Será que Deus quer as catástrofes?

Algumas vezes, diante de alguma catástrofe, como enchentes, desabamentos, terremotos, entre outras, ouve-se falar que isso “Foi da vontade de Deus” ou “Fazer o que, Deus quis assim…”

Será que Deus quer o mal? De forma alguma! De jeito nenhum; seria blasfêmia dizer isto.

Deus é perfeitíssimo. N’Ele não há sombra de mal e de maldade; Ele ama a todas as suas criaturas, especialmente o homem e a mulher, que os criou “à sua imagem e semelhança” (Gn 1,26). E ninguém pode desejar o mal, e muito menos enviar algo mau a quem ama; e muito menos Deus, que é puro Bem. Santo Irineu (†200) dizia que “o homem é a glória de Deus”; por nós, Jesus deu a vida, na maior prova de amor que a humanidade já viu. Então, de onde vêm o mal, as catástrofes, etc.?

Em primeiro lugar, elas vêm da imperfeição que toda natureza traz em si, seja esta mineral, vegetal, animal ou humana. Só Deus é perfeito; e os seres criados por Ele não podem ser perfeitos porque senão seriam “deuses”, e Deus é o Criador e não a criatura. Da fraqueza da natureza pode vir o mal.

A fonte do mal moral é também o pecado, que gera o mal físico, psicológico, entre outros. São Paulo resume tudo isso, dizendo que “o salário do pecado é a morte” (Rm 6,23). Sofremos não somente por conseqüência de “nosso” próprio pecado, mas principalmente por causa dos da humanidade de modo geral. Alguém pode sofrer um acidente e morrer, sem culpa, por causa de outro que dirigia bêbado…

E sabemos que o pecado enfraqueceu a natureza humana; o homem foi feito para a imortalidade, mas o pecado o fez experimentar o sofrimento e a morte.

“Deus não é o autor da morte, a perdição dos vivos não lhe dá nenhuma alegria” (Sab 13, 1). E “Ora, Deus criou o homem para a imortalidade, e o fez à imagem de sua própria natureza. É por inveja do demônio que a morte entrou no mundo.” (Sab 13, 23-23)

A própria natureza se tornou hostil ao homem por causa do seu pecado (cf. Gn 3, 14-24).

Mas Deus não poderia impedir todo mal de acontecer? Ele não poderia impedir as enchentes, os desmoronamentos, etc.? É claro que Deus poderia, pois é Onipotente; mas se Ele fizesse isso, criaria um mundo artificial, sem leis, e o homem não seria livre e responsável pelos seus atos, e “senhor” da criação. O Senhor entregou o mundo nas mãos do homem para ele cuidar; para isso, lhe deu inteligência, mãos hábeis, e tudo o mais de que ele necessita.

Mas, infelizmente, o homem usa, muitas vezes, tudo isso para o mal, movido pelo egoísmo, soberba, ganância, inveja, ira… Quanto dinheiro é gasto em guerras, corrupção, drogas, crimes!? Se todo este montante fosse gasto para o bem, os pobres não teriam suas casas derrubadas pelas enchentes, não morreriam de fome, de doenças curáveis, e assim por diante.

Quando houve o terrível “tsunami”, no dia 26 de dezembro de 2004, muitos se perguntaram: “Onde estava Deus?” A resposta dada pelo Santo Padre foi: “Ele estava ali sofrendo com as pessoas”. O Senhor jamais quis aquilo, foi obra da natureza imperfeita e também decaída pelo pecado do homem. E, hoje, se sabe que aquelas 230 mil mortes poderiam ter sido evitadas se houvesse um bom serviço de sismologia funcionando ali, para que as pessoas fossem alertadas a tempo; mas não havia. Ainda que se afirme que alguns sismólogos, em seus departamentos, previram essa catástrofe, o que ocorre é que a comunicação com as áreas atingidas não foi possível. Os cientistas americanos poderiam ter avisado as autoridades locais para que toda aquela área fosse evacuada. O problema foi que naquela região não havia os recursos técnicos para captar o aviso que permitiria evitar a mortandade.

