Quando um jovem pergunta a Jesus sobre a vida eterna, a resposta é: “Se queres entrar na vida, observa os mandamentos” [1]. Jesus também nos ensina que o maior mandamento de todos é o amor: “Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e com toda a tua mente e amarás teu próximo como a ti mesmo” [2]. E de todos os amores, a paternidade é o que nos aproxima de forma mais profunda do amor que é ensinado por Jesus Cristo, compreendendo a posição de pai, valorizando a vida, intensificando a empatia e vivenciando a pureza de uma criança. Por isso, tomemos a paternidade como verdadeiro comprometimento com o caminho da santidade.
De acordo com o Catecismo da Igreja Católica (2070), os Dez Mandamentos fazem parte da revelação de Deus e, ao mesmo tempo, ensinam-nos a verdadeira humanidade do homem. Põem em relevo os deveres essenciais e, por conseguinte, indiretamente, os direitos fundamentais inerentes à natureza da pessoa humana. Como deveres fundamentais do homem para com Deus e para com o próximo, ninguém pode ignorá-los. A reflexão sobre os Mandamentos é um exercício importante para a vida cristã. Neste Dia dos Pais, essa reflexão está diretamente ligada à paternidade.
Ao tornar-se pai, o homem passa a se identificar melhor com Deus-Pai e essa relação com o Filho. Compreende-se a grandiosidade da misericórdia de Deus que “tanto amou o mundo que lhe deu seu Filho unigênito” [3]. Assim, preenchido pelo amor verdadeiro de pai, cumpre-se com retidão o Primeiro Mandamento, amando a Deus como o exemplo de Pai que buscamos em nós, caminhando para ser “perfeito como vosso Pai celeste é perfeito” [4]. E uma vez consciente do amor paterno, ele transborda em nós para o próximo, reconhecendo em todos os filhos que precisam sentir-se amados. O mandamento do amor, aquele que Jesus nos apresenta como o mais importante, surge espontaneamente no coração do pai que vive a paternidade com sinceridade.
O verdadeiro significado de pai
A partir do nascimento do filho, demora ainda algum tempo para que se possa ouvir o chamado de “pai” e saber que é você que está sendo chamado. A palavra “pai” toma um significado ainda mais especial, de amor, de alegria, de paz, de paciência, de delicadeza, de bondade, de fidelidade [5], de tantas virtudes cristãs, invocadas pelo chamado simples da criança. Da mesma forma, o nome de Deus toma nova forma, daquele que clama quem primeiro é clamado. Não haverá mais desvio do segundo mandamento que impõe não invocar o santo nome de Deus em vão.
Na vivência da paternidade, o tempo de qualidade com o filho, desde as atividades mais extraordinárias, como ir ao circo, ao cinema, ao parque, em uma viajem; até as pequenas coisas, como dar banho, escovar os dentes ou contar uma história, passam a ter um significado maior, superando tudo o mais da vida comum. Daí que os momentos dedicados especialmente à presença de Deus, os domingos e Festas de Guarda, assumem a qualidade desses momentos de pai e filho, impulsionando uma entrega mais sincera e com o coração aberto a receber o mesmo amor que se entrega ao filho. Cumpre-se, assim, com profundidade, o terceiro mandamento.
Honrar pai e mãe
Chegamos ao mandamento diretamente ligado à paternidade, o de honrar pai e mãe, o único com uma recompensa imediata, de “que se prolonguem teus dias sobre a terra que Javé, teu Deus, te dá” [6]. O Catecismo da Igreja Católica (2197) ensina que Deus quis que, depois de Si, honrássemos os nossos pais, a quem devemos a vida e que nos transmitiram o conhecimento de Deus. Temos obrigação de honrar e respeitar todos aqueles que Deus, para nosso bem, revestiu da sua autoridade. Ao tornar-se pai, o homem se reveste dessa autoridade, direcionando-o para fazer-se digno, enquanto exemplo a ser seguido pelos filhos.
