✝️ Jubileu Missionário

Passado e presente na evangelização do Brasil - IV

Caminhar sobre a memória para construir o futuro

Há algo de misterioso e grandioso no silêncio das ruínas das reduções jesuítico-guaranis no sul do Brasil. No verde do trigal que abraça os restos das igrejas históricas derrubadas pela ganância das coroas ibéricas. No vento que atravessa as antigas arcadas centenárias tombadas pelo tempo. Elas seguem sendo a testemunha daquilo que não desejamos ser, daquilo que nossa esperança não foi capaz de conservar, daquilo que só a fronteira é capaz de produzir – o novo.

Esse legado não é apenas história. É memória viva, presença que interpela a caminhar. Não na direção do passado, que não existe, e sim do futuro que precisa ser construído.

Foto Ilustrativa: Tinnakorn Jorruang by Getty Images

Memória agradecida que recorda os mártires em missão

No coração desse acontecimento, está a missão de São Nicolau – berço das reduções (1626-2026). A celebração dos 400 anos das Reduções Jesuítico-Guarani no Sul do Brasil não deve se reduzir às construções e ruínas. Essa redução é testemunha do início da pregação do Evangelho no Rio Grande do Sul e, em certa medida, palco do martírio dos jesuítas: São Roque González de Santa Cruz, São Afonso Rodríguez e São João del Castilho. Hoje, o legado das reduções segue vivo, produzindo, nos corações, uma memória agradecida que nos recorda que a “terra vermelha” – chão dos mártires – é terra de missão.

Segue sendo urgente ter quem queira ouvir as vozes de ontem e de hoje. Não se trata de romantizar o legado jesuíta, mas, sim, ter coragem de fazer o pedido de perdão ao triunfo da humanidade. É necessário reconhecer o que foi perdido, mas também insistir no que persiste — no guarani falado, nas festas, nas músicas, na arte sacra inculturada, na identidade missioneira e no orgulho de seu pertencimento.

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Olhar para o futuro com fé e esperança

Justiça histórica e reparação que precisam ser feitas vão além da busca por monumentos preservados ou roteiros turísticos idealizados. Ela envolve transformar estruturas de exclusão, dar voz e protagonismo aos povos indígenas, garantir a demarcação dos territórios originários, preservar a língua e os saberes tradicionais de forma a promover uma educação que conte a história completa das reduções. Essa reparação não deve apenas nos fazer olhar para trás com nostalgia, mas olhar para o futuro com fé e esperança.

Missões: sinal e sementeira de coisas novas

O legado que a memória das reduções nos oferece está na forma original como a fé cristã se inseriu no contexto local, expressa na arte, na música e na paisagem. Esse legado segue desafiando as fronteiras culturais e demandando uma espiritualidade encarnada, capaz de produzir riqueza e de promover uma convivência pacífica. Quando colocamos nossos pés aqui, nesta terra vermelha, descobrimos que essas missões nunca serão ruínas, mas, sim, sinal e sementeira de coisas novas.

Pe. Felipe de Assunção Soriano, S.J.