Artistas ou arteiros

Parece cada vez mais impositiva a guerra pela audiência das emissoras de TV brasileira. O circo televisivo pega fogo, na conquista da noite de Domingo, Estão na moda os programas Casa dos Artistas (SBT) e Big Brother (Globo) que confinam um grupo de pessoas para serem observadas constantemente, até mesmo 24 horas, pelos telespectadores, que as julgam pelas atitudes realizadas no interior do recinto.

O grande dilema é saber se as ações e reações mostradas na tela são reais ou fabricadas para aumentar a audiência. Há uma ação ou encenação, espontânea ou programada da identidade, fraqueza ou instinto dos personagens. É o contrário do que aconteceu no filme O Show de Truman, de Peter Weie, cujo protagonista não tinha consciência de estar sendo filmado 24 horas por dia.

O fato é que o público julga e decide sobre a permanência de um ou de outro personagem, que é totalmente despido (no pensar, no sentir, no agir) diante das câmeras, estrategicamente colocadas em todos os lugares do ambiente. O povo é juiz, o árbitro de atitudes. Esses programas são semelhantes àquele outro chamado Você Decide, onde o final era escolhido de acordo com a moral popular, com a maioria definindo o correto, o modo de agir dos atores.

O grande problema disso tudo é que o critério de verdade é a opinião do telespectador e não a verdade por si mesma, que tem seu valor por si só. A maioria dos que assistem e telefonam é que elege o juízo de valor sobre determinada pessoa ou situação. Portanto, não existe moral concreta, objetiva, mas determinada a partir dos gostos e sabores de quem vota. Como pergunta José Tavares de Barros, Vice-Presidente da OCIC (Organização Católica Internacional de Cinema), falando a respeito desta programação: como separar o que toca simplesmente aos sentidos e tudo que, realmente, interessa às consciências?

Ora, essas chamadas pesquisas ao radiouvinte e ao telespectador não possuem base científica, porque não condizem com a opinião da grande maioria. Nem todos têm TV, nem todos têm telefone, nem todos estão ligados no programa, nem todos têm vontade de interagir.

O Brasil possui 35 milhões de residências com TV. Destas, 10 milhões possuem dois televisores. Se calculamos 2 a 3 telespectadores por residência, teremos um público televisivo em potencial de 120 milhões dos 180 existentes no país. Porém, os telejornais chegam a 45 milhões de telespectadores e esses programas não passam disso. Portanto, a maioria não assiste, não telefona, não opina. Alémdo mais, a maioria nunca foi critério de verdade. Foi a maioria justamente que, um dia, gritou a favor da Crucificação de Jesus.

Padre Gerson Schmidt
E-mail: perpetuo@catolico.com.br
Fonte: Jornal Versão Semanal, da Arquidiocese de Porto Alegre,
Edição de 7 a 13 de março/2002