Muitas vezes, diante de tragédias, mortes, catástrofes e acontecimentos desagradáveis, deparamo-nos com a declaração: “Foi a vontade do Senhor”. Entretanto, também é sabido que Ele é amor e incapaz de atos maus. Então, o que pensar? Deus castiga ou não?
Deus castiga Seus filhos?
Para esclarecermos essa questão, encontramos, no livro de Hebreus, uma característica de Deus-Pai: “O Senhor corrige quem Ele ama e castiga quem aceita como filho” (cf. Hb 12,6). Então, poderíamos dar por encerrado o assunto e aceitar que Deus castiga e que a Bíblia confirma isso. Porém, na “Constituição Dogmática Dei Verbum, art. 12”, a Igreja nos exorta que “para aprender com exatidão o sentido dos textos sagrados deve-se atender com não menor diligência ao conteúdo e à unidade de toda a Escritura, levadas em conta a tradição viva da Igreja toda e a analogia da fé”.
Para entendermos o que nos diz a Carta aos Hebreus, precisamos observar o que Jesus nos disse a respeito do Pai. Em Jo 18,12, Jesus fala do pastor que deixa todas as ovelhas para buscar aquela única que se perdeu. Ainda em Jo 6,26-28, Cristo faz referência ao cuidado do Pai em relação aos pássaros e nos afirma: “Vocês são muito mais valiosos para o ‘seu Pai’ do que eles!”. Quando lemos essas passagens, pensamos em um pai carrasco que castiga?
Um pai carrasco que castiga
No livro do Eclesiástico, podemos encontrar resposta para essa questão: “Não digas: ‘De Deus vem o meu pecado!’”, pois o Senhor não faz o que Ele próprio detesta. (…) Desde o princípio, o Senhor criou o ser humano, entregou-o às mãos do Seu arbítrio e o deixou em poder da sua concupiscência. (…) Diante do ser humano estão a vida e a morte, o bem e o mal; ele receberá aquilo que preferir” (cf. Eclo 15,11-21). Vale a pena dar uma lida nesse trecho todo.
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Consequências das nossas próprias escolhas
Acontece que, muitas vezes, torna-se mais fácil lançar a culpa em Deus, pois assim não assumimos a responsabilidade e as consequências de nossas próprias escolhas.
O Senhor nos dotou de consciência e inteligência para entendermos os resultados de nossos
atos. Muitas vezes, não levamos em conta que nossas opções atingem também as pessoas que estão ao nosso redor, e tudo isso gera um resultado: “O que alguém tiver semeado é isso que vai colher” (Gálatas 5,7).
Deus não ‘castiga’ quem erra, mas por amor pode não interferir nas consequências de nossas escolhas, permitindo assim que colhamos a experiência do erro e aproveitemos disso para nosso crescimento.
Conversão verdadeira
De modo nenhum, isso faz de Deus um carrasco ou vingador. A intenção do Senhor é uma só: levar-nos a uma conversão verdadeira, e Ele sabe que, em algumas situações, a dor é o início de uma vida nova. Também o sofrimento, quando bem vivido, torna-se fonte de purificação dos nossos pecados e dos pecados do mundo.
Algumas pessoas têm medo de Deus, por isso buscam não errar, o que não os permite agir como filhos, mas sim escravos. Outros pensam na recompensa que o Senhor lhes dará por não errarem e medem suas ações como mercenários interesseiros. Porém, toda a Bíblia tem como intenção nos levar a assumir o lugar de filhos, somente desse modo poderemos viver realmente e entender que “Deus nos trata como filhos. E qual é o filho que não é corrigido pelo Pai?”.
Quando temos em nosso coração a certeza de que somos filhos amados de Deus, e que Ele quer nos salvar, começamos a olhar o que vivemos não mais como castigo, mas como oportunidades que o Pai usa para nos corrigir e nos aproximar d’Ele.
Tudo concorre para o bem dos que amam a Deus
“Tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus” (cf. Rm 8,28). Essa é a certeza que precisa habitar sempre em nós. Não só as coisas boas, mas também as ruins concorrem para o nosso bem.
Peçamos a Deus a graça de assumirmos o lugar de filhos amados, e então, não mais como escravos, veremos o agir do Pai em nossa vida como providência para nossa conversão pessoal.
Deus abençoe a todos.