perigos muito sérios, particularmente por influências indevidas, inclusive de instâncias democráticas. Essa e tantas outras formas de tirania merecem considerações à luz de análises, a partir de diferentes campos do saber, para que se perceba, com ainda mais clareza, os riscos causados pelo comprometimento da democracia, pela indiferença ante os clamores dos pobres, pelos autoritarismos e conservadorismo religioso inócuo, pelas crescentes intolerâncias, violências domésticas, particularmente, com abomináveis ocorrências de feminicídio.

O momento atual exige autocrítica, cuidados, atenção e empenhos para serem alcançadas legislações adequadas aos novos contextos. É indispensável, sobretudo, conversão pessoal para alavancar as necessárias mudanças e se viver tempos com mais civilidade e solidariedade. É hora de investir na superação dos sinais preocupantes, os riscos de tiranias.

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Dom Walmor Oliveira de Azevedo

O Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, Dom Walmor Oliveira de Azevedo, é doutor em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana. Atual membro da Congregação para a Doutrina da Fé e da Congregação para as Igrejas Orientais. No Brasil, é bispo referencial para os fiéis católicos de Rito Oriental. http://www.arquidiocesebh.org.br