✝️ Devoção

O Anjo da Guarda de Portugal

O dia do Anjo da Guarda de Portugal: uma missão divina enraizada na história

O dia 10 de junho é assinalado em Portugal como o Dia do Anjo da Guarda deste país. É uma devoção muito antiga, profundamente ligada a um desígnio divino em relação a Portugal, sinalizado desde a origem de Portugal, por exemplo no chamado «Milagre de Ourique», em que Jesus fala a D. Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal, consolidando a independência da nação e apontando a sua missão espiritual, sobretudo no período da expansão marítima, no século XV e XVI. Vale sempre a pena recordar o relato feito pelo Frei António Brandão, no qual Jesus diz a determinada altura ao jovem rei: «Em ti e tua geração quero fundar para mim um reino, por cuja indústria será meu nome notificado a gentes estranhas» (A. BRANDÃO, Crónica de D. Afonso Henriques, Porto, Livraria Civilização, 1945, 9).

Créditos: Domínio Público

A Devoção ao Anjo de Portugal em Fátima

Esta vocação sobrenatural de Portugal fez com que em vários passos da sua história desenvolvessem aspetos particulares, um deles foi o surgimento paulatino da devoção ao Anjo da Guarda de Portugal, ou mais propriamente designado «Anjo Custódio do Reino». A pedido dos reis de Portugal, esta devoção foi aprovada no início do século XVI pelos Papas, sendo muito popular. Contudo, com o passar dos anos e, sobretudo, com o desenvolvimento de perspectivas positivistas na cultura portuguesa, sobretudo a partir dos séculos XVIII e XIX, a devoção ficou bastante reduzida.

No entanto, no ano de 1916, em Fátima, o Anjo de Portugal volta a ter um lugar central, quando aparece aos Pastorinhos Lúcia, Francisco e Jacinta para sintonizar os seus corações com os Corações de Jesus e Maria e, assim, estarem preparados para a grande missão que receberam em 1917, com as Aparições de Nossa Senhora.

No tempo de Pio XII, a devoção ao Anjo da Guarda de Portugal conhecerá grande incremento, nomeadamente aprovando que esta memória fosse incluída no calendário litúrgico de Portugal.

Mas vale a pena regressar às visões do Anjo em 1916, uma vez que elas oferecem a missão particular de qualquer Anjo da Guarda, de forma peculiar, o Anjo da Guarda de cada nação.

Adoração: o elo fundamental da mensagem de Fátima e o caminho para a paz

Com efeito, há uma dimensão fundamental que aparece na mensagem que o Anjo transmite às crianças: a adoração. Na primeira aparição, na primavera de 1916, quando ensina a oração: «Meu Deus, eu creio, adora, espero e amo-vos: peço-vos perdão para os que não creem, não adoram e não vos amam». Reparemos que coloca entre as virtudes teologais – fé, esperança e caridade – a adoração, apontando a realização plena de toda a vida de relação com Deus. 

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Esta aparição acontece em plena Primeira Guerra Mundial, depois de décadas em que a Europa tinha voltado costas a Deus: por um lado, as correntes de pensamento renderam-se ao positivismo e ao materialismo, deixando Deus de fazer parte do fundamento da convivência social; por outro lado, a revolução industrial provocou nas pessoas a percepção de que deixaram de existir limites ao crescimento do espírito humano. Tudo isso redundou numa Guerra Mundial, pois quando se esquece Deus a primeira vítima é o ser humano. 

Toda a Mensagem de Fátima se centra na Oração pela Paz, precisamente recordando o apelo do Evangelho à conversão e ao regresso a Deus. Esta transformação só é autêntica quando acontece a adoração, pois é precisamente nesta que o ser humano se reconhece como criatura e presta culto a Deus como Criador. A base da adoração é, assim, a humildade.

A missão do Anjo Mensageiro

«Anjo» significa «mensageiro», portanto, indica a sua missão. Ora, a missão que um anjo exerce é sempre da parte de Deus, por isso, sabendo que o Anjo da Guarda de Portugal traz uma mensagem de convite à adoração, reconhecemos que só quando o ser humano, particularmente e em sociedade, reconhece Deus como o fundamento transcendente da vida social, da ordem e da lei, se encontra a verdadeira paz. 

A proteção que o Anjo da Guarda de Portugal oferece é a indicação da reta vida cristã: viver para Deus. Isto é ainda mais claro quando temos em conta que na terceira visão do Anjo em Fátima – no outono de 1916 – este dá aos Pastorinhos misticamente a Sagrada Comunhão. A Igreja é uma sociedade eucarística, porque Deus caminha no meio do Seu Povo e podemos adorá-l’O sempre no sacrário, e onde estivermos podemos apresentar e elevar o nosso coração e mente a Ele, para louvá-Lo, agradecê-Lo,  e também para lhe fazer companhia e consolá-Lo como fez e nos ensinou o Santo Francisco Marto, quando muitas vezes se retirava no campo para estar a sós com Nosso Senhor e Consolá-Lo: …  . Portanto, a sociedade cristã não é apenas uma realização humana de valores que Jesus ensinou: Ele próprio conduz e está no meio desta sociedade humana.

Viver este dia do Anjo da Guarda, que em Portugal é também o Dia de Portugal, das Comunidades Portuguesas e de Luís de Camões, é sempre reconhecer que uma nação, enquanto tal, tem também uma vocação sobrenatural, de que não pode abdicar e que corresponde a uma responsabilidade que só se pode viver confiado na graça divina.

Pe Ricardo Figueiredo, Português, Sacerdote da Igreja Católica.  Doutor em Teologia Sistemática Pela Universidade Católica Portuguesa, Diretor do Departamento Comunicação Lisboa.