Reflita

Transfiguração de Jesus

“Tendo predito aos discípulos a própria morte, Jesus lhes mostra, na montanha sagrada, todo o seu esplendor. E com o testemunho da lei e dos profetas, simbolizados em Moisés e Elias, nos ensina que, pela paixão e cruz, chegará à glória da ressurreição” (Prefácio do 2º Domingo da Quaresma – A transfiguração do Senhor – Ano B).

A Transfiguração de Jesus é uma das Teofanias (do grego theos, “Deus”, e phainein, “mostrar” ou “manifestar” – “manifestação de Deus”) narradas nas Escrituras. Jesus se transfigura, se torna “glorioso” no alto de uma montanha, no Monte Tabor, conhecido como Monte da Transfiguração (Marcos, 9,2-10; Mateus 17,1-9; Lucas 9,28-36). É num monte que Deus Se revela; e, no alto de um monte, Ele faz aliança com o seu Povo. O monte é o lugar de encontro com Deus.

Transfiguração-de-Jesus

Foto Ilustrativa: Gogosvm by Getty Images

Segundo os Evangelhos Sinóticos, Jesus convidou três de seus discípulos, Pedro, Tiago e João, e com eles subiu ao Monte Tabor. Enquanto rezava, Jesus se transfigura e se mostra glorioso: “Seu rosto resplandeceu como o sol, suas vestes tornaram-se brancas como a luz, tão brancas que nenhuma lavadeira do mundo poderia alvejá-las” (cf. Mt 17,2; Mc 9,3). Aparecem então Moisés e Elias, que conversavam com Jesus. Moisés e Elias representam a Lei e os Profetas, dois personagens do Antigo Testamento que, conforme a catequese judaica, deviam aparecer no “dia do Senhor”, quando se manifestasse a salvação definitiva (cf. Dt 18,15-18; Mal 3,22-23); também anunciam Jesus e permitem entender quem Ele é.

A Bíblia nos ensina sobre a transfiguração de Jesus

A passagem de Marcos começa com a expressão temporal “depois de seis dias”. Tem algum significado o contexto cronológico? O autor quer dizer que a Transfiguração de Jesus está situada depois do anúncio da Paixão e da Morte (cf. Mc 8,31-33) e da instrução sobre as atitudes do discípulo: convidado a renunciar a si mesmo, a tomar a sua cruz e a seguir Jesus no seu caminho de amor e de entrega da vida (cf. Mc 8,34-38). Imagino que este anúncio gerou nos discípulos uma grande frustração.

Depois de terem ouvido falar que ser discípulo é seguir o “caminho da cruz” e de terem constatado aquilo que Jesus pede aos que O querem seguir, gera nos discípulos certo desânimo, decepção, medo do fracasso. Como ficam os seus sonhos de glória, de honras, de triunfos? Vale a pena seguir um mestre que nada mais tem para oferecer do que a morte na cruz?

A manifestação gloriosa de Jesus no monte Tabor precede as dores da paixão e, portanto, foi uma consolação oferecida antecipadamente para que os discípulos pudessem compreender com mais clareza o projeto de Jesus Cristo e suportar as dores que eles também sofreriam. Fundamentada nesta lógica, a Igreja com o mesmo objetivo, celebra a festa da Transfiguração de Jesus quarenta dias antes da Exaltação da Cruz, a 14 de setembro (Segundo a tradição, o evento da transfiguração ocorreu 40 dias antes da crucificação).

Jesus é o Messias enviado por Deus

A Transfiguração de Jesus é uma antecipação do esplendor, que encherá a noite da Páscoa. A Transfiguração introduz o elo entre o calvário e a ressurreição, situada antes da paixão e da morte, prepara-os para a compreensão deste mistério.

No Tabor, Deus testemunhou que Jesus – humano/divino – era de fato o messias, o enviado do Pai para redimir os homens de todos os pecados e nos oferecer a Salvação. Assim como no dia de seu batismo, também no Tabor a voz de Deus testemunha a divindade de Jesus: “Este é meu Filho amado, escutai-o”.

