A inesperada despedida

O que me leva prostrado e contrito a descrever o que meu coração relata sobre a passagem de padre Léo é algo que jamais estaria em minha vontade de fazê-lo e, muito menos, queria que essa oportunidade se me fizesse urgir o ato. Bastavam de sobra, os motivos que tenho de sentir-me inquieto, machucado, ainda consternado e pesaroso pela passagem de minha filha, a inesquecível Dayane, que no momento em que escrevo este, completa quatro anos de sua ausência entre nós. Vêm-me, ainda, a inesperada despedida do tão consagrado homem de Deus, que é padre Léo.

Aliás, algumas “Deuscidências” podem ser lembradas entre os dois. Alguns exemplos: padre Léo nasceu no dia 09 do mês 10. A “Day” nasceu no dia 10 do mês 09. Ambos morreram de câncer. A morte os buscou no silêncio da noite, em São Paulo. Os dois permaneceram em tratamento por dez meses e alguns dias. Padre Léo nos deixa no auge de seu ministério sacerdotal realizado em apenas dezessete anos. A “Day” nos deixou no auge de sua angelical adolescência com seus dezessete anos.

Não creio, como alguns assim pensam, que no céu estejam dormindo os que para lá tiveram a felicidade de sua última morada. Creio que a Bíblia, ao tratar ao descanso ou sono dos justos, não tenha se referido ao sono que imaginamos igual ao de nosso corpo, pelo contrário, os que atingiram a benemerência de poder gozar da glória celestial, não teriam tempo para dormir diante de Deus. O descanso da alma é deleite de estar nos braços do Pai, compensando todas as dores e atribulações que vivenciaram aqui na terra.

O apóstolo Paulo, quando transladado para o terceiro céu, descreve numa de suas cartas que, “jamais os nossos sentidos podem sentir ou nossa mente, sequer, imaginar, o que Deus reservou para aqueles que, aqui na terra, o amaram e o serviram”. Não contraditando o apóstolo, é claro que devemos ter a certeza de que estaremos de olhos bem abertos para poder contemplar o Pai.

Assim sendo, permita meu Deus, sob o consolo que nos sustenta, ter a liberdade de imaginar o padre Léo, como também tantos outros com quem convivemos e que sabemos estar no seio de Abraão, contemplando a festa esfuziante preparada para o recebimento deste apóstolo da palavra e do amor ao próximo, que tanto nos motivou.

Amado pelas pessoas mais brilhantes de todas as colorações religiosas, padre Léo é uma dessas criaturas divinas que nasceram para ter vida curta, visto que, em pouco tempo, fez tudo que era necessário para atingir a bem-aventurança eterna. Fez em dezessete anos, o que muitos de nós, juntos, não faremos em toda nossa vida.

Por ter sido usuário de drogas em sua adolescência, conheceu os dissabores que elas provocam. Teve um avassalador encontro com Deus, quando, então, nasceu sua vocação, ainda que tardia, para o sacerdócio. Espírito inquieto, inteligência brilhante, visão inspiradora no que tange a ajuda a seus semelhantes, principalmente os mais alijados e segregados pela sociedade, criou a Comunidade Bethânia, onde se juntam aidéticos, dependentes químicos, abandonados de rua, prostitutas e pessoas com depressão profunda.

A todos, o tratamento era dispensado com o maior carinho e acompanhado de alimentação espiritual da qual ele mesmo fazia questão de ser o gestor. Ninguém paga um centavo pelo tratamento.

Dedicado, exaustivamente, ao trabalho apostólico, publicou sete livros, entre os quais, o último: “Buscai as coisas do Alto”, que escreveu durante os dez meses de seu calvário, lutando contra o câncer. Era pregador na Comunidade Canção Nova, fundada pelo padre Jonas. Era também, uma das maiores expressões do movimento da Renovação Carismática Católica, do qual foi orientador espiritual.

Proferiu palestras nos Estados Unidos, Portugal, Alemanha, China e tantos outros países, sem contar as inúmeras cidades brasileiras que tiveram a graça de sua presença, como a nossa Dourados(MS), por três vezes.

Vocacionado pelo evangelismo e não por doutrinas religiosas, o padre, colocava sempre Deus acima de tudo, principalmente, acima de si próprio.

A despedida, mais do que inesperada dele, me fez pensar e refletir muito sobre nossa vida humana e a maneira como poderemos ser chamados por Deus para iniciarmos a verdadeira vida. Nas minhas conclusões, veio-me este pensamento: “Muitos são os atletas que sabem o momento em que devem parar sua atividade. Quando o fazem, sempre escolhem o momento em que estão no auge de sua forma, glória e fama”.

Pude compreender que Deus também escolhe os seus eleitos quando eles atingem o máximo de aproveitamento em suas vidas.

Feliz é a nação cujo Deus é o Senhor!


Dayane Silva

DAYANE SILVA PEREIRA – ]Dayane Silva Pereira, 29 anos, é missionária na Comunidade Canção Nova. Bacharel em Comunicação Social com ênfase em Jornalismo pela Universidade Federal de Viçosa e pós-graduada em Marketing Digital pela UNIFAGOC. Atua também no Ministério Jovens Canção Nova, onde busca viver com alegria, ousadia e parresia o legado que o Padre Jonas deixou. Instagram: @daysilva_cn