A atriz Teresa Amayo, mãe da diplomata carioca Lys Amayo Benedek D’Avola, que também faleceu em conseqüência desse maremoto, foi clara ao acusar o descuido dos países ricos para com aquela região. Os abastados são egoístas e não cuidam das regiões pobres deste planeta. Não se pergunte então: “Onde estava Deus?”. Ele estava chorando…

O homem sabe usar o dinheiro para a guerra e outros males, mas não o utiliza para prevenir os males, sobretudo, os que afligem os mais fracos. Então, por favor, não se pergunte: “Onde estava Deus?” Ele estava ali chorando por aquelas vítimas, porque a humanidade não sabe fazer uso da inteligência e da liberdade recebidas. Ele está gritando a todo instante: “Amai-vos uns aos outros como Eu os amei”. Mas quem O ouve?

A arrogância do homem de hoje, que se gaba de sua ciência, foi duramente punida. Gastos astronômicos são feitos com pesquisas espaciais e se esquece da humanidade que vive nas regiões de perigo. Sabemos que o homem vem maltratando o meio ambiente. O efeito estufa é sério. Que não se culpe a Deus, depois, pelos efeitos deste.
Há áreas de risco em muitos lugares, e mesmo quando se pode impedir futuros estragos, muitas vezes, não se faz pela justificativa de sempre: “Falta de recursos”…

Dia 18 de janeiro de 2005, depois da “tsunami”, a imprensa publicava: “O mundo precisa aprender lições da tsunami, alerta Annan”. Acrescentava: “KOBE, Japão – O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Kofi Annan, exortou o mundo a aprender com a ‘tsunami’ que atingiu o sul da Ásia e disse que investimentos, feitos agora, limitarão as vítimas e os danos de desastres naturais inevitáveis”.

Será que o mundo aprendeu?

Se houvesse uma vontade política das nações, a miséria e a fome poderiam ser varridas da face da terra. Que os homens sejam mais humildes e reconheçam seus crimes, pecados, perversidades, se convertam e, então, sim, teremos um mundo mais humano e com menos catástrofes.

Mas a Providência Divina sabe tirar o bem para os homens, inclusive das situações mais dolorosas e trágicas. A maneira como isso acontece é para nós um grande mistério; mas, porque Deus é bom, temos de pensar que não permitiria estes fatos dolorosos e trágicos, se não fosse capaz e não pudesse tirar do mal o bem para os homens. “Tudo concorre para o bem dos que amam a Deus” (1Ts 5, 17).

Deus, sem dúvida – nos garante a fé – em sua ternura paterna, está perto dos inocentes e os salva em seu Reino. Na vida eterna, Ele sempre poderá socorrer os seus inocentes filhos.

Mas também, cada catástrofe constitui um chamado à conversão, é o que Jesus nos ensina diante do acidente da torre de Siloé. “Ou cuidais que aqueles dezoito homens, sobre os quais caiu a torre de Siloé e os matou, foram mais culpados do que todos os demais habitantes de Jerusalém? Não, digo-vos. Mas se não vos arrependerdes, perecereis todos do mesmo modo” (Lc 13, 4-5).

Deus não olha – como nós o fazemos – somente para esta vida; Ele vê muito mais a vida que é eterna. Certamente, Ele, em seus desígnios insondáveis, se permite as catástrofes geradas pela maldade ou imprevidência da loucura humana, é porque sabe fazer delas um meio de salvação.


Felipe Aquino

Professor Felipe Aquino é viuvo, pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa “Escola da Fé” e “Pergunte e Responderemos”, na Rádio apresenta o programa “No Coração da Igreja”. Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova. Página do professor: www.cleofas.com.br e Twitter: @pfelipeaquino