📚 Etimologia

Isidoro de Sevilha, Doutor da Igreja: um notável medieval da cultura latina

O pai dos concílios

Isidoro nasceu em uma família de proveniente de Cartagena, porém, logo se tornou órfão de pai. Cresceu e foi criado por seu irmão mais velho, Leandro – que o precedeu na cátedra de Sevilha. No início, ele não demonstrou ser um estudante tão aplicado, até que entendeu que a constância e a boa vontade podem levar um homem bem longe.

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Ao ler as obras de Santo Agostinho e São Gregório Magno, Isidoro tornou-se o homem mais instruído da sua época e, ao mesmo tempo, também um dos Bispos mais reconhecidos. Quando seu irmão, Leandro, faleceu, Isidoro, que já era clérigo em Sevilha, exerceu o episcopado em seu lugar. Durante trinta e seis anos, difundiu a doutrina contra as heresias do seu tempo – tal como o arianismo -, convertendo os visigodos, a ponto de até presidir importantes Concílios da Igreja, entre eles, o II Concílio de Sevilha, em 619 d. C., e o IV Concílio de Toledo, em 633. Por isso, ele ficou conhecido como o “Pai dos Concílios”. O Bispo Isidoro conferiu enorme importância à liturgia, encorajando o uso de hinos, cantos e orações, que constituíam o rito moçárabe, também chamado “Isidoriano”.

Suas obras

Isidoro de Sevilha é tido como um dos grandes representantes do renascimento cultural latino-cristão na medievalidade (Pierini,1997). No momento em que se iniciou a conquista árabe do Ocidente, a única produção de estirpe filosófica e teológica da cultura latina, desde o ano de 550 d.C., foi a de Isidoro de Sevilha. O período compreendido entre a morte de Teodorico e a sagração de Carlos Magno não produziu senão dois autores de envergadura que se dedicaram à cultura filosófica e teológica, o bispo Isidoro de Sevilha (c. 560-633) e o sacerdote de Nortúmbria, Beda (672-673/735 d.C.), chamado de “o Venerável”.

Dentre as obras de Isidoro de Sevilha, notadamente duas delas, as Etimologias, dedicadas ao rei visigodo Sisebut, em vinte volumes, trazem saberes amplos, inclusive, os sagrados, e as Sentenças – um manual de teologia dogmática, espiritual e moral – abasteceram culturalmente toda a Alta Idade Média. Isidoro de Sevilha, entretanto, não era filósofo propriamente dito e sua cultura filosófica se formou por derivação, vale dizer: o seu Aristóteles é o lógico, baseado nos elementos transmitidos por Cassiodoro; o seu conhecimento do estoicismo e da filosofia grega passa pelos Padres da Igreja, Lactâncio, Ambrósio e, sobretudo, Agostinho de Hipona.

A questão da origem das coisas através da Etimologia

As etimologias são, antes de tudo, definições, uma espécie de taxinomia. O propósito e classificar e inventariar tudo que seja de interesse para o conhecimento humano. E também dá destaque para a questão da origem das coisas, ou seja, a tese central de Isidoro de Sevilha é a de que se compreende melhor a natureza de uma coisa quando se conhece a natureza de seu nome. Esse procedimento, prefigurado no próprio título de uma de suas primeiras obras, qual seja, Diferenças de palavras, diferenças de coisas (Differentiae verborum et diffrentiae rerum) – vai das palavras às coisas. Assim, coloca-se em ação um método etiológico e heuremático, isto é, opera-se a busca das causas de invenção e caracterização dos primeiros inventores, tão caro aos gramáticos alexandrinos (Libera, 1998). Por influência de Isidoro de Sevilha, tal método reinará, em certos domínios, até mesmo a chegada do século XIII.

O conhecimento da natureza e a essência das coisas

As Etimologias ou Origens de Isidoro de Sevilha formam uma espécie de memento ou lembrança enciclopédica em vinte livros, aos quais esses dois títulos são bastante adequados. Ele assegura que a natureza e a própria essência das coisas são reconhecidas na etimologia dos nomes que as designam. Quando não se conhece a etimologia natural de um nome, sempre se pode inventar uma de propósito para as necessidades da causa. Não raro engenhosas, as etimologias de Isidoro de Sevilha serão transmitidas, de geração em geração, até o final da Idade Média (Gilson, 1995).

Aqui se tem o conteúdo dessa célebre enciclopédia: gramática e retórica e dialética; aritmética, geometria, astronomia e música, história universal da criação, os livros sagrados e os ofícios da Igreja, Deus, os anjos e os membros da Igreja, a Igreja, línguas, povos, Estados, famílias, dicionário, o homem, os animais, cosmografia, geografia, monumentos, vias de comunicação, petrografia, mineralogia, agricultura e horticultura, o exército, a guerra, os jogos, a marinha, o vestuário, alimentação, artes domésticas e instrumentos aratórios. A grandeza da obra se explica facilmente: os etimologistas ocupavam, numa biblioteca medieval, o mesmo lugar que as Enciclopédias têm numa biblioteca moderna. Era preciso consulta-las com muita frequência.

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Outras obras de Isidoro de Sevilha

Entretanto, a enorme contribuição cultural de Isidoro de Sevilha não ficou circunscrita às Etimologias ou Origens. Outras obras suas ajudavam a completar as informações mais sumárias que eram fornecidas em determinadas partes de sua memorável enciclopédia. O De fide catholica e o Setentiarum libri três eram manuais de densos conteúdos teológicos. Além disso, podia-se encontrar uma cosmografia em De ordine creaturarum, uma cosmografia e uma meteorologia em De natura rerum, uma história universal em Chronicon e uma história moderna em História dos reis godos vândalos.

Pode até causar alguma estranheza que um Bispo, que viveu entre os séculos VI e VII e escreveu tantos textos em latim, seja proposto como o padroeiro da Internet. Foi o que sucedeu durante o pontificado do Papa João Paulo II. Não obstante tenha faltado uma proclamação oficial, contudo, não deixou de ser um gesto de reconhecimento atribuído a um dos mais prolíficos Doutores da Igreja de todos os tempos.

Referências

GILSON, Etienne. A Filosofia na Idade Média. Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Marins Fontes, 1995. 949 p.

LIBERA, Alain de. A Filosofia Medieval. Tradução de Nicolás Nyimi Campanário e Yvone Maria de Campos Teixeira da Silva. São Paulo: Loyola, 1998. 532 p.

PIERINI, Franco. A Idade Média: curso de história da Igreja. São Paulo: Paulus, 1997. 228 p.

NOTÍCIAS DO VATICANO. Disponível em: https://www.vaticannews.va/pt/santo-do-dia/04/04/s–isidoro–bispo-de-sevilha-e-doutor-da-igreja-.html#. Acesso em: 29 mar. 2025.