O Concílio Vaticano II ensina que a “eucaristia é fonte e ápice da vida cristã” (LG 11). Por essa centralidade, todo católico é chamado a celebrar o inestimável dom da presença real de Jesus na Eucaristia a cada domingo pelo menos; e, especialmente, na festa de Corpus Christi, o fiel é convidado a manifestar publicamente seu amor a Jesus Eucarístico. Considerando isso, nesta breve reflexão, intentamos apresentar a relevância pública da solenidade de Corpus Christi e, ao mesmo tempo, lembrar a importância da disposição interior do coração que se encontra com o Senhor Eucarístico na adoração e contemplação.

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A solenidade do Corpo e Sangue de Cristo tem origem no século XIII, quando foi instituída liturgicamente pelo Papa Urbano IV(1262-1264). Por detrás dessa instituição, existe a história de um grande milagre. Em suma, tal milagre se deu com um sacerdote que nutria dúvidas acerca da presença real de Cristo no pão consagrado. Aconteceu que, enquanto ele celebrava a missa e era invadido por uma grande dúvida, no momento da consagração, testemunhou um grande milagre: aquela hóstia sagrada transformou-se numa carne viva, a ponto de até respingar sangue e manchar o sanguíneo e o corporal.
Tradicionalmente, prestamos um culto público ao Senhor ornamentando as ruas e caminhando
Tal atitude é mais que um costume salutar. Trata-se de uma atitude que pode ser remédio ante um mundo secularizado que, cada vez mais, perde o sentido do sagrado. Nesse sentido, na carta apostólica Dominicae cenae, São João Paulo II lembra o dever da Igreja de despertar o sentido do Sagrado da Eucaristia em meio a uma sociedade cada vez mais pluralista:
É preciso recordar isso sempre, sobretudo no nosso tempo, talvez, quando observamos uma tendência para cancelar a distinção entre o “sacrum” (Sagrado) e o “profanum” (profano), dada a geral e difundida tendência (pelo menos em certas partes) para a “dessacralização” de todas as coisas. Em tal conjuntura, a Igreja tem o particular dever de assegurar e corroborar o sacrum (sagrado) da Eucaristia. Na nossa sociedade pluralista, e muitas vezes deliberadamente secularizada, a fé viva da comunidade cristã — fé consciente também dos próprios direitos em relação a todos aqueles que não compartilham a mesma fé — garante a este sacrum o direito de cidadania. O dever de respeitar a fé de cada um é concomitante e correlativo ao direito natural e civil da liberdade de consciência e de religião (n. 8).
O culto público que realizamos nas celebrações deve corresponder uma profunda atitude interior de contemplação e adoração
Usando as palavras do Cardeal Cantalamessa, entendemos a importância da contemplação quando percebemos que dela depende não somente a qualidade da nossa vida de oração, mas também de toda a vida cristã, pois “como não existe ação humana que não brote de um pensamento, não existe uma virtude cristã que não brote da contemplação”. Além disso, “a contemplação é o caminho para passar da comunhão com Cristo, na missa, à imitação de Cristo na vida” (Cantalamessa, 1993, pp. 70-71).
Para concluir, ainda no âmbito da bela reflexão do cardeal, é preciso dizer que a contemplação é a atitude escatológica por excelência, pois é a única que vai perdurar por toda eternidade:
Contemplando Jesus no Sacramento do altar, realizamos a profecia feita quando Jesus morria na cruz: Olharão para aquele que transpassaram (Jo 19,37). Antes tal contemplação, é ela mesma, uma profecia porque antecipa aquilo que faremos por todo o sempre na Jerusalém celeste. É a atividade mais escatológica e profética que se pode cumprir na Igreja. No fim, não se imolará mais o cordeiro nem se comerá mais de sua carne. Não haverá mais consagração nem comunhão; só não cessará a contemplação do Cordeiro […]. É precisamente isso que os Santos farão no céu. Quando estamos diante do tabernáculo, já formamos um só coro com a Igreja de cima: eles na frente, e nós, por assim dizer, atrás do altar; eles na visão, nós na fé (Cantalamessa, 1993, p.84) .
Wilker Henrique Costa Fiuza
Membro da Comunidade Canção Nova desde 2008. Mestre em Teologia Sistemática (2023). Formado em Filosofia (2011). Professor na Faculdade Canção Nova (www.fcn.edu.br), casado e pai de dois filhos.