Vida de família com filhos é sempre cheia de surpresas, ainda mais quando são quatro, como é meu caso
Cada dia é único! Entre risadas, barulho de criança correndo pela casa, bebê chorando, um “manhê, limpa meu bumbum” ou ainda um “manhê, fulano mostrou a língua pra mim” há sempre a alegria e o coração realizado por ter filhos crescendo e aprendendo os valores que passamos a eles a todo momento.
Foto: Wesley Almeida/cancaonova.com
Por sermos uma família com vários filhos, chamamos à atenção por onde passamos. Já escutei de tudo: “Nossa, são todos seus? Você é corajosa! Vai parar por aí, né?”. Bom, prefiro acreditar que somos um sinal de bênção para um mundo tão individualista. Papa Francisco, com muita ternura, enfatizou em uma audiência geral semanal: “As pessoas não deveriam ter medo de ter filhos, já que eles são a alegria dos pais e das famílias, geram harmonia entre as gerações e ajudam a alimentar a esperança”.
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Fazer opção por ter uma família é viver uma constante espera da ação de Deus e ser surpreendido, todos os dias, por esse amor que só transborda quando, de fato, colocamos Jesus no centro. Essa é a forma mais eficaz de combatermos o consumismo, o egoísmo e a falta de amor. Esse amor que nos faz entender, no dia a dia, que o mais importante são as pessoas e não as “coisas”, e que o mundo pode estar acabando lá fora, mas dentro da nossa casa estamos firmes, porque temos uns aos outros.
Características que contradizem a vida em família
Apesar de tudo, compreendo tais reações. Afinal, vivemos na sociedade do imediatismo, do supérfluo, do descartável. Sociedade em que as pessoas são formadas para não suportar o sofrimento ou a não se sacrificar pelo próximo, ou ainda a não renunciar aos sonhos e ao conforto. Características que contradizem a vida em família.
Realmente, ter filhos é exigente; porém, tudo depende da forma como levamos a vida. Muitas pessoas nos perguntam como conseguimos criar quatro filhos. Nós mesmos ficamos surpresos, no dia a dia, com esse ritmo frenético que vivemos, essa crise financeira e de valores que nossa sociedade vive. Assim, a única constatação que podemos chegar é que só pode ser resultado de nosso esforço e, principalmente, da graça de Deus.
Ao longo desses anos, fomos aprendendo com a experiência dentro de casa (errando muitas vezes) que algumas atitudes são determinantes.
Transmissão de valores
As crianças precisam sempre ter, bem claro, quais são os valores da família. Em casa, as regras precisam ser claras para que os filhos saibam como deve ser a conduta. Somos uma família católica, portanto, vivemos como católicos, participando das Missas, fazendo nossas orações, buscando as atitudes que Jesus teria.
Crianças agem por repetição e exemplo. Sabemos que precisamos conversar muito com cada um, de acordo com sua faixa etária; porém, precisamos falar e fazer. Quando temos atitudes que não condizem com aquilo que ensinamos, caímos no descrédito. Os filhos sempre esperam de nós atitudes coerentes. Não há como falar de honestidade se sustentamos, por exemplo, pequenas mentiras na frente das crianças.
Organização e trabalho em equipe
Tenho a certeza de que, sem o mínimo de organização, nossa casa seria um verdadeiro caos; e quanto mais nos disciplinamos e dividimos as tarefas (inclusive com as crianças), mais vamos adquirindo harmonia e a vida fica mais fácil. É possível contar com a ajuda de todos.
Algo muito eficaz é os filhos perceberem, primeiro, o companheirismo entre os pais. Isso faz com que eles assumam a casa e queiram fazer parte desse relacionamento de amor mútuo e concreto. Eles se motivam a contribuírem também com seus esforços. Graças a Deus, tenho um marido muito presente e ativo. Acredito que os meninos têm uma linda referência e, quando tiverem suas casas, repetirão com suas esposas o que o pai faz comigo.
O Filipe, de 2 anos, ajuda-me a arrumar a mesa do café, organiza a dispensa (do jeito dele) e guarda os brinquedos. Susana e Isabela (de 7 e 6 anos) me ajudam na cozinha, na limpeza da casa e na organização de suas coisas pessoais.
Precisamos treinar a paciência e investir, pois isso também é educação. No começo, dão um pouco de trabalho e tudo continua uma bagunça, mas, com o tempo, vão pegando o jeito e ajudando.