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Persuadidos pelo amor paterno, agora também na qualidade daquele que ama como pai, cumprem-se o quinto mandamento como consequência lógica do amor. A vida, gerada e da qual nos é confiado o cuidado, revela-se especialmente sagrada e afasta definitivamente do coração do pai qualquer forma de morte (homicídio, aborto, suicídio), compreendendo e cumprindo com caridade e misericórdia o quinto mandamento. Sobre o sexto mandamento, não cometer adultério, o Catecismo da Igreja Católica (2366) faz referência direta ao filho, que não vem de fora juntar-se ao amor mútuo dos esposos, mas surge no próprio coração deste dom, do qual é fruto e complemento. A proteção da família, para que seja um lar saudável e amoroso, recai especialmente ao pai que se coloca como protetor e alicerce familiar.
Respeito pelo próximo
A expressão “dar leite aos filhos” é comumente usada para dar importância ao dinheiro, seja a remuneração pelo serviço ou o preço em uma venda. Com efeito, o sétimo mandamento proíbe tomar ou reter injustamente o bem do próximo e prejudicá-lo nos seus bens, seja como for. Exige, em vista do bem comum, o respeito pelo destino universal dos bens e pelo direito à propriedade privada, como esclarece o Catecismo da Igreja Católica (2401). Esse valor dos bens materiais, que assume maior relevância no sustento dos filhos, é o que também orienta o pai ao respeito pelos bens do próximo.
Há uma reflexão que com frequência me vêm em mente: “Quando seu filho fizer algo errado, ele correrá para você ou de você?”. Talvez as primeiras oportunidades de mentira para uma criança sejam com a intenção de evitar a repreensão paterna. É preciso, então, encontrar o equilíbrio entre a autoridade (digna da honra da qual já falei mais acima) e a misericórdia (que sustenta a confiança). O Catecismo da Igreja Católica (2468) apresenta a verdade como a virtude que consiste em mostrar-se correto nos atos e em dizer a verdade nas palavras, evitando a duplicidade, a simulação e a hipocrisia. A transmissão desses valores aos filhos ocorre, principalmente, pelo exemplo, ou seja, pelo cumprimento fiel do oitavo mandamento.
O coração puro de uma criança
O coração é o instrumento da moral do homem, pois é de onde vêm os maus pensamentos, os homicídios, os adultérios e outras coisas imorais como furtos, falsos testemunhos e blasfêmias, tudo o que torna o homem impuro [7]. É o que torna valioso o nono mandamento, de guardar castidade nos pensamentos e nos desejos, de manter-se puro e íntegro, vencendo o combate entre a carne e o espírito. Aos pais é reservado um desafio maior, pois as crianças são verdadeiramente puras de coração, enquanto a nós cabe o exemplo de pureza para elas.
Cabe a nós, então, nos aproximarmos ao máximo desse espírito inocente de criança, que nos acolhem como conhecedores do que é certo e errado. Já o décimo mandamento, como ensina o Catecismo da Igreja Católica (2534) é um desdobramento que completa o nono, proibindo cobiçar o bem de outrem, raiz de onde procede o roubo, proibido pelo sétimo mandamento.
A paternidade é uma transformação intensa que nos redireciona na busca da santidade para construir com os filhos uma relação de amor sincera e verdadeira. Esse amor, então, transborda ao próximo, à exemplo e pedido do Nosso Senhor. Assim, é preciso que este corpo corruptível se revista de incorruptibilidade e que este corpo mortal se revista de imortalidade [8]. Assumir o papel de pai é comprometer-se com o constante enriquecimento do coração, é reconhecer a presença de Deus na vocação familiar, para tornar-nos santos. Que a paternidade seja assim para todos nós: vivência constante do amor do Pai, da comunhão com o Filho e da luz do Espírito Santo. Que assim seja!
Citações do texto bíblico
[1] (Mt 19, 17); [2] (Mt 22, 37); [3] (Jo 3, 16); [4] (Mt 5, 48); [5] (Gl 5, 22); [6] Ex 20, 12); [7] (Mt 15, 19); [8] (1Cor 15, 53).
Referências
BÍBLIA SAGRADA. Tradução da CNBB, 18 ed. Editora Canção Nova.
CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. In textos fundamentais. Arquivo do Vaticano.