O corpo é capaz de tornar visível o invisível

4. O sacramento do matrimônio, ao constituir como sinal sacramental a união dos esposos, exprime o realismo do mistério da encarnação, em que o Verbo eterno de Deus se nos dá, numa comunhão de amor, através do Seu próprio Corpo: “Tomai e comei, isto é o meu Corpo” (Mt. 26,26); e São Lucas acrescenta “que vai ser entregue por vós. Fazei isto em minha memória” (Lc. 22,19). A encarnação e o sacrifício redentor de Cristo são o fundamento de uma teologia do corpo. O corpo exerce, no conjunto do mistério da pessoa humana, um papel simbólico de sinal. Ele exprime e torna visível os sentimentos do espírito e do coração: a ternura, a entrega e o dom, a intimidade e a fecundidade, o desejo unificador de comunhão.

Numa das suas Catequeses de quarta-feira o Santo Padre afirma, referindo-se ao sacramento do matrimônio: “Como sinal visível, o sacramento constitui-se com o ser humano enquanto corpo, na realidade da sua masculinidade e feminilidade visíveis. Com efeito, o corpo e só ele, é capaz de tornar visível o que é invisível: o espiritual e o divino. Ele foi criado para transferir para a realidade visível do mundo o mistério escondido, desde toda a eternidade, em Deus e ser o seu sinal visível” 6.

Sinal visível das realidades invisíveis, o corpo exprime a comunhão de amor entre o homem e a mulher e o aprofundamento dessa comunhão, na caridade é, exatamente, a graça própria deste sacramento. E mais uma vez este crescimento qualitativo entre duas pessoas se insere na relação entre Cristo e a Igreja, sendo a sua realização.

No Antigo Testamento era comum fazer da união esponsal o símbolo da união de Deus com o seu Povo, no mistério da aliança. No Novo Testamento verifica-se uma transformação qualitativa desta imagem. A verdadeira e definitiva comunhão esponsal é aquela que existe entre Cristo e o Seu corpo, que é a Igreja e as núpcias dos cristãos participam dessa comunhão esponsal e, através do sacramento, realizam-na na sua própria experiência humana de casal, foco de irradiação de uma nova comunhão alargada, a família, autêntica concretização da Igreja comunhão. A família, a partir da graça do sacramento, torna-se, realmente, uma “igreja doméstica”. É São Paulo que faz a síntese entre estes dois momentos de um mesmo mistério: “Eis que o homem deixará o seu pai e a sua mãe para se unir à sua mulher e os dois formarão uma só carne. Este é um mistério de grande alcance, porque se aplica a Cristo e à Igreja” (Ef. 5,31-32). Isto é possível porque os cônjuges cristãos, antes de serem o corpo um do outro, fazem ambos parte do Corpo de Cristo. São Paulo, afirmando que, com o Seu corpo, Cristo se une à Igreja, pergunta: “E nós, não somos membros do Seu Corpo?” (Ef. 5,29-30).

É por isso que, na vida de um casal cristão, a Eucaristia, enquanto comunhão com Cristo, é um momento tão importante, como a sua própria união conjugal. Voltamos a citar a Familiaris Consortio: “O dever de santificação da família tem a sua primeira raiz no batismo e a sua expressão máxima na Eucaristia, à qual está intimamente ligado o matrimônio cristão (…) Redescobrir e aprofundar essa relação é absolutamente necessário, se quiserem compreender e viver com maior intensidade as graças e responsabilidades do matrimônio e da família cristã. A Eucaristia é a fonte mesma do matrimônio cristão” 7.