Dom Alberto Taveira Corrêa

O mundo e a Igreja

A luz do Evangelho é o que existe de melhor para o mundo

A Igreja de Jesus Cristo saiu, literalmente, à praça pública, no dia da canonização de São João XXIII e São João Paulo II, dois Papas de nossa geração, testemunhas das muitas vicissitudes e alegrias do tempo desafiador e maravilhoso em que nos encontramos. Quem acompanhou pessoalmente ou pelos meios de comunicação pôde conferir a diversidade de culturas, línguas e povos ali representados. Chamava à atenção o fato de que chefes de Estado e de Governo compartilhavam espaço e emoção com a multidão presente em Roma. As várias confissões cristãs, representantes de outras religiões e pessoas de convicções diferentes… Um mundo inteiro se sentia atraído por duas figuras ímpares quanto à missão exercida a seu tempo e quanto à têmpera de seu modo de ser homens e cristãos.

O mundo e a Igreja

Papa Francisco salientou, em sua homilia da Missa da Festa da Divina Misericórdia, que João XXIII e João Paulo II não tiveram medo de se defrontar com as chagas do mundo e de sua geração. João XXIII quis abrir as janelas da Igreja para que o sopro do Espírito se espalhasse, a fim de alcançar todos os homens e mulheres. João Paulo II, o missionário mais ardoroso de que temos conhecimento nos últimos tempos, além de todo o empenho pela Evangelização, foi ao encontro das pessoas, conversou com todos, não fugiu das situações mais dolorosas da Igreja e do mundo. É que os cristãos se encontram dentro das realidades do mundo, são passíveis de erros e pecados, podem colocar tudo a perder, se não é a graça de Deus que os acompanha e sustenta.

A chave que abre as portas da esperança e da felicidade é, justamente, o reconhecimento simultâneo das fragilidades humanas e da força de Deus. Aquele que pode abrir o livro da vida das pessoas e da história humana é Jesus Cristo, o Cordeiro Imolado, o Santo de Deus. Só Ele tira o pecado do mundo (Cf. Ap 5, 1-8). Como Deus não nos fez para amassar barro na maldade e no egoísmo, o desejo de ser puros e santos atrai a todos. Por isso, apresentar a Boa Nova de Jesus Cristo, malgrado todos os pecados do mundo, é a estrada mestra para todos, sem exceção. Cabe à Igreja ter a ousadia de apontar para frente e para o alto, fazendo tudo para que o maior número possível de pessoas se envolva nesta grande marcha rumo à perfeição das relações das pessoas com Deus e entre si. Por isso, tantos irmãos e irmãs são inscritos no catálogo dos santos, reconhecidos como modelos no seguimento de Jesus.

As imagens do dia da Divina Misericórdia eram suficientemente eloquentes para nos convencermos de que a Igreja tem uma palavra e um testemunho a oferecer ao mundo. Trata-se de sua missão, na qual não pode se omitir. Ela deve ser anunciadora da verdade e lutar pela dignidade das pessoas, assim como há de mostrar que o melhor para todos é o amor ao próximo e o amor a Deus. Ao mostrar este caminho, que tem o nome de santidade, a Igreja e os cristãos aprenderão a se confrontar com as realidades humanas, inclusive quando as diferenças vêm à tona. E o diálogo entre diferentes começa com a valorização recíproca, que comporta superação de julgamentos e preconceitos. Acreditar no bem que existe no outro, seja qual for sua origem, idade ou prática religiosa, é um passo fundamental. Convergem na direção do bem as pessoas que apostam tudo nas próprias convicções e, ao mesmo tempo, se abrem para o bem que existe em quem procede de outras plagas.

As pessoas com quem dialogamos venham também a ter conhecimento de que temos algo a oferecer. Não somos incapazes quanto à humanidade e a cultura. A luz do Evangelho é o que existe de melhor para o mundo. Nada de omissão. Sejam, pois, superados os eventuais complexos de inferioridade com os quais muitos cristãos se apresentam diante das estruturas do mundo. Cresça a presença qualificada dos cristãos nos diversos campos profissionais. Amadureça sua capacidade de dar razão da esperança, segundo o caminho proposto pelo Apóstolo São Pedro: “Se tiverdes que sofrer por causa da justiça, felizes de vós! Não tenhais medo de suas intimidações, nem vos deixeis perturbar. Antes, declarai santo, em vossos corações, o Senhor Jesus Cristo e estai sempre prontos a dar a razão da vossa esperança a todo aquele que a pedir. Fazei-o, porém, com mansidão e respeito e com boa consciência” (1Pd 3,14-16).

A aventura da santidade se tornou mais atraente ainda com São João XXIII e São João Paulo II. Mas o que fazer para ser santo? Santo é quem olha ao seu redor e não se cansa de colher as flores e os frutos da árvore da vida, plantada pelo próprio Deus. Santo é quem não receia olhar nos olhos dos outros e ver o brilho que neles se acende. Santo é quem não se rende diante da maldade, mas persevera na busca do bem e dá nome ao bem que encontra. Santo é quem se convence de que Deus só sabe amar e olha para as pessoas com amor infinito. Santo é quem gosta do bem, da beleza, da verdade.

Nestes primeiros dias do mês de maio, venha em relevo um campo específico, no qual a santidade pode e deve crescer, o do trabalho. Ninguém separe sua vida de fé das suas atividades profissionais, sejam quais forem. E vale oferecer, justamente para o trabalho, dois outros sinais esplêndidos. Trata-se de Maria, Mãe do Redentor, uma simples Mãe de Família, no mês que lhe é dedicado. Outro é São José, o operário! As duas figuras, indispensáveis na vida cristã, foram mundo e Igreja, mãos que trabalharam e santidade inigualável. Os dois santos, apenas canonizados, souberam oferecer tais exemplos e deles foram devotos. É a hora da Igreja, é a hora do mundo, a quem o Senhor Jesus oferece a salvação, pelos méritos de Sua Paixão, Morte e Ressurreição. Ninguém desperdice o tempo de Deus, que se chama hoje!


Dom Alberto Taveira Corrêa

Dom Alberto Taveira foi Reitor do Seminário Provincial Coração Eucarístico de Jesus em Belo Horizonte. Na Arquidiocese de Belo Horizonte foi ainda vigário Episcopal para a Pastoral e Professor de Liturgia na PUC-MG. Em Brasília, assumiu a coordenação do Vicariato Sul da Arquidiocese, além das diversas atividades de Bispo Auxiliar, entre outras. No dia 30 de dezembro de 2009, foi nomeado Arcebispo da Arquidiocese de Belém – PA.