Auto-imagem

Infelizmente, como seres humanos, temos uma enorme preocupação com algo que mexe muito com o nosso orgulho e egoísmo que é a nossa auto-imagem. Você já fez a simples pergunta: o que será que os outros pensam de mim? O que será que tal pessoa pensa a meu respeito? Somos terríveis neste aspecto, pois sempre queremos ter uma boa imagem diante das pessoas que reflete até mesmo na nossa carência.

A auto-imagem é a imagem que a pessoa tem de si mesmo e a imagem que ela quer passar para as pessoas. É uma grande presença de falsidade, a pessoa que esconde-se atrás de uma outra falsa por sentir vergonha daquilo que se é na verdade. Tem medo de conhecer-se e descobrir suas qualidades e defeitos, e tem medo de mostrar-se no que se é, por querer conservar uma boa fama. Um exemplo claro disso: uma pessoa tímida não se aceita, não se conhece, tem medo de ser sua essência para querer manter uma imagem de “santo” (que o leitor não entenda isso como uma crítica). Uma coisa é ter domínio de si, outra coisa é esconder-se. Deturpamos a nossa imagem até mesmo com aquilo que as pessoas falam de nós mesmos ou até de outras pessoas, nos comparando com elas, e assumimos para nós uma imagem diferente daquilo que é nossa verdadeira face diante de Deus, diante daquela imagem verdadeira que Deus nos deu e quer que nós sejamos para o mundo.

Nesta questão de auto-imagem, a pessoa se depara com duas realidades: o conhecer-se e o deixar ser conhecido. Dentro desse conhecer-se está a auto-aceitação, seu sexo, seu corpo, sua história, seus defeitos, suas qualidades, pecados, tendências, reações, necessidades, dentre outras coisas. Quanto ao deixar ser conhecido, está a não preocupação com aquilo que pensam, sentindo medo de ser autêntico diante das pessoas, embora também dependerá muito até da maturidade e santidade do outro em respeitar a pessoa no seu íntegro, amando-a no seu jeito de ser, pois quem não tem pecados e/ou defeitos?(Jo 8, 1 – 11).

Vamos analisar Jesus: o mesmo que disse “Pedro, tu és pedra” (Mt 16, 18), disse no mesmo capítulo, alguns versículos após que ele era satanás e que se afastasse dEle (v. 23). Esse ser verdadeiro de Jesus encanta qualquer um. Poderíamos chamar Jesus de grosso mas na sua Verdade libertou Pedro da maquinação de satanás que, por trás, queria interromper o plano salvífico do Pai, pois a Verdade liberta (Jo 8, 32). Imagina se Jesus não aceitasse o seu Ser verdadeiro e por respeito humano não fizesse isso querendo se passar de bonzinho perante Pedro e os apóstolos?

A primeira coisa que temos que identificar dentro de nós somos nós mesmos. Quem sou eu? Qual é minha história? É o que diz o filósofo Sócrates: “Conhece-te ti mesmo”. É um penetrar nas profundezas de nossa humanidade e reconhecer-se da forma que somos. Há um santo que diz que só é plenamente santo aquele que é plenamente homem, ou seja, aquele que se aceita, aquele que não tem medo de reconhecer-se pecador, mas dotado de dons, aceitando-se, lutando por mudar aquilo que está em desequilíbrio.

Muitas vezes lutamos por mudar algo em nós, mas não sabemos que é qualidade, e temos como defeito. É um talento que por não nos conhecermos no coração de Deus, buscamos “copiar” das outras pessoas o que na verdade não somos, é o que chamamos de máscaras. Aí entra a questão de nos conhecer, pois se nos conhecemos autênticos diante de Deus, todos os rótulos que as pessoas trazem de nós não terão peso, pois o nosso coração estará ciente daquilo que é beleza de Deus em nós, mesmo que por inveja ou outro sentimento faça com que o outro não nos aceite. O talento, o dom é aquilo que Deus nos dá para que no coração das pessoas gere vida, gere fruto para uma vida de santidade para com Deus e para com os irmãos. Mesmo que algumas pessoas se sintam incomodadas com aquilo que somos, não devemos nos preocupar com isso, pois a maturidade está em reconhecer-se, em aceitar-se, em ser autêntico, verdadeiro, pois aqueles que se sentem incomodadas tem sinal de imaturidade nesta mesma área, pois não se conhecem, não se aceitam e não tem capacidade de reconhecer as qualidades do outro (por talvez uma simples inveja).

Há algo por exemplo que dentro de mim que eu não aceitava que era o meu ser fraterno. Antes, me escondia dentro de um jovem acanhado, tímido, silencioso, principalmente diante das autoridades da Igreja ou da RCC para que eles tivessem uma imagem de um jovem bom, íntegro, que no fundo buscava status. Hoje, desfazendo-me do outro e sendo eu mesmo, vejo a diferença, de um jovem que vai atrás, que dá passos, que busca estar junto, conviver, brincar, partilhar, um jovem que está no coração de Deus, e nisto eu comecei a perceber em mim o que necessita na verdade de ser mudado. Concluí que só saberemos na verdade dar passos para nossa conversão e nossa santificação quando nos dispormos a sermos aquilo que somos, e diante disso buscar nivelar os desequilíbrios.

Esta questão de auto-imagem é necessário que tenhamos conhecimento, pois até nossa saúde está em jogo. Eu me preocupava tanto com o que as pessoas poderiam pensar de mim, e isso me causava uma angústia tão grande que me deixou um desagradável problema de saúde: gastrite. Durante dois anos comecei a sofrer de acidez e dores de estômago, e só depois que foi perceber de onde vinha, pois fazia o tratamento e nada de melhora.

Diante daquilo que Deus colocava em meu coração e dos atendimentos com um diretor espiritual, vi que minha preocupação com a auto-imagem me trazia estes transtornos, pois me preocupava muito com o que alguns pensavam e falavam de mim (por não me conhecerem ou por não perceberem que o meu jeito de ser refletia algo nestas pessoas), e caía numa auto-condenação e não aceitação de mim mesmo que era terrível, fora que em pequenas atitudes eu me condenava ao extremo. Se a pessoa me tratasse diferente, já achava que ela estava pensando mal de mim, sem buscar até mesmo entender o que a pessoa estava vivendo naquele dia. Coisas bobas que fazia tempestade em copo de água. É típico de uma pessoa que se preocupa com sua auto-imagem, pois por sempre querermos passar uma imagem boa de nós mesmos para as pessoas, até mesmo no sentido de perfeccionismo.

Deus fez uma obra de transformação muito grande em mim, pois Deus mudou tudo isso, e também com minha luta de renunciar essa preocupação com auto-imagem, meu estômago voltou ao normal, e toda vez que volto a me preocupar com isso, volta tudo de novo. É uma luta para mim, e creio que para todos, pois nosso egoísmo faz com que pensemos em nós mesmos, e não temos humildade o bastante para reconhecermos quem somos nós.

Humildade é reconhecermos o que somos e o que Deus é em nós, por isso não podemos negar nossos dons, pois o inimigo muitas vezes usa das pessoas para abafá-los, e é preciso que nós saibamos que seremos cobrados por Deus por aquilo que nossos dons multiplicaram, que são nossos talentos (Mt 25, 14 – 30). Mesmo que meus talentos não faça com que algumas pessoas se sintam bem, precisamos assumí-los, não nos preocupando com nossa imagem diante dos outros ou de nós mesmos, mas diante de Deus. Não podemos agradar a todos. Nem Jesus agradou a todos, mas agradou ao Pai. Esta deve ser também a nossa meta, agradarmos ao Pai. Aí está o segredo da compreensão. Cada pessoa é um mistério, e cabe a nós conhecermos e conhecer o mistério que é o outro, respeitando-o e amando da maneira que o outro é, mesmo que eu não agüente o seu jeito.

Não podemos nos preocupar com o que os outros pensam de nós quando conhecemos verdadeiramente aquilo que somos diante de Deus. Algo que tem me dado uma tranqüilidade muito grande até mesmo diante do que os outros possam pesar ou aquilo que eu julgo que as pessoas pensam de mim é a frase que tive enquanto rezava diante de umas situações que vivia: “Deus é justo, e no céu tudo de resolve”. E é isso mesmo, mesmo que as pessoas não me aceitem, eu preciso me aceitar sendo aquilo que Deus é em mim, não me preocupando em fazer justiça com minhas próprias mãos, buscando mostrar uma imagem boa para as pessoas de mim mesmo, mas sendo o que sou em Deus diante dos irmãos. “Deus é justo, e no céu tudo de resolve”.

Deus quer que busquemos a cura da imagem que temos de nós mesmos e quer a transformação do nosso orgulho em querer endeusarmo-nos com uma imagem perfeita, deixando cair todas as máscaras para que Ele tenha total liberdade de agir em nosso coração para um caminho de santidade.