Todos os anos, o Papa envia no Dia Mundial da Paz, 1º de janeiro, uma mensagem dirigida aos católicos e também a todos os homens de boa vontade. A causa interessa à Humanidade, sem exceções. O título do documento para a próxima celebração é: ‘Não há paz sem justiça: não há justiça sem perdão‘. Como tenho feito habitualmente, procuro dar a maior divulgação ao conteúdo para melhor aproveitamento da riqueza contida nos ensinamentos do Pontífice. É o que farei a seguir.
Para o primeiro dia de 2002, comemoração do Dia da Paz, tem como pano de fundo os dramáticos acontecimentos do passado 11 de setembro. Naquele dia foi perpetrado um crime de terrível gravidade: em poucos minutos, milhares de pessoas inocentes, de várias procedências étnicas, foram horrorosamente massacradas (nº 1). Diante dessa ocorrência em New York e Washington, fruto do mysterium iniquitatis, a Igreja quer dar testemunho de sua esperança na vitória sobre a força do mal, que parece triunfar.
A paz: obra de justiça e amor. João Paulo II fundamenta seu ensinamento na dolorosa experiência pessoal nos indescritíveis sofrimentos de povos e indivíduos, causados pelos totalitarismos nazista e comunista. Acresce um grave problema que aflige o mundo, decorrente do novo nível de violência, introduzido pelo terrorismo organizado. Para este Dia Mundial da Paz, o Papa advoga ser a verdadeira paz, obra da justiça na expressão de Isaías (32,17). As duas dimensões exigidas para a paz verdadeira, a justiça e o perdão, são objeto de reflexão do Santo Padre. Diz ele: O perdão não se opõe, de modo algum, à justiça, porque não consiste em diferir as legítimas exigências da reparação da ordem violada. E é precisamente a paz, baseada na justiça e no perdão, que hoje é atacada pelo terrorismo internacional se transformou numa rede sofisticada de conluios políticos, técnicos e econômicos (…) e se estende até abranger o mundo inteiro (nº 4).
Existe, portanto, um direito a defender-se do terrorismo. E deve, como qualquer outro, obedecer às regras morais e jurídicas na escolha, quer dos objetivos, quer dos meios. De grande importância, por sua clareza, a orientação do Pontífice, válida, de modo particular, para os católicos: No entanto, deve-se afirmar categoricamente, que as injustiças existentes no mundo jamais podem ser invocadas como desculpa, para justificar os atentados terroristas (…) a falsidade da pretensão que se arroga o terrorismo, de agir em nome dos pobres, é patente. Não se mata em nome de Deus! (nº 5) O Papa é peremptório quando afirma: Quem mata com atos terroristas, cultiva sentimentos de desprezo pela humanidade, manifestando desespero pela vida e pelo futuro: nessa perspectiva, tudo pode ser odiado e destruído (nº 6). O fundamentalismo fanático gera a convicção de poder impor a todos a aceitação de sua própria visão da verdade. Realmente, o respeito pela consciência alheia permite apenas propor a concepção pessoal da realidade ao interlocutor, cabendo a este acolhê-la responsavelmente. A conclusão é clara:Nenhum responsável das religiões pode ser indulgente com o terrorismo e, muito menos, pregá-lo (nº 7).
A Mensagem, a seguir, insiste na necessidade do perdão. Este, antes de ser um fato social, tem sua sede no coração de cada um. Vai de encontro ao instinto espontâneo de devolver o mal com o mal. O modelo supremo, nós encontramos no Cristo que, do alto da Cruz, assim rezou: Perdoa-lhes, ó Pai, porque não sabem o que fazem (Lc 23,24).
Essa atitude, embora estrada mestra para solucionar problemas, não é de imediato entendimento e de fácil aceitação, pois se trata de uma mensagem, de certo modo, paradoxal. De fato, ela implica sempre em aparente perda, a curto prazo, mas garante posteriormente, lucro real. Supõe uma força espiritual e coragem moral. O Dia Mundial da Paz é uma oportunidade para reflexões serenas, que levem à renovação dos corações, das pessoas e nas relações entre os povos.
Essa matéria nos apresenta a importância da compreensão e cooperação inter-religiosa colocando as crenças a serviço da paz entre as nações. O Papa está convencido da necessidade dos líderes judeus, muçulmanos e cristãos tomarem a iniciativa de condenar o terrorismo, recusando toda forma de legitimação religiosa ou moral a quem ao mesmo participa. Essa atitude ajudará na formação de uma opinião pública moralmente correta, pressuposto para a edificação de uma sociedade internacional, capaz de procurar a tranqüilidade da ordem, da justiça e da liberdade.
O Documento conclui com o apelo à oração pela paz, na ordem, na justiça e na liberdade. Nesse sentido, o Papa convidou os representantes das religiões do mundo para, em Assis, no dia 24 de janeiro, rezarem pela paz.Um edifício sem alicerce está sujeito a ruir, provocando a destruição. Combater os males que afligem os homens, sem obedecer à ordem estabelecida por Deus é um esforço fadado ao fracasso. Sem uma ordem jurídica, moral, fundamentada no Senhor e não no egoísmo dos homens, jamais se pode obter sólidos resultados. Voltar-se para Deus pela prece assídua é o único caminho.
Este ensinamento exposto na Mensagem de João Paulo II por ocasião do Dia Mundial da Paz do ano de 2002, tem sua aplicação ao terrorismo internacional e à violência no interior dos países, das famílias. E não nos esqueçamos que as drogas, e de modo particular, o enfraquecimento do combate a esse infame comércio ou a criação de facilidades aos usuários são inimigos da paz e da concórdia, também no interior dos lares.
A paz somente será possível entre as nações e cidadãos, quando a comunidade e as pessoas se voltarem para Deus.
O Senhor Prefeito César Maia sancionou uma Lei Municipal que autoriza a prática do aborto na rede hospitalar. Foi publicada no dia 26 último imediatamente após a data do Nascimento de Jesus.
Peço aos médicos católicos que não manchem as mãos e sua consciência cristã com o sangue dos inocentes. Não obedeçam às leis dos homens contrárias à Lei de Deus.
Cardeal Dom Eugênio de Araújo Sales
Rio de Janeiro 28 de dezembro de 2001