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Caminhos da esperança

Esperança: a virtude essencial para a dignidade humana

“A esperança é a última que morre”, eis um ditado popular muito repetido em diferentes circunstâncias. Mas a esperança não pode morrer nunca. Ela é uma virtude, luz luzente em horizontes tomados por obscuridades e variados desafios. A esperança possibilita ao ser humano encontrar as respostas de que necessita para viver com mais dignidade. Assim, a esperança deve ser sempre fortalecida, pois, sem ela, a família humana sofre com o caos, na contramão da razão, inviabilizando o alcance do sentido que sustenta o viver.

Cultivar a esperança exige abrir-se, sempre mais, à reconciliação e ao exercício da paciência – para que oportunidades de edificação da paz não sejam perdidas. É preciso saber esperar, e não desistir da busca por essas oportunidades, encontrando uma força que está além dos próprios recursos, enraizada na espiritualidade e na fé.

Caminhos da esperança

Crédito: FG Trade Latin / GettyImages

O caminho para a paz

A paz, para ser alcançada, precisa ser esperançada – alimentada na certeza de que o semelhante também tem necessidade e está na busca pela paz. Sem essa convicção, o ser humano torna-se, facilmente, contaminado pelo ódio e pelo anseio por vingança. Passa a agir, assim, na contramão do caminho para a paz. De fato, sem o amor, o amor maior que vem de Deus, a paz torna-se meta inalcançável, pois trata-se de componente essencial aos diálogos e à iluminação que vem da inteligência humana.

O amor é capaz de vencer o medo que paralisa e que desencadeia conflitos complexos, promovendo a escalada da violência que dizima vidas, nações, culturas. O temor e a mágoa no coração humano precisam ser tratados com o amor de Deus, de incidência radicalmente restauradora.

A partir do amor, o ser humano se qualifica para fraternalmente se aproximar de seu semelhante. E lembra o Papa Francisco, em preciosa indicação: a cultura do encontro tem o poder de romper com o tom destrutivo da cultura da ameaça. Ameaças são capazes de amedrontar e inspirar respostas odiosas, sangrentas, que negam o sentido da fraternidade universal.

Abrindo caminhos para o bem

Em direção oposta, a cultura do encontro possibilita diálogos e entendimentos pela indispensável experiência de colocar-se no lugar do outro, particularmente daquele que é pobre, vulnerável, inocente e indefeso. A dinâmica de colocar-se no lugar do semelhante alarga horizontes. É investimento humanístico indispensável e inigualável para encontrar caminhos de esperança.

Fechar-se nos horizontes estreitados por ideologias, por sentimentos mesquinhos e egoístas, impossibilita trilhar o caminho da paz, pois é atitude que distancia o ser humano da esperança. Inscreve-se, pois, como estação importante investir nos gestos de reconciliação, para debelar o ódio, acabar com distanciamentos ou com a disponibilidade para estabelecer inimizades.

Um compromisso com a paz e a fraternidade universal

Esperançar a paz é, pois, um compromisso cidadão e de fé muito relevante. Esse compromisso exige a revisão do próprio comportamento. O comportamento humano há de ser balizado por uma qualidade espiritual e humanística que se expressa a partir da competência para dialogar e bem exercer a solidariedade, fecundando de paz as páginas do cotidiano de cada pessoa – consequentemente, da sociedade.

Trata-se de uma urgência, especialmente quando são considerados os muitos cenários de guerra no mundo contemporâneo, gerando perdas irreversíveis – de vidas humanas e de dons da Criação, com mapas dolorosos marcados pela fome e pela exclusão social. A sensibilidade para dialogar e bem exercer a solidariedade alimenta sabedorias essenciais ao equilíbrio sociopolítico.

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Cultivar a esperança, sabendo se colocar no lugar do outro, exige o compromisso de lutar para que sejam mudados os cenários que desrespeitam a dignidade humana, privando muitos homens e mulheres, crianças e idosos do direito à autonomia social e política. Ferindo ainda o direito à liberdade religiosa, em razão de conflitos civis, internacionais, com gente desalmada regendo processos e tomando decisões. As guerras, frequentemente, são consequências da falta de respeito em relação às diferenças do semelhante.

Os caminhos de esperança são percorridos quando se procura exercer a fraternidade, alimentando diálogos, construindo relações de confiança. Diálogos que não são, simplesmente, exercício de diplomacia. Constituem investimento daqueles que se inserem no mundo para atuar como artesãos da paz.

Conversão ecológica: um caminho de esperança para a preservação do planeta

A partir da celebração da memória de São Francisco de Assis, tenhamos presente que a conversão ecológica, uma urgência, é também caminho de esperança. O modo abusivo que caracteriza a relação da humanidade com a natureza já traz sintomas amargos, como a escassez de chuvas ou, ao contrário, as graves enchentes. O ser humano tem sido muito despótico no tratamento da Criação, agindo de modo infiel a Deus, sem respeitar a tarefa de bem exercer a regência de toda a obra do Criador.

Falta à humanidade uma sabedoria engolida pela ambição desmedida e pelos estilos de vida esbanjadores. Verifica-se que a hostilidade presente na relação com o semelhante também se repete no tratamento com o planeta. É preciso reconciliar-se com o próximo e com a Criação, pela escuta e contemplação do mundo. Assim, reaprender a fazer da Terra uma casa comum, onde todos podem habitar harmoniosa e dignamente.

A preservação da vida de todos precisa de uma conversão integral, transformando relações, tendo o Criador como referência – fonte única e inesgotável do amor que tudo modifica na ótica do bem. Eis o convite para se trilhar em caminhos de esperança.

 

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte