Vasos de barro!

O mais bonito da história da salvação é que a Bíblia jamais esconde os defeitos e as franquezas das pessoas. Deus age na história humana por meio de homens e mulheres fracos e limitados, por intermédio de pessoas cheias de defeitos, mas que um dia tiveram a coragem de entregar tudo a Deus e permitir seu senhorio absoluto, inclusive em suas franquezas e limitações.

Ao perceber a grandeza de Deus na franqueza de cada um, podemos nos convencer de que Deus pode fazer muito em nossa vida também.

Basta que meditemos sobre os preferidos de Deus. Os grandes amigos de Jesus foram os pecadores e rejeitados da sociedade. Porque será? Deus não gosta dos bons? Então não devemos ser santos? Afinal de contas, quando falamos que Deus prefere os piores, estamos estimulando o mal no mundo. Para que eu vou ser bom, se Deus gosta mesmo é dos pecadores?

Desde pequenos aprendemos que devemos ser bons. A mãe não se cansa de recomendar: “Seja bonzinho!”. “Ninguém gosta de criança que faz coisa errada…” “Quando a visita chegar, não vá fazer feio”.

Começa a luta da vida. “Preciso ser o melhor!” Então, como a pessoa não consegue ser “melhor que as outras”, tem dois caminhos a seguir:

1 – Ser fingido e mascarado. “Assim ninguém descobre meus defeitos. O importante é ser melhor, não importam os meios”. A pessoa aprende a mentir para os outros e para si mesma. “Ninguém pode conhecer meus erros e defeitos”.

2 – Dimimuir os outros. Já que não posso ser melhor, tento diminuir os outros, espalhando seus defeitos, inventando defeitos quando não os descubro, prejudicando e tentando derrubar o outro, que se torna um adversário. Como o outro não passa de um espelho de nós próprios, diminuí-lo é tentar fazer que as demais pessoas não percebam meus defeitos e minhas franquezas.

Nasce o discurso do derrotado. Eu vou para o buraco, mas levo um monte de gente comigo. Não estou sozinho neste barco. O pior de tudo isso: o derrotado, quando não assume sua história, acaba sempre tentando achar algum responsável por seus fracassos. O problema está sempre no outro. É preciso justificar os próprios erros, nem que seja recorrendo ao passado ou a mentiras. Além de achar culpados, os derrotados gostam de mostrar que não estão sozinhos na derrota.

A vida vira uma grande competição. Porque o mundo é dos melhores! Na escola, o melhor aluno ganha prêmios, elogios, destaques, diplomas de honra ao mérito… Os garotos vivem brigando para provar que o seu pai é melhor… “Minha mãe é melhor que a sua…” “Minha casa é maior…” .

Para servir o exército só podem ser escolhidos os melhores. Lembro-me de quando fui chamado para apresentar no serviço militar. Embora, eu trabalhasse numa fábrica militar, e por isso não precisasse cumprir meu tempo no exército, como os demais, todos precisavam ir fazer os exames. Havia um jovem que desejava muito servir o exército, sempre me lembro dele. Era o maior sonho de sua vida. E foi recusado porque tinha um sério defeito físico. Nunca mais tive notícias daquele rapaz.

Nas melhores faculdades só entram os melhores alunos. O vestibular seleciona e classifica os melhores.

Os melhores profissionais ganham os melhores salários e trabalham nas melhores fábricas e empresas, por isso compram os melhores carros, moram nas melhores casas, vestem as melhores roupas…

Em tudo precisamos ser os melhores. O mundo nos ensina a escolher sempre o melhor.

Deus parece fugir a essa regra!

Na história de cada personagem abordado, encontramos um pouco, e até muito, de nossa própria vida, meditando a história de homens e mulheres que não eram os melhores. Aliás, em muitas coisas, foram até mesmo os piores, mas deixaram a graça de Deus trabalhar em seus corações e puderam ser canais e sinais de Deus, inclusive a partir de suas franquezas e de seus pecados. Foram pessoas que entraram para a história sagrada e, pelo “sim” que deram, permitiram que Deus entrasse para sempre em nossa história.

“Porque o Deus que disse ‘Das trevas brilhe a luz’ é também aquele que fez brilhar a sua luz em nossos corações, para que irradiássemos o conhecimento do esplendor de Deus, que se reflete na face de Cristo. Porém, temos esse tesouro em vasos de barro, para que transpareça claramente que esse poder extraordinário provém de Deus e não de nós. Trazemos sempre em nosso corpo os traços da morte de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste e nosso corpo” ( 2Cor 04,06-07. 10 ).

São Paulo, um dos personagens dessa história do amor de Deus manifesto aos piores aos olhos do mundo, nos conta o segredo. Deus nos escolhe, os fracos e limitados, para confundir os poderosos, para que se manifeste o seu poder e a sua infinita misericórdia. Acima de tudo, essa maravilhosa pedagogia de Deus nos ensina que não podemos, nunca, sob nenhuma hipótese, julgar quem quer que seja, por qualquer comportamento ou atitude.

A marca do cristão precisa ser a marca do amor. Sabendo-nos fracos, buscamos em Deus a nossa força. Fortalecidos, perdoados e curados por Deus, colocamo-nos em suas mãos, como instrumentos de cura e libertação para os outros. Cria-se assim, uma corrente bonita de salvação e graça.

O mundo precisa, com urgência, de homens e mulheres de corações curados, gente que se sabendo fraca e limitada não se conforme com o mundo, mas busque a própria transformação pela renovação da mente e do coração.

“Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do próprio espírito” (Rm 12, 02).

Livro: “Corações Curados”