A próxima quinta-feira, 30 de maio, será a festa do Corpo de Deus, como de costume. Mas neste ano vai se revestir de significado especial. E se tornará símbolo de um processo importante para o povo brasileiro. Neste dia será lançado o mutirão nacional para a superação da miséria e da fome em nosso país.
Celebrando o pão descido do céu, somos convocados a garantir para todos os brasileiros o pão nosso de cada dia. Em sua última assembléia, os bispos do Brasil identificaram as Exigências Evangélicas e éticas para a superação da miséria e da fome. Superar a miséria e a fome não é plano facultativo, nem projeto opcional de um governo. E exigência que decorre, tanto do Evangelho, como da responsabilidade cívica.
A preocupação com a situação das multidões, junto com o gesto de partilha do pão, convoca para a coerência da fé e para o compromisso político. O lançamento deste mutirão nacional se reveste de força simbólica de sacramento. Sua intenção é suscitar um processo permanente.
Em primeiro lugar, se define como nacional. Isto é, recoloca a importância da nação. Se queremos preservar nossa dignidade de povo, não podemos desistir de sermos uma nação. Descurar a dimensão nacional é preterir as urgências do povo e o atendimento de suas necessidades, para dar lugar às ambições do mercado. E abandonar o rebanho à sanha dos lobos predadores, que só se interessam pelos lucros, que em primeiro lugar são expressão do desvio dos recursos de suas verdadeiras finalidades.
Diante da multidão, é preciso ter os mesmos sentimentos de Cristo, e a mesma urgência. Tenho compaixão deste povo. A prioridade indiscutível, e direcionadora da solução de todos os outros problemas, é a fome do povo. Para superá-la, é preciso colocar em ação toda uma dinâmica, todo um mutirão de ações, que o Evangelho da Eucaristia nos ensina com perspicácia e praticidade.
Em primeiro lugar, coloca o problema sob nossa responsabilidade, sem permitir subterfúgios ou desculpas. Dai-lhes vós mesmos de comer. A superação da miséria e da fome está ao nosso alcance. Mas é preciso ter um projeto e uma disposição prévia. Jesus tomou as providências para organizar o povo. Antes de pedir aos discípulos que distribuíssem o pão, ordenou-lhes que dividissem as pessoas em grupos. Como a farinha precisa passar de massa a pão, os cidadãos precisam passar de massa a povo. Só assim haverá pão para todos.
É interessante que a liturgia do lançamento deste mutirão nacional tem um estribilho que volta com insistência: não só de pão vive o homem. Isto é, não basta matar a fome. Pois ela volta, e a miséria pode até aumentar se as pessoas ficam desincumbidas de assumirem suas próprias responsabilidades.
Por isto, é preciso estar atentos a todas as lições deste Evangelho. Ele ensina a importância da confiança e da simplicidade, espelhada na figura do menino, que no meio da multidão não teve receio de mostrar os poucos pães que tinha, e que serviram de matéria para o milagre da multiplicação. São os simples que desencadeiam a solidariedade. E urgente recuperar a simplicidade e a sobriedade de vida. Em seguida, Cristo urgiu a partilha. Ele mesmo a simbolizou, fracionando os pães, para mostrar que deviam ser repartidos entre muitos. Mas a partilha precisa de critérios e de organização. Ele ordenou, então, aos apóstolos que distribuíssem o pão entre os grupos já organizados. Para superar a miséria, há o claro desafio de saber como e a quem repartir o pão, para evitar as explorações e a reprodução da miséria. E por fim, Jesus ordenou que recolhessem as sobras. Não pode haver esbanjamento. O alimento é sagrado, e não pode ser desperdiçado. A superação da fome exige atenção plena e constante.
Neste ano de eleições todos acham que o Dia D é seis de outubro. Pode não ser. Depende do que aprendermos neste dia 30 de maio. Ele vem antes. E mais Decisivo do que o seis de outubro. Sem superar a miséria e a fome de nada valem as eleições. Elas também precisariam ser decorrência coerente e prática deste mutirão nacional.
Dom Luiz Demétrio Valentini
Bispo da Diocese de Jales SP
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