Já a primeira clonagem bem sucedida, da ovelha Doly, mostrou a importância de critérios éticos para colocar a ciência a serviço da vida e da dignidade humana. O avanço da biogenética urge que seja acompanhado por avanços da bioética. É salutar constatar como a humanidade estremece quando se mexe com a vida humana, e desperta para a urgência de agir com responsabilidade.
Todos foram unânimes em advertir que era preciso ter cuidados redobrados para a aplicação dos avanços da genética em organismos humanos. A idéia da produção de clones humanos, que trariam as mesmas características genéticas do organismo de onde seriam derivados, foi rejeitada com veemência.
Agora, o The Journal of Regenerative Medicine anuncia que um laboratório particular dos Estados Unidos conseguiu produzir, por clonagem, um embrião humano, com a alegada finalidade de extrair dele células estaminais, que poderiam ser utilizadas com fins medicinais para cura de doenças.
Portanto, o embrião seria destruído, e serviria de matéria para fornecimento de células para serem usadas em outros organismos humanos. Mesmo que assim se evite a produção de organismos humanos a partir da manipulação genética, o experimento implica em outra conseqüência que fere frontalmente os critérios éticos que precisam presidir toda ação que interfere na vida humana. Pois provoca a constituição de um embrião humano, para em seguida destruí-lo.
Aí reside o fato gerador do impasse ético que incide sobre o projeto anunciado pelo referido laboratório. Nisto está a gravidade moral deste projeto, na expressão usada pelo comunicado da Santa Sé a respeito do fato. Cria-se um embrião, que já é vida humana, com todas as potencialidades de desenvolvimento inerentes a este estágio inicial da vida humana, e em seguida se destrói este embrião. Isto é, se destrói a vida humana. Mesmo alegando que sua destruição é para servir a outros organismos, esta alegação é insustentável do ponto de vista ético. Pois aceitá-la seria abrir caminho para a arbitrariedade, além de ignorar o valor único e que não se repete de qualquer organismo humano. Pois não somos só organismos fisiológicos.
Cada organismo humano é constituído em pessoa, sujeito inalienável de direito à existência, e nunca instrumento manipulável para servir a outros organismos. Ignorar isto é desconhecer o diferencial que nos distingue como humanos e como pessoas possuidoras de dignidade e de valor único e absoluto. Não somos ovelhas, que podem ser clonadas, e usadas para a melhoria genética de raças que possam servir melhor à ciência e à economia. Somos pessoas, esta a nossa responsabilidade, e este o fato que precisa servir de referência fundamental para guiar toda ação que interfere na vida humana.
Diante da evidente força deste princípio, a discussão sobre o recente experimento se situa em torno do momento em que o embrião se constitui em vida humana. A convicção da Igreja, amparada na genética moderna, é que desde o primeiro instante de sua constituição o embrião é vida humana, pois nele já estão presentes todas as potencialidades que irão determinar sua existência, como pessoa, como indivíduo com suas características bem determinadas. Destruir um embrião, mesmo em seus primeiros momentos de existência, é destruir uma vida humana já constituída. Por isto, fica evidente a repulsa diante do anúncio do laboratório. Não é correto destruir vidas humanas, mesmo alegando que é para curar doenças que afligem a humanidade.
O respeito incondicional pela vida humana é o caminho certo, e mais seguro, para colocar os recursos disponíveis, também os científicos, a serviço de todas as pessoas humanas.