O celibato e os escândalos!

O celibato é dom concedido por Deus à pessoa que se entrega de modo absorvente, radical, de corpo e alma, à causa do reino. É explosão de amor! Jesus foi celibatário não por obrigação e, sim, por livre opção da entrega total de sua vida ao reino do pai! no evangelho de Mateus (19,1-9), depois da controvérsia sobre o divórcio, Jesus se reporta ao celibato, como dom, afirmando: ‘existem os que não se casam por causa do reino dos céus! quem puder entender, entenda!’.

A Igreja latina escolhe seus padres, entre homens que vivem em celibato e pretendem manter o celibato! Ninguém pode ser forçado, obrigado, a ser celibatário, a não se casar, para ser padre.

Nas Igrejas Orientais, está em vigor, há séculos, uma disciplina diferente: enquanto os bispos só são escolhidos entre os celibatários, homens casados podem ser ordenados padres e exercem ministério muito útil em suas comunidades.

O celibato não pode ser responsabilizado por escândalos que têm sido comentados, denunciados, pelos meios de comunicação social. A problemática afetivo-sexual é bela, complexa, envolvente, desafiadora. Na vida dos padres, há luzes e sombras. A bem da verdade, há mais luzes que sombras. No processo vital do padre, há fragilidades, pecados, também no campo sexual. Entre os casados, os deslizes são ainda maiores e mais numerosos! Digo-o não para justificar, explicar, pecados de padres mas para deixar claro que a causa não pode ser colocada no celibato e sim, nas raízes genética, psico-afetivas que antecedem, acompanham e seguem a geração, gestação, nascimento, de cada pessoa! As causas-ocasiões residem no clima permissivista, erotizado, materialista em que a sociedade atual está imersa.

A Igreja deve ter cuidado cada vez mais esmerado na seleção e formação dos candidatos ao prebiterato. Esforços ingentes são feitos neste sentido. Nos longos anos de formação, onde profissionais em psicologia, espiritualidade, também devem estar presentes, candidatos não celibatários vão se afastando ou são convidados a enveredar por outros caminhos! Dramas surgem, com maior freqüência, quando, por motivos os mais adversos, não celibatários são ordenados padre. Atenção particular merecem os próprios padres durante a vida toda, sendo promissor, em sua formação permanente, o surgimento da Pastoral Presbiteral que dedica atenção especial aos aspectos da sexualidade e afetividade. Neste contexto todo, surge com ímpeto a pergunta: ao lado de padres celibatários, não seria conveniente a abertura, por parte da Igreja latina, à ordenação presbiteral de homens casados, provados na vida conjugal-familiar, profissional e religiosa?

Os representantes dos padres do Brasil, reunidos em Itaici, em seu 9º Encontro Nacional, de 1º a 6 de fevereiro de 2002, sobretudo diante das 70 mil comunidades eclesiais que não têm celebração dominical da eucaristia, proclamaram a necessidade de revisão das “modalidades do ministério presbiteral, fixadas por uma longa tradição, mas hoje inadequadas à realidade e distantes da práxis do Novo Testamento e da Igreja Antiga…” Donald B. Cozzens, reitor e professor de teologia pastoral no Seminário Santa Maria, Cleveland, EE.UU., em seu livro “A Face Mutante do Sacerdócio” afirma que a mudança de postura da Igreja neste campo, é urgente: “Mais cedo ou mais tarde, a questão será enfrentada mais objetivamente do que nas últimas décadas do século XX. Quanto mais isso demorar para acontecer, maior será o dano para o sacerdócio e para a Igreja”.

Padres casados, ao lado de padres celibatários exercendo o ministério, não estarão imunes de lutas, quedas, pecados, no campo sexual. A condição humana é complexa, “trágica” na afirmação de Malraux. Os Padres encontram na misericórdia do Senhor Jesus a fonte de sua esperança. Confiando no seu amor e agradecendo o perdão que os revigora, têm ânimo para retomar o caminho, apesar das falhas. A verdade é que, homens, não anjos, com responsabilidades especiais, chamados à coerência de vida no seguimento de Jesus, os Padres contam com a graça e a misericórdia do Ressuscitado e marcam presença de máxima importância, por sua dedicação, heroísmo até, na vida da Igreja e da Pátria brasileira!

Dom Angélico Sândalo Bernardino
Bispo de Blumenau (SC) e
Responsável pelo Setor Vocações e Ministérios da CNBB