Casamento: o difícil é começar

Paula colocou Robertinho para dormir, depois de ter-lhe dado a mamadeira. Olhou-o com ternura e começou a narrar-me um fato que a havia deixado desorientada: «No meu celular havia uma mensagem desconcertante: “Como vai o Robertinho? Está crescendo bem? Eu me separei de Lucas. Um beijo, Cristina”. Cristina e Lucas são nossos velhos amigos. Tirávamos férias juntos, nos conhecíamos muito bem. Casaram-se antes de nós, há cinco anos, depois de um namoro interminável. E pela manhã chegou esta mensagem sem mais nenhuma palavra de explicação… Fiquei transtornada.»

Um casamento modelo, que de repente se desmantelou. No entanto, as estatísticas demonstram que, depois de um período de queda, está havendo um pequeno crescimento no número de casamentos. Segundo os sociólogos isso significa que, para os jovens, o matrimônio está deixando de ser uma simples imposição ligada a um determinado modelo social, e começa a ser sempre mais uma escolha de vida, que contém uma maior preocupação com a qualidade dos relacionamentos e com a realização pessoal.

Paradoxalmente, os casos de separação e divórcio também estão aumentando, enquanto diminui o tempo de vida conjugal: da tradicional crise dos sete anos, estamos quase passando para a crise… dos sete meses. Existe uma preocupação com os cursos de noivos, mas a Igreja começa a perceber que isso não basta e está investindo no acompanhamento do casal nos primeiros anos do casamento, consciente de que, na sociedade atual que relativiza tudo, esse é um período delicado.

Parece ser muito difícil, depois de um longo período de namoro, imposto pelo momento atual e pelas dificuldades financeiras, soltar as velas do barco e seguir ao largo. Corre-se o risco de ficar imóvel numa calmaria em alto mar. Até mesmo a inserção em uma comunidade da Igreja, por si só não garante um bom resultado. De fato, o risco — mais freqüente do que se pensa — é de mascarar a falta de um projeto de vida para o casal, substituindo-o sem muito critério pelo projeto do grupo; e isso é uma operação muito perigosa, porque no casamento, como diz o Papa na encíclica ‘Familiaris consortio’, existe uma dimensão de comunhão que é somente sua e não pode ser substituída. O ideal seria que o projeto do grupo servisse de inspiração e de enriquecimento para o projeto do casal. Será que isso é tão difícil?

O principal motivo pelo qual muitos jovens casais se separam é sempre o mesmo: a falta de realização. É comum escutar frases como: «Antes era tudo muito bonito, agora é tudo monótono e sem vida. Só existem problemas. Estamos desiludidos». Mas é preciso recordar que o casamento é “para os outros”. Em outras palavras, é um modo de viver em função da felicidade do cônjuge e dos outros. Casar-se pensando em si mesmo e para obter a própria felicidade e satisfação, significa voar baixo. Isso é uma conseqüência da fraqueza cultural da nossa sociedade, que contagia a muitos casais jovens.

Por isso multiplicam-se em todos os lugares as iniciativas de acompanhamento de casais jovens, com o intuito de criar espaços de comunicação com eles, privilegiando os valores fundamentais que estão na base da vida a dois: o diálogo e a comunicação entre os cônjuges, a compreensão da sexualidade, o relacionamento com as famílias de origem, a relação entre profissão e família e a relação com os primeiros filhos — ou mesmo com o fato de não poder ter filhos.

Toda essa temática faz parte da normalidade da vida do casal, mas pode se tornar um problema sério se não for aprofundada com a devida serenidade e com uma preparação adequada. Por isso, quem escolhe o casamento deve estar consciente de que é necessária uma espécie de formação permanente para que um matrimônio seja feliz e fecundo para os cônjuges e para os outros.

Os primeiros passos do casal

A atual dificuldade de construir uma família nasce, em geral, da incapacidade dos jovens de elaborar projetos e do medo que sentem em relação ao futuro, como conseqüência do seu despreparo para tomar decisões definitivas, e da falta de um modelo de projeto familiar.

Os jovens casais encontram-se encurralados entre problemas estruturais objetivos (estudos intermináveis, difícil ingresso no trabalho, problemas familiares, falta de recursos econômicos) e incertezas subjetivas (dificuldade psicológica para tornar-se independente da família de origem, elaboração de projetos para a vida futura de casal, dificuldade de aceitar-se na condição de pai ou mãe).

Mas essa situação não depende apenas dos jovens. Toda a sociedade está despreparada e privada de valores que possam servir de referência para o início de uma vida a dois.

Amor e sexo

O corpo tem em si uma certa ambivalência. É verdade que «eu sou o meu corpo»; porém, também é verdade que «eu tenho um corpo». Isso quer dizer que o corpo vive ao mesmo tempo as dimensões do “ser” e do “ter”. A sexualidade exprime também essa ambivalência e muitas vezes torna difícil a sua dimensão de doação, de “dom de si”, tendendo instintivamente a “tomar para si”. Para evitar esse risco que mata o amor, a relação sexual deveria ser o cume de uma comunhão que o casal procura construir durante o dia todo.

O amor não pode ser inventado num passe de mágica durante a relação sexual. É necessário construir uma convivência, uma comunhão de vida feita de diálogo, afeto, serviço, demonstrando com fatos concretos o bem que um quer ao outro. A relação sexual deveria ser como a ponta de um iceberg que tem a sua base imersa em todo o contexto da vida familiar.

Certamente o matrimônio como instituição, sem a sexualidade, é um esqueleto sem vida; mas é também verdade que a sexualidade fora do matrimônio acaba sendo simplesmente uma forma de egoísmo a dois.

Questão de diálogo

De vários modos está vindo em evidência hoje como a comunicação é um fato indispensável para a vida de um casal. Quando falta diálogo, também o relacionamento entra em crise.

Mas para amar realmente basta ser apenas bom comunicador? Não, é o amor a condição fundamental — o caminho por excelência — por meio da qual se pode retomar o diálogo, quando ele está comprometido. Portanto a “palavra de ordem” é: «Comunicar para amar e amar para comunicar».

O primeiro filho

Em geral, quando o equilíbrio da convivência a dois ainda está se consolidando, os casais jovens devem enfrentar uma nova realidade: a chegada do primeiro filho. Essa novidade pode desestabilizar o relacionamento do casal, sobretudo porque ele vem como um desconhecido. Nesse sentido a atitude mais certa que os pais podem ter é acolher o filho sem idéias preconcebidas, como uma nova vida, toda a ser descoberta. Fazendo assim, a sua presença, ao invés de ser um obstáculo, será uma riqueza para o relacionamento do casal.