As sétimas moradas do Castelo Interior da Alma
Após um grande percurso descrevendo cada uma das moradas que a alma passa em seu caminho espiritual rumo à intimidade com Deus, finalmente chegamos às moradas centrais, onde Deus habita: as sétimas moradas. Santa Teresa relata que isso só ocorre depois de uma tremenda purificação, semelhante à do purgatório, que gera na alma um grande desapego em relação às criaturas e a tudo que viveu até ali. Vimos essa purificação, à qual São João da Cruz chama de noite escura da alma, no artigo anterior.
As sétimas moradas se instauram com uma segunda visita de Jesus Cristo, que, por fim, desposa a alma em matrimônio espiritual. Essa visão ou revelação interior, também chamada de visão intelectual, ocorre sobre a Santíssima Trindade, revelando, assim, a natureza divina e indissolúvel de Deus, ao mesmo tempo em que se entende que são três pessoas distintas. Santa Teresa de Jesus relata que, o que sabemos pela fé, “vemos” agora pela alma. A venerável Conchita, do México, narra esse entendimento interior de forma semelhante ao dizer que percebia claramente o Pai, o Filho e o Espírito Santo e, embora fossem tão diferentes, eram um só.
Refúgio seguro
Essa união entre a alma e Deus, que até aqui ocorria ocasionalmente, agora é permanente. A partir desse momento, a alma permanece em união íntima com Deus, até que desaparece o fino véu da mortalidade, e ela pode estar com Deus face a face. Isso traz luz e paz perpétuas e realiza o que Jesus predisse no Evangelho: “Assim como tu, Pai, estás em mim e eu em ti, para que também eles estejam em nós” (Jo 17,21). Embora não faltem cruzes e tormentas, não existe inquietação e não se perde mais a paz interior.
Nessa morada central, em união com Deus, não se movem mais as potências e a imaginação e, embora ainda existam lutas e provações exteriores, o centro do castelo permanece imóvel como um refúgio seguro. Do mesmo modo, existe um grande desejo de padecer por Deus, mas com tranquilidade, paz e paciência de que aconteça segundo a vontade de Deus e na hora em que Ele determinar. Isso também traz um grande esquecimento de si mesmo, pois só importa e é importante o que for útil para Deus e para sua glória.
Santa Teresa não deixa de alertar que a atenção para não cair em pecado deve se manter viva em nós. Assim como Salomão recebeu dádivas como nenhum outro, ele também acabou as perdendo. Permanecer atento contra o pecado é fundamental e, como a união é constante, nas poucas vezes que Deus se ausenta é para que essa ausência relembre a alma seu verdadeiro ser e permaneça, assim, na humildade.
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Deus investe em nós para nos ajudar a sermos “outros Cristos”
De fato, quanto mais se revela a grandeza divina, mais a alma tem consciência de suas misérias interiores. Isso explica por que muitos santos não queriam “seus” milagres divulgados e atribuíam sua realização prontamente à intervenção de Deus. São Josemaría Escrivá, ao ouvir várias vezes o (agora também Santo) Papa Paulo VI, repetir numa audiência: “O senhor é um santo!”. Saiu extremamente cabisbaixo e sério, algo inusual para ele. Questionado sobre motivo de tal abatimento, o padre respondeu: “Cada vez que o santo padre me chamava de santo, vinha à minha mente todos os meus pecados. E como sou pecador!”. Baseado no que estamos vendo aqui, podemos afirmar que se tratava da percepção do santo sobre si mesmo e de sua miséria enquanto ser humano, nunca de pecados mortais ou, nem mesmo, de pecados veniais com plena advertência.
É, pois, na sétima morada, que fica claro a necessidade do caminho espiritual e o seu objetivo: Deus investe em nós para nos ajudar a sermos “outros Cristos”. Verdadeiros membros espirituais desse corpo místico, que é a Igreja em perfeita união com a cabeça. A extrema paz interior também ajuda a servir a Deus nas coisas possíveis, aquilo que está ao nosso alcance imediato, e não nas coisas impossíveis que acreditamos ser úteis para o projeto de Deus.
Isso mostra como os santos realizaram obras extraordinárias quando, na aparência, realizavam coisas absolutamente comuns: Santa Teresinha era somente uma irmãzinha de mais um Carmelo; São João Bosco não fazia mais que se dedicar aos cuidados básicos de jovens marginalizados; Santa Teresa de Calcutá nada fazia além de socorrer os enfermos e moribundos etc. Humildade e serviço, dobrando-se à vontade de Deus no imediato e no cotidiano, oferecendo sacrifícios interiores e exteriores na vida real. Tudo isso sem fogos de artifício nem caras contorcidas de dor.
Aqueles que alcançam as sétimas moradas fazem a santidade parecer trivial e fácil, como aquele que, após se encontrar no alto da montanha há algum tempo, não revela em seu rosto a dificuldade da escalada.
No próximo artigo, veremos os últimos graus de oração que completam e complementam esse percurso espiritual: o oitavo e o nono grau de oração.