A Quaresma é tempo o propício de conversão, de retorno dos que se encontram distanciados de Deus. Dois instrumentos da graça divina nos são oferecidos para essa renovação e fortalecimento espiritual: a Confissão ou Reconciliação, e a Comunhão. Recebendo-os, cumprimos um dever pascal.
A trajetória histórica dos sacramentos apresenta períodos de maior vitalidade e também de sombras, dúvidas e negações. Conforme o maior aperfeiçoamento de conceitos e crises, de épocas ou gerações, surgem falhas e também vitórias. São avanços ou retrocessos, mas sempre preservando e essencial desses canais da graça redentora deixados por Jesus a Sua Igreja.
Os sacramentos são meios importantes para a conversão
Hoje, a Eucaristia, a Comunhão e a Penitência ou Reconciliação sofrem impactos opostos. Quanto à primeira, verifica-se uma crescente participação, aumentam os comungantes, mas surge uma interrogação sobre a observância do indispensável estado de graça adquirido pelo Sacramento da Confissão, requerido para uma adequada e frutuosa recepção da Eucaristia.
Até há pouco tempo, a Comunhão era cercada de uma série de medidas que, protegendo-a, provocavam, por vezes, um afastamento pelos obstáculos criados exteriormente. Ao serem estes removidos, sob o sopro do Espírito Santo, parece que, por vezes, tentaram eliminar o que não era acessório, mas indispensável à obtenção de seus frutos.
Um clima de que “tudo é permitido” ameaça atingir essa área sagrada, e pode levar alguns a uma aproximação imprópria da mesa do Senhor. Indevida e sacrílega, produzirá a morte o que devia aumentar a vida. Pelo documento “De Sacra Communione”, da Congregação para o Culto Divino, continua firme a prescrição: “ninguém que tenha cometido pecado mortal, ainda que arrependido, participe da mesa eucarística sem a prévia confissão sacramental”. Evidentemente pode haver caso extraordinário, e a Igreja sempre o reconheceu. O mesmo documento estimula a recepção, com oportuna frequência, do sacramento da Penitência.
Remédio de revigoramento
A Confissão sempre encontrou resistência na natureza humana. Hoje, a maior ânsia de prazer e de liberdade, a reação ao que exige sacrifício são, entre outras, causas da menor afluência ao tribunal sagrado. Outro documento da Sagrada Congregação para o Culto Divino, com data de 2 de dezembro e divulgado a 8 de fevereiro de 1974, sobre o novo rito do Sacramento da Penitência, abriu grandes perspectivas pastorais para sua revitalização. O uso do termo reconciliação indica um encontro do homem arrependido com Deus que perdoa.
A confissão, para quem não perdeu a vida espiritual, é como um remédio de revigoramento no encontro sacramental com o Cristo na cruz, fonte de toda reconciliação e da vida santificada. O novo rito, que, evidentemente, não altera a essência do sacramento, dá maior destaque ao caráter eclesial, comunitário, da reconciliação, pois há um prejuízo social no pecado.
No documento, permaneceu a confissão individual, cujo ritual é enriquecido com elementos catequéticos e pastorais. Além disso, há a possibilidade da reconciliação em cerimônia coletiva, com acusação dos pecados e absolvição também individual; e também a confissão comunitária, com absolvição coletiva, esta em circunstâncias absolutamente especiais. Para a última já foi dada clara orientação pela Santa Sé.
Ao ser notificada a reforma litúrgica da Penitência, houve destaque para o acessório. Assim, com certo sensacionalismo, afirmou-se terem sido supressos os confessionários. O documento, entretanto, remeteu às determinações do Direito vigente e às Conferências Episcopais. Eis o esforço pastoral da Igreja, conforme determinação do Concílio Ecumênico, sobre esses dois sacramentos.
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Favores divinos
A Quaresma nos oferece especial oportunidade para uma renovação profunda na prática da reconciliação e da comunhão. A recepção da Eucaristia, em circunstâncias interiores e exteriores aptas, produzirá os frutos oriundos da sua infinita vitalidade. A maior participação na Penitência nos dá melhores ou indispensáveis condições para a comunhão sacramental e uma valiosa contribuição na vida espiritual. Cabe a cada um o devido aproveitamento dessa fonte de favores divinos. Os resultados ultrapassam a esfera pessoal e irão beneficiar a coletividade católica, pela maior vitalização da presença divina.
Neste período do ano litúrgico, muito útil também recordar a Carta Apostólica “Misericordia Dei” sobre alguns aspectos da celebração do sacramento da Penitência. Merece uma particular reflexão esse “forte convite aos meus irmãos Bispos, e através deles, a todos os presbíteros para um solícito relançamento do sacramento da Reconciliação, inclusive com exigência de autêntica caridade e de verdadeira justiça pastoral, lembrando-lhes que cada fiel com as devidas disposições interiores, tem o direito de receber pessoalmente o dom sacramental”.
Recordo que o Concilio de Trento declarou que é necessário “por direito divino, confessar todos e cada um dos pecados mortais”. E assim por diante.
O tempo litúrgico que vivemos é uma oportunidade para refletir sobre essas verdades. Elas são importantes para a saúde espiritual do povo de Deus.
Peçamos a Nossa Senhora Aparecida e a São Sebastião que nos ajudem.
Dom Eugenio de Araújo Sales