Outro ponto importante são os horários. A família precisa ter horários pré-estabelecidos. Como nos ensina o ditado popular, “o combinado não sai caro”. Por exemplo, ensinamos as crianças, desde cedo, a dormirem às oito e meia da noite. Após esse horário, o papai e a mamãe administram os afazeres da casa, a oração pessoal ou ainda lazer e momento a sós.
As crianças se sentem mais seguras quando há disciplina, a começar pelos pais. Claro que não podemos fazer de nossa casa um regime militar, porém, vale a pena fazer quadrinhos, conversar, dar recompensas pelo bom comportamento.
Em nossa família o trabalho é de equipe. Quando conseguimos deixar a casa limpa, tudo organizado e com a colaboração de todos, todo mundo ganha. Temos uma regra: não sair de casa com as coisas fora do lugar. Há dias que funciona, outros não; mas temos conseguido manter a casa com a ajuda de todos. Afinal, o trabalho é de equipe. E a casa é de todos.
Tempo com o filhos
Em tempos de tantas tecnologias, estar com os filhos com qualidade é um verdadeiro exercício. Deus tem movido meu coração a, quando estou com as crianças, deixar meu celular em um lugar que eu não tenha acesso fácil o tempo todo. Tenho feito esse exercício de conversar, querer saber o que está na cabecinha de cada um e deixar que eles sintam que estou ali por causa deles.
Esse tempo com os filhos tira a agitação que, muitas vezes, é causada pela nossa ausência, que nem sempre é física, mas pode ser de alma. E isso é muito sério. Quando lhes damos nosso tempo, eles se aproximam de nós e passam a assimilar melhor, inclusive os valores que queremos passar. É nesse tempo dispensado a eles que se tornam apaixonados por nós. Quer que seu filho o admire? Esteja com ele como se estivesse apaixonado pela primeira vez, mas agora é por seu filho.
Optar pelo simples
Muitas vezes, é necessário optar pelo necessário (e as crianças aprendem que a felicidade não está no “ter coisas”). Nesse começo de ano, entre todas as coisas que tínhamos que comprar para as crianças, a Susana (7) precisava de um tênis; porém, vimos que este só poderia entrar no orçamento mais para frente. Eu, como mãe, claro, fiquei com o coração apertado.
Passado um mês, a Susana começou a ir para a escola com o tênis velhinho, até que, um dia, surgiu uma promoção em uma loja em que os preços caíram muito. Compramos um tênis lindo para ela de surpresa! Quando chegou da escola, eu estava muito feliz e queria que ela o calçasse logo. Parecia que o tênis era para mim. Nessa hora, minha filha, como sempre dócil, disse-me: “Está vendo, mamãe, a gente precisa sempre esperar. No momento certo, Deus manda”. A felicidade por ver a minha filha com o tênis novo se transformou em gratidão pelo entendimento que ela teve da Providência de Deus.
Optar por uma vida simples e não sermos escravos de um consumismo desenfreado não é ruim. Pelo contrário, é bom! Nossos filhos não são menos felizes por não usarem roupas caras ou porque não têm os brinquedos da moda. Eles, aos poucos, estão assimilando que o importante é a qualidade, e também a administrar de forma correta o dinheiro da família. Ser feliz é termos uns aos outros. A maior felicidade está no ser e não no ter. Isso não é algo que dá para fazer as crianças “engolirem” se nós pais não vivemos. Se seu filho percebe que o centro de sua família é o consumismo que a mídia impõe, ele pode se tornar um adulto refém dessa falsa felicidade. Se ele percebe que o centro é Jesus, ele será um adulto livre de toda imposição que a sociedade sofre por essa necessidade do “ter”. Quando simplificamos a vida, tudo fica mais fácil, inclusive criar filhos, pois o pouco já nos faz feliz. Mesmo que não seja fácil, com a graça de Deus e exemplos dentro de casa, é possível.
Não tenha medo de ter a casa cheia. Ter filhos é uma maravilhosa aventura que nossa sociedade tem esquecido.
O Papa Francisco, em uma de suas audiências, frisou ainda que “as crianças não são um problema de biologia reprodutiva, nem um dos tantos modos de se realizar. Tão pouco uma posse dos pais. Não! Os filhos são um dom, são um presente”. Não tenha medo de ter a casa cheia. Ter filhos é uma maravilhosa aventura que nossa sociedade tem esquecido. Sejamos sinal de amor e generosidade a partir de nossas famílias e da abertura à vida. É possível! Não é fardo! É dom e alegria!
Elzirene Pereira
Jornalista e Missionária da Comunidade Canção Nova
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