Os apóstolos caem com a face em terra diante da glória de Jesus em atitude de adoração. “Pedro e os companheiros estavam com muito sono; mas, despertando, viram a glória de Jesus e os dois homens (Moisés e Elias) que estavam com Ele”, então “Pedro disse-lhe: “Mestre, é bom estarmos aqui. Façamos três tendas: uma para ti, uma para Moisés e outra para Elias”. Enquanto dizia isto, surgiu uma nuvem que os cobriu e, quando entraram na nuvem, ficaram com muito medo. E da nuvem veio uma voz que disse: “Este é o meu Filho amado. Escutai o que ele diz”. E, de repente, olhando em volta não viram mais ninguém, a não ser somente Jesus com eles”. Na Tradição Veterotestamentária, era na nuvem que Deus manifestava a sua presença, quando conduzia o seu Povo no deserto (cf. Ex 40,35; Nm 9,18.22; 10,34). A nuvem indicava a presença do próprio Deus.

A Transfiguração é uma antecipação da Ressurreição e Ascenção de Jesus; é a contemplação antecipada da glória de Deus.

Leia mais:
.: O que a Ascensão de Jesus diz ao cristão de hoje?
.: Conheça os motivos pelos quais a Igreja proclamou a Assunção de Nossa Senhora
.: A transfiguração do Senhor em nossa vida
.: A Transfiguração revela a identidade de Jesus

O que significa para nós?

São Paulo em suas cartas encoraja a nossa esperança recordando a lembrança da glória do salvador manifestada na Transfiguração e na Ressurreição: “Veremos a glória face a face, diz, e seremos transfigurados à sua semelhança” (2Cor 3,18). “Esperamos o Salvador, Nosso Senhor Jesus Cristo, que transformará o nosso corpo terrestre e o tornará semelhante ao seu corpo glorioso” (Filipenses 3,21).

A Transfiguração constitui uma passagem de ânimo para os discípulos e para todos os cristãos, pois nela manifesta-se a glória de Jesus e atesta-se que Ele é, apesar da cruz que se aproxima, o Filho amado de Deus. Os discípulos recebem, assim, a certeza de que o projeto que Jesus apresenta é um projeto que vem de Deus, um projeto de esperança.

Deus nos concede pequenos “tabores” ao longo de nossa vida, pequenos momentos de consolação, para suportarmos os grandes momentos de desolação e de tristeza que a vida nos apresenta. Os Apóstolos, quando virem Jesus na Sua condição de Servo, não poderão esquecer a Sua condição divina.

A mensagem fundamental é que Jesus é o Filho amado de Deus, em quem se manifesta a glória do Pai. Ele é, também, esse Messias libertador e salvador esperado por Israel, anunciado pela Lei (Moisés) e pelos Profetas (Elias). Ele é um novo Moisés, isto é, Aquele através de quem o próprio Deus dá ao seu Povo a nova lei e através de quem Deus propõe aos homens uma nova Aliança.

Pela Transfiguração de Jesus, Deus mostra aos discípulos e a nós que, uma vida feita de entrega, doação, serviço, mesmo que terminar na cruz, não é uma vida de fracasso e derrotas. Deus tem uma promessa de vida plena e definitiva no final do caminho, a todos aqueles que, como Jesus, forem capazes de colocar a sua vida ao serviço dos irmãos.

A transfiguração de Jesus anuncia do alto daquele monte que, não desanimeis, pois, a lógica de Deus não conduz ao fracasso, mas à Ressurreição, à vida definitiva, à felicidade sem fim.

Por fim, pelas palavras de Pedro, os três discípulos, testemunhas da transfiguração, parecem não querer “descer” e enfrentar o mundo e os problemas dos homens e mulheres. Jesus não responde a Pedro, pois, sabe muito bem que é preciso descer à realidade concreta do mundo e fazer algo para transformá-lo. Jesus deixa claro que para segui-Lo é preciso assumir os mesmos compromissos que o Pai Lhe confiou. Ser cristão é assumir um compromisso com Deus, que se faz compromisso de amor com o mundo e com os homens. A Palavra de Deus nunca nos falta, a Palavra divina “Escutai o que Ele diz”, espera de nós uma escuta atenta e resposta decisiva.

Oxalá um dia possamos dizer como Paulo: “Caríssimo, quanto a mim, eu já estou para ser oferecido em sacrifício; aproxima-se o momento de minha partida. Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé. Agora está reservada para mim a coroa da justiça, que o Senhor, justo juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que esperam com amor a sua manifestação gloriosa (2Tm 4,6-8).

banner_espiritualidade