A cativante simplicidade do Papa Francisco
Os ecos do fecundo pontificado do Papa Francisco chamam a atenção do mundo – foram 12 anos com números impressionantes, que contemplam suas visitas a múltiplas realidades, publicações de documentos oficiais, audiências importantes, gestos inspiradores, convocação de assembleias e tantas outras realizações.

Créditos: Domínio Público
Um tempo novo e bonito iniciado por Francisco que, ao ser eleito, tinha 76 anos. Já se organizava para viver a emeritude quando assumiu o ministério de Papa. Um ciclo se abriu na sua vida e na história da Igreja. Seu sorriso largo e aberto surpreendeu, expressando a riqueza da simplicidade e da proximidade que encantaram o mundo. Não só encantaram, tornaram-se paradigma de uma Igreja pobre para os pobres.
Merece atenção e análises, a partir da observação de dados, a repercussão de sua morte, que causou comoção e revelou preciosidades sobre as semeaduras de Francisco. Seus gestos, seu jeito de ser, têm força de atração e de agregação. Cativaram pessoas dos mais diversificados perfis, com um tom de universalidade, rompendo fronteiras, oferecendo elementos fortes de compreensão da fé e do viver humano.
A rica herança de seu pontificado
Francisco inaugurou um jeito de ser autenticado pelos valores e parâmetros do Evangelho de seu Mestre e Senhor, Jesus, consolidando-se como discípulo exemplar. Uma inspiração tão singular que permite a cada pessoa compor e registrar a sua crônica sobre Francisco. Tornou-se modelo para os demais evangelizadores na Igreja Católica, com atitudes marcadas por determinação e leveza, corajosamente indo ao encontro de todos, em diferentes circunstâncias, especialmente ao encontro dos últimos e dos esquecidos da terra.
Um modelo existencial que ganha, cada vez mais, uma força profética, com propriedades para inibir qualquer tipo de pompa, desde as litúrgicas, incluindo aquelas marcadas pela indiferença e soberba. Francisco, com a sua vida, ensinou um jeito de ser que acolhe todos, sem distinção, privilegiando os fracos e os pobres. Um privilégio sem nenhuma conotação de discriminação. Ao contrário, as atitudes de Francisco inspiram a inclusão de todos, “uma Igreja para todos, todos, todos”, conforme costumava dizer.
A rica herança do pontificado de Francisco desconcerta ao exigir coerência daqueles que o admiram e o exaltam como referência. Uma coerência evangélica que não permite o risco de adotar apenas uma parte de sua herança – a admiração por Francisco não abre possibilidade para simplesmente eleger uma atitude, uma postura, um modo de pensar, desconsiderando as outras lições do Pontífice.
Exige uma constante busca pelo selo de autenticidade da fé cristã, fortalecendo-se pela admiração cultivada por Francisco, que habilmente expressou a força da profecia e da simplicidade, aquela que não deixa morrer a gratidão, a capacidade para perdoar e para reconciliar-se. Sua liberdade interior, ancorada na sua experiência de fé, impulsionada por sua formação jesuítica e fecundada pelas singularidades de seu pastoreio – consagrado na Igreja a serviço do Povo de Deus – projeta luzes na inegociável coerência entre o que se faz e o que se fala.
Sua voz continua a ecoar, sendo um exemplo para todos
A semeadura de Francisco contempla a devoção mariana, razão de sua determinação de ter seu sepulcro na casa da Mãe Maria, no antiquíssimo Santuário Mariano de Santa Maria Maior. Inclui as complexas abordagens sobre ecologia integral, com reflexões sobre os mais recentes avanços científicos e tecnológicos. O Pontífice, em sua semeadura, prioritariamente dedicou-se a ensinar sobre a leveza e a força transformadora do Evangelho de Jesus, iluminando o compromisso urgente da paz mundial.
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Sua voz, certamente, continua a ecoar, interpelando o mundo. E qualquer pessoa, ao expressar sua admiração por Francisco, se submete imediatamente a um juízo. Fazem com que olhares busquem checar seu fiel compromisso com a verdade, com a justiça, sem, absolutamente, descurar do inerente cultivo da misericórdia. Um compromisso que se efetiva no respeito à dignidade de toda pessoa, através do perdão e da reconciliação, sem direito a guardar mágoas, rancores e ingratidão. A abrangência do testemunho de Francisco causou incômodo em alguns e, lamentavelmente, até oposição, mas é semeadura tão rica que estreita qualquer possibilidade de ser erradicada.
O mundo é o campo da semeadura de Francisco
A Igreja Católica contemporânea tem, pois, um vasto campo semeado a cuidar para favorecer a floração e a colheita dos frutos. O mundo é o campo da semeadura de Francisco, pela indicação de caminhos para diálogos respeitosos, articulando os que divergem uns dos outros, na religião, na política, na cultura, no campo socioambiental. O carisma de Francisco promoveu marcas que não permitem guardá-lo em um tempo passado.
As marcas deixadas por seu pontificado desafiam a Igreja e a sociedade a investirem nas atitudes e nas escolhas coerentes com as lições do Papa Francisco. A herança do Pontífice é tão forte que não admite posturas disruptivas – é preciso avançar a partir de sua semeadura, sob pena de perdas grandes e irreparáveis, retrocessos capazes de esvaziar a beleza da simplicidade evangélica.
O horizonte inspirador do pontificado de Francisco tornou-se modelo por ser coerente com o Evangelho. Na sólida base formada pela fé cristã e pela tradição da Igreja, conta muito a atenção amorosa e humilde à semeadura de Francisco. Agora é hora decisiva na Igreja, para adequados discernimentos: o horizonte é o da espiritualidade orante, em obediência ao Espírito Santo.
Todos unidos na esperança por semeaduras qualificadas, exemplares como as de Francisco. Seus sapatos surrados, suas vestes simples, seus hábitos humildes, sua moradia, sua proximidade, seus ensinamentos interpelantes, sua abertura dialogal, sua espontaneidade, sua fidelidade evangélica, seu amor aos pobres, sua profecia audaciosa, sua liberdade interior e desapego exemplares, de homem pobre, emoldurem as novas semeaduras exigidas pelo mundo contemporâneo, capazes de ajudar a humanidade a aproximar-se do Reino de Deus. Floresçam as semeaduras de Francisco.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte