Vamos juntos criar uma cultura mais cidadã e menos egoísta
Essa expressão precisa se tornar um princípio que inspire a conduta de todos os cidadãos. E é urgente que seja adotado, particularmente, pelos governantes, políticos, dirigentes e líderes. Uma necessidade para que se passe o Brasil a limpo, tarefa gigantesca, pois a sujeira é incalculável. Não há outro caminho para superar as crises senão este: agir a partir do lema “em favor do povo”, o que possibilita edificar uma cultura mais cidadã e menos egoísta. Contribui para dissipar as manipulações que buscam favorecer pequenos grupos, partidos e interesses que claramente não são os da população. A tarefa é exigente, demanda muitas mudanças, que não são apenas de nomes. Urgentes são as transformações profundas que resgatem a cidadania de um mundanismo perverso e viciado, um contexto que impede o surgimento de pessoas motivadas para trabalhar em favor do povo.
Mundanismo é um termo refletido pelo Papa Francisco na sua Exortação Apostólica sobre a alegria do Evangelho. Ali, o Papa fala a respeito do mundanismo espiritual que corrói a interioridade do cidadão contemporâneo, com lamentáveis desdobramentos nas diversas instituições e práticas que formam a sociedade, inclusive para a Igreja. Tudo o que pode ser em favor do povo fica comprometido. Oportuno é lembrar que a expressão “em favor do povo” refere-se ao bem comum que se sustenta no respeito incondicional à dignidade de toda pessoa. Trata-se de um bem emoldurado pela participação e promoção de dinâmicas que conduzem os funcionamentos sociais e políticos nos trilhos da justiça e da verdade. Assim, o mundanismo espiritual, com suas consequências, é veneno que atinge não simplesmente os que se dedicam à prática da religiosidade, mas todo o conjunto da cultura contemporânea, pois enjaula a cidadania.
Esse mundanismo, muitas vezes, aparece camuflado. Porém, é muito simples percebê-lo em pessoas que buscam ocupar cargos públicos, ou mesmo nas esferas religiosas, por motivações que desconsideram o bem comum. Gente que procura atender, exclusivamente, os quesitos da glória humana e a garantia do bem-estar. A responsabilidade pelo mundanismo espiritual é, principalmente, de todos os que exercem a liderança, nas diferentes esferas da sociedade e de suas instituições. Urgente se torna buscar um caminho penitencial, de limpeza que não pode deixar de todos envolver. Na sociedade brasileira, o mundo empresarial tem sido “passado a limpo”. Mas ainda falta a corajosa iniciativa de também submeter o mundo da política nos parâmetros da justiça. Sem essa coragem, não será possível tecer nova cultura política e, consequentemente, o povo continuará a sofrer com a corrupção.
Os jeitos tortos de tratar a coisa pública, manipulada em favor de grupos, partidos, indivíduos, perpetuam os equívocos. Validam escolhas inadequadas nas estruturações e funcionamentos que de outra maneira permitiriam conquistas em favor do povo. Torna-se indispensável analisar e entender as dinâmicas da cultura pós-moderna. Avaliar criticamente tendências extremamente subjetivistas, que consideram certas experiências como únicas, aprisionando a cidadania em sentimentos e razões muito próprias. Esse fechamento traz como consequência uma incapacidade para um olhar mais ampliado e, sobretudo, eivado com a sensibilidade para priorizar o que é “em favor do povo”. Quando governantes e políticos sofrem desse mal, em vez de agir para promover o bem comum, empenham-se somente para satisfazer o próprio interesse, no máximo as necessidades dos grupos de aliados. São orientados pelos parâmetros da mesquinhez, com a perda do altruísmo.
O mundanismo espiritual, que é também moral, enrijece e domina violentamente as instituições, neutralizando-as na sua tarefa de conduzir o conjunto da sociedade em direções mais arrojadas. Essas instituições e segmentos da sociedade, em vez disso, tornam-se verdadeiros parasitas, pois ancoram a mediocridade de quem não consegue entender e viver a cidadania. Os resultados são prejuízos incalculáveis, inclusive a perda da esperança em pessoas que se deixaram dominar por razões muito mesquinhas e, com isso, comprometeram a sua competência técnica, profissional e humanística. Assim se constitui o triste cenário dos esvaziamentos institucionais, sem credibilidade, desenhando contextos semelhantes aos de uma terra arrasada por guerras e catástrofes. O horizonte é presidido por uma mentalidade pequena, pela exacerbação de práticas religiosas que são adaptadas à demanda dos fregueses, com uma multidão ancorada na rigidez de fundamentalismos e descompromissada com as exigências éticas. Recomeçar é a saída, e a direção é fazer valer, acima de tudo, o princípio ético-político de tudo que seja em favor do povo.