Pão para todas as Mesas

Foi muito bonita a romaria de Jales, no domingo passado. Quando o povo se põe em marcha, unido, guiado pela fé, sempre resulta um espetáculo bonito, que expressa valores importantes. É por isto que o povo guarda a memória desses momentos e sente que eles iluminam a realidade cotidiana e projetam uma luz que alimenta a utopia da esperança.

Foi surpreendente o gesto final da romaria, com a bênção do pão. Ao lado dos pães gigantes que simbolizavam as datas celebradas na romaria – os 50 anos da CNBB, os 40 anos da abertura do Concílio, e os 20 anos da presença do bispo na diocese – e que expressavam a intenção da Igreja de, como Cristo, se fazer “pão de vida”, foi aparecendo a fartura de alimentos, capaz de saciar a multidão, revivendo a cena do evangelho. Os cestos cheios de pães, espalhados por toda a parte, sinalizavam o momento da refeição, que contagiava também os que tinham trazido o seu pão que era erguido para receber a bênção, da qual brotava o impulso para a partilha fraterna.

Junto com os pães, a presença dos produtos da região, na exuberância do seu tamanho e de sua beleza. O repolho gigante, os tomates esplêndidos, os pimentões avantajados, a berinjela avolumada, demonstravam a inequívoca fertilidade da terra, pronta a responder com generosidade a todos os que a cultivam com dedicação e amor. A demonstração de fartura foi completada com a exibição das “uvas de Jales”, surpreendentes no seu tamanho e no seu sabor, mostrando o que pode fazer a união entre a potencialidade da natureza e a competência dos agricultores.

Pois bem, estava demonstrada a possibilidade da abundância, capaz de responder à urgência da fome. Neste país, seria proibido passar fome, e se torna uma vergonha a existência de 50 milhões de brasileiros que vivem na miséria.

Onde mora o problema?

Não certamente na terra, que está aí para mostrar o quanto ela pode produzir. Não na água, que existe em abundância, e que só precisa ser bem guardada e usada adequadamente. Não no clima, que nos abençoa o ano inteiro com sua clemência cadenciada pelo ritmo da natureza. Não na incompetência dos agricultores, que apesar de todos os percalços de uma política equivocada, ainda não desistiram do namoro com a terra e do sonho de realizar com ela uma parceria de vida em abundância para todo o povo brasileiro.

Onde está, então, o impasse?

Nem rodeios, é preciso dizer que falta partilha. Neste país, as mesas não são bem servidas. Os alimentos existem em abundância. Falta encontrar o caminho certo da distribuição justa e adequada . A força motora que deve conduzir o projeto político do país deve ser a firme decisão de garantir pão para todas as mesas. O ponto de chegada orienta todos os passos da caminhada. O rumo certo garante o acerto das providências a tomar.

Precisamos resguardar a capacidade de termos um projeto nacional, guiado pelo objetivo de garantir vida digna para todos, que convoque para a responsabilidade de todos, que integre a competência dos trabalhadores, que capitalize tecnologia suficiente para nos libertar da dependência espoliativa, e que faça dos próprios brasileiros os primeiros destinatários dos bens produzidos. A obstinação em garantir para todos o “pão nosso de cada dia”, deve se tornar a força motora a conduzir a reorganização do país.

Na proximidade da Semana da Pátria, e em tempos de campanha eleitoral, a bênção da romaria nos faz pensar, seriamente, em nossas responsabilidades políticas. Ela precisa guiar nosso voto em outubro, para passarmos da bonita utopia para uma condizente realidade.