A graça de Deus sempre povoou a história dos homens
Certamente, é difícil expressar, em conceitos, aquilo que compreendemos por graça e como a percebemos agindo em nossa história. Contudo, nesse espaço de tempo, meu empenho se remete a tal conquista. Contemplando Jesus, perceberemos que nossa história é constantemente marcada pela graça, por essa impossibilidade de nos afastar-nos do Definitivo, que sempre abarcou aquilo que somos, sendo o significado perene e silencioso a investir nossas ausências e a superar nossa compreensão a respeito da vida e de nós mesmos.
A graça é uma daquelas realidades que sabemos o que é, que conseguimos reconhecer sua essencialidade em nossa vida, mas que, ao mesmo tempo, não conseguimos abarcar totalmente nem expressar com inteireza. É como o ar: sabemos que ele está aí e nos sustenta na existência, no entanto, não podemos domesticá-lo nem aprisioná-lo em nossos cofres e contas bancárias. Enfim, a graça é algo que, de fato, porta a acessibilidade ao Eterno, sendo ponte para Ele, ou é um mistério intransponível, que obscurece ainda mais as pequenas fagulhas de luz que temos acerca do inabarcável? Acredito ser um pouco das duas coisas.
Percebo que a ambiguidade que obscurece a compreensão acerca de tal Mistério não acontece tanto em sua imanência enquanto presença que se manifesta, mas sim no conceito que nutrimos referente a Ele, pois ela sempre esteve presente no humano, mas nem sempre os corações tiveram a precisa sensibilidade para descobri-la nem interpretá-la.
A graça divina conduz os acontecimentos
A graça sempre povoou a história dos homens. Quando se faz, a partir dela, uma leitura dos fatos, percebe-se sua ação e gerência silenciosa conduzindo os acontecimentos e projetando grandes benefícios, até mesmo de imensas dores e desventuras épicas. Apalpa-se concretamente tal gerência também habitando a história eclesiástica, na qual a força do inverno nunca foi capaz de subtrair o brilho e a vida da primavera, mesmo em momentos nos quais existiram profundos erros e contradições.
Nesse sentido, a graça sempre foi acesso para entender a história da vida humana e para nos aproximar d’Aquele que sustenta essa história. Contudo, ela também se estabelece como um mistério intransponível, que nos faz perceber nossa finitude para compreender tal ação no tempo e na história e, consequentemente, nossa necessidade de nos abandonarmos em Seu regaço de acolhida e proteção.
Graça é compreensão, é presença e também afastamento. A ausência também é necessária, pois ela ensina o valor da presença; e mais: ela nos faz perceber o que verdadeiramente somos na relação com o Eterno e o devido lugar que devemos ocupar em tal relação, levando-nos a concretamente assumir nossa condição de dependência e filiação.
O ocultamento da graça
O ocultamento também se estabelece como ação contínua e eficaz da graça. Ele revela que precisamos estar sempre buscando para encontrar, pois nossa pátria não é aqui e estamos sempre a caminho. O ocultamento da graça nos liberta do comodismo provocado pela suposta pretensão de sermos possuidores absolutos da graça divina, uma realidade sempre presente e atuante na vida humana, mesmo na ausência de sua compreensão e na opacidade dos dias.
É preciso desenvolvermos a devida sensibilidade para percebê-la e acolhê-la em Sua maneira peculiar de agir em nossa história. Assim, seremos mais plenos de sentido na vida e construiremos significativamente, já aqui nesta terra, os alicerces de uma profunda comunhão com o Eterno, que atingirá o seu ápice na vida que há de